Embora haja quem diga que o
processo contra o presidente não dará em nada, não julgá-lo seria uma traição à
democracia. Trump e outros governantes precisam entender que eles não estão
acima da lei, opina Carla Bleiker.
O primeiro dia do processo de
impeachment do presidente Donald Trump no Senado se arrastou até tarde
da noite, o que já era previsível após as primeiras horas de debates. Nada
foi discutido ainda em termos de conteúdo. Em vez disso, falou-se do rito
processual que Mitch McConnell, líder da maioria republicana no Senado, havia
apresentado.
Segundo tais regras, ambos os
lados devem apresentar seus pontos de vista após fazerem seus breves
discursos de abertura. Primeiramente os representantes da acusação, que são
sete deputados democratas da Câmara dos Representantes, e depois a defesa,
uma equipe de advogados de Donald Trump.
Somente após a apresentação dos
argumentos de ambos os lados será votado se testemunhas deverão ser
ouvidas ou se os democratas receberão documentos da Casa Branca e do
Departamento de Estado.
No entanto, os democratas querem
ouvir logo no início testemunhas, como o ex-assessor de segurança
nacional de Trump John Bolton, que até agora seguiram as instruções da Casa
Branca e se recusaram a depor. E eles querem ter acesso imediato aos documentos
nos quais suspeitam encontrar evidências importantes da má conduta de
Trump.
Os advogados de defesa do
presidente zombam disso, dizendo que os democratas já realizaram longas
audiências na Câmara e que, se eles querem agora chamar primeiramente as
testemunhas e exigir ainda mais documentos, provavelmente é porque o argumento
para o impeachment de Trump não é consistente.
Os democratas contestam,
afirmando que um julgamento sem provas ou testemunhas não é um processo justo,
e sim um teatro do absurdo. Portanto, eles solicitam várias alterações no rito
processual definido por McConnell.
Mas os argumentos legítimos dos
democratas não encontram ouvidos. Como nas audiências na Câmara dos
Representantes que levaram ao impeachment de Trump, os republicanos se
atêm estritamente à linha partidária. No Senado há 45 democratas, além de
dois senadores independentes aliados a eles, e 53 republicanos.
A votação sobre se o Senado
deveria solicitar documentos da Casa Branca e do Departamento de Estado antes
do início do processo terminou exatamente como esperado: 47 votos a favor e 53
votos contra, nas duas vezes em que a proposta foi votada. Ambas as tentativas
foram rejeitadas.
Se nenhum republicano se atreveu
a sair da linha já no primeiro dia da tentativa de estabelecer um julgamento
regular com testemunhas e provas, então não se pode esperar muito do conteúdo
real do processo. Meses antes do início das audiências na Câmara, especialistas
previram que Trump seria absolvido no Senado graças à maioria republicana.
Caso isso aconteça, tudo terá
sido em vão para os democratas? O processo de impeachment de Trump terá
sido apenas uma perda de tempo? Críticos que são contra Trump, mas também
contra o processo de impeachment, dizem que os democratas deveriam ter se
poupado de tudo isso. Eles afirmam que o resultado já era sabido desde o início
e, com os ataques a Trump, o presidente ganhou apenas mais eleitores.
Mas essas vozes ignoram o mais
importante. Mesmo que o processo de impeachment não tenha o fim esperado pelos
democratas, eles não poderiam simplesmente deixar passar as violações cometidas
por Trump.
Com uma atitude de "tanto
faz, não vai funcionar de qualquer forma", isso indicaria que uma pessoa
como Trump pode se dar ao luxo de qualquer coisa devido à sua posição e pode se
pôr acima de todas as leis. Isso é inaceitável. Em uma democracia, todos,
incluindo as pessoas no topo, devem cumprir as regras.
Por três anos, os americanos vêm
assistindo ao presidente zombar de minorias, semear ódio contra os migrantes e
atacar aliados. Com sua má conduta frente à Ucrânia, ele violou a lei com o
objetivo de tirar uma vantagem contra seu potencial adversário Joe Biden. Os
democratas não devem ignorar isso. E pela mesma razão, eles não devem ceder
agora, mesmo quando se trata dos procedimentos de um processo cujo
resultado parece certo.
Para Trump e todos os presidentes
que o sucederem, uma coisa deve estar clara: eles não podem governar os Estados
Unidos como um faraó considerado representante de Deus na terra. Existem leis
que eles devem cumprir. E se não o fizerem, podem esperar processos legais.
Qualquer outra coisa seria uma traição à democracia.
Carla Bleiker | Deutsche Welle |
opinião
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