Livro revela características da
imprensa moçambicana que impedem que jornalistas tenham força para denunciar
casos de corrupção. São “multiplicadores dos discursos de outras entidades”, diz
pesquisador
Difícil acesso às fontes de
informação, censura e autocensura são alguns dos principais obstáculos para a
cobertura de assuntos relacionados à corrupção em Moçambique, mas essas não
são as únicas dificuldades enfrentadas pelos média.
O presidente do Centro de Estudos
Interdisciplinares de Comunicação e diretor-executivo do MISA-Moçambique,
Ernesto Nhanale, analisou a relação dos média moçambicanos com as denúncias de
corrupção no país. O resultado do trabalho está no livro “A cobertura dos média
sobre a corrupção em Moçambique: Um contrapoder abalado?”, que será lançado
esta quarta-feira (26.02), em Maputo.
O investigador Ernesto Nhanale
- considera que há abertura legal para o exercício da profissão,
mas há “atos de coerção contra as liberdades de imprensa” quando os temas das
reportagens se referem à corrupção.
“Infelizmente assistimos a casos
de violência contra jornalistas, casos de censura direta e até mecanismos de
autocensura”, explica.
Um dos imensos desafios para os
jornalistas moçambicanos é a autocensura. O fenómeno é ainda pouco percebido
pelo público, mas significa uma das amarras
mais difíceis de serem rompidas quando se trata de denunciar casos de
corrupção.
Nhanale explica que a autocensura
resulta da pouca autonomia dos jornalistas em relação às fontes de informação.
O pesquisador observa que pessoas em posições de poder em Moçambique conseguem
desencadear mecanismos que repulsem os jornalistas a publicarem certas
matérias.
“Quando a profissão não oferece
um certo tipo de estabilidade aos profissionais, eles ficam vulneráveis. Outro
elemento tem a ver com a segurança”, explica.
Segundo Nhanale, não há uma
agenda interna dos média para a realização de reportagens de investigação.
Poucos recursos materiais de qualidade, o domínio das fontes sobre as redações
e a fragilidade no processo de apuramento da informação seriam obstáculos
diários a serem superados pelo jornalismo em Moçambique, segundo o autor.
“A tratar-se desse tipo de
matérias, sempre há um fechamento. É importante criar condições para que se
monitorize o governo.”
Repetidores de denúncias
Ernesto Nhanale admite que grande
parte dos casos de corrupção julgados recentemente resulta de denúncias feitas
pela imprensa, sobretudo a independente. Por outro lado, ele considera que
podia ser feito mais.
O pesquisador acha que que, ao
reportarem sobre corrupção, “os média fazem-no não pela sua capacidade de
definirem a corrupção como um assunto de interesse e que deve ser investigado,
mas como multiplicadores dos espaços de publicitação dos discursos e resultados
de investigação realizados por outras entidades”.
Algumas vozes têm defendido a
criação de um Ministério de Informação, mas Nhanale prega a completa
independência dos veículos de comunicação.
“Cada órgão tem que definir a sua
agenda através das regras do profissionalismo e da responsabilidade desses
media em relação à sociedade. Ninguém mais tem que entrar e dizer o que um
media tem que publicar e deixar de publicar”, defende.
Leonel Matias (Maputo) | Deutsche
Welle
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