A região sul de Angola continua a
ser assolada pelo fome e desnutrição, apesar das chuvas. Ativistas relatam que
os apoios enviados pelo Governo são desviados e as pessoas continuam a morrer.
A fome e a seca no sul de Angola
deixaram de ser notícia com a chegada da chuva que cai sobre as regiões
afetadas. Entretanto, engana-se quem pense que a situação conheceu
melhorias.
Segundo Domingos Fingo,
diretor-executivo da Associação Construindo Comunidades, ainda não há produtos
resultantes do presente ano agrícola que possam saciar a fome da população.
"As pessoas pensam que pelo
simples facto de estar a cair chuva que neste momento a realidade da fome e da
seca na região sul de Angola e substancialmente na dos Gambos está
ultrapassada. Não. Não é isso, porque neste momento as comunidades estão a cultivar
e os produtos resultantes do cultivo só estão disponíveis a partir de maio ou
junho", alertou.
Por isso, Domingos Fingo entende
que o apoio às vitimas não deve parar. "O espírito de solidariedade para
com as vítimas da seca, da fome e da desnutrição deve continuar até que haja
condições de suporte dos produtos que poderão ser retirados do campo. A
solidariedade de todos nós exige-se enquanto não chegar à altura das colheitas
que se impõem na região", disse.
O combate à fome no sul do país
começou a ganhar força na agenda do Governo com a visita do Presidente angolano
à região em maio do ano passado. João Lourenço deslocou-se em duas das três
províncias mais afetadas pela fome: Namibe e Cunene. Não tardou, o país
mobilizou-se em apoiar as vítimas.
Entretanto, a ajuda material e
financeira já dada, quer pelo Estado, quer por organizações sociais, tem
conhecido destino incerto. A 18 de fevereiro deste ano, o padre Pio Wakussanga,
residente na região dos Gambos, província da Huíla, outra zona fortemente
afetada pela fome, questionou no seu perfil no Facebook: "Ide para o
interior junto de comunidades afetadas. Perguntem quantas vezes receberam os
referidos apoios", escreveu na rede social.
O ativista dos direitos humanos
escreve em maiúsculo a palavra "NIET" para acentuar o suposto desvio
dos bens. "NIET", em português em Angola, significa "nada ou
não". Ou seja, "há uma nuvem negra de incertezas e hiatos nesse
quesito!", desabafou Pio Wakussanga.
"A provar-se o descaminho
desses dinheiros, tal contribuiu para a morte de muitas pessoas",
acrescentou o padre na sua publicação, que foi retomada por vários internautas.
Morte de pessoas e animais
Há também relatos de morte de
pessoas e gado no Namibe, Cuando Cubango e Cunene. Sem precisar o número de
mortes por fome e desnutrição, Domingos Fingo, confirma: "Existem
familiares que estão a perder os seus entes queridos por causa da fome. Eu
pessoalmente fui surpreendido por duas famílias a solicitar-me apoio. Quando vi
a natureza física das pessoas que me contactaram fiquei extraordinariamente
indignado com a realidade".
Por isso, Wakussanga pede à
Presidência da República que faça um esclarecimento público sobre que tipos de
ajudas o Governo central disponibilizou.
Não é apenas na região dos Gambos
onde há relatos de desvio de apoios. No Cunene, a província mais afetada com
mais de 800 mil vítimas e mais de um milhão de cabeças de gado de várias
espécies, também há registo de desvios. Isso terá estado na base da exoneração
do ex-governador provincial Virgílio Tchova. O antigo governante está ser
investigado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) de Angola.
O problema da seca e da fome na
região sul de Angola acentuou-se em 2011. Agora a situação estende-se a outras
regiões do país, como o Cuando Cubango. No leste de Angola, precisamente na
província do Moxico, a fome também fustiga populares.
"O município mais afectado
na província do Moxico é Buengas. A população recorre às matas para recolher os
frutos silvestres para a sua alimentação. Lá, a seca está em alta e a população
está a passar por momentos muito difíceis", denuncia o ativista Nelson
Euclides, residente no Luena.
Segundo o ativista, o estado
degradante das vias de comunicação vem agravar ainda mais a situação dos
populares. "Há dificuldades de vias de acesso. E é um município que dista
a mais de 200 quilómetros", diz.
Manuel Luamba | Deutsche Welle
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