Ex-trabalhadores do Credit Suisse
contestam ação judicial de Moçambique em Londres. Mas há quem não se dê a esse
trabalho, preferindo insistir na mediação arbitral, algo pouco benéfico para o
Estado.
Surjan Singh, Andrew Pearse e Detelina
Subeva contestaram recentemente a ação judicial que o Estado moçambicano
intentou contra eles em Londres no contexto das dívidas ocultas. Rejeitam
qualquer ação incorreta e consideram que Moçambique não tem direito a
compensação, além de negarem a responsabilidade pela degradação da
situação económica do país, como entende a Procuradoria-Geral da República
moçambicana na sua ação.
Apesar disso, assumiram
anteriormente que receberam subornos no contexto das dívidas ocultas
quando trabalhavam no Credit Suisse. O banco também contestou em fevereiro
a ação, argumentando que o empréstimo é válido e que tem
direito a uma compensação por falta de pagamento, e teria focado
possíveis imprecisões e erros formais da ação moçambicana.
"Aquilo que eu acredito é
que vários processos são sempre complexos e, às vezes, vários procedimentos
dentro dos processos podem ser negligenciados. Não significa que os advogados
nomeados pela República de Moçambique tenham negligenciado essa questão. O que
é certo é que pode ser uma determinada fragilidade que, por um lado, seja
considerada fundamental." No entanto, tudo dependerá de quem julgar o
caso, opina o jurista Rodrigo da Rocha.
Os advogados de Moçambique neste
processo são da conceituada Peters & Peters, uma firma que esteve inclusive
a acompanhar o julgamento de Jean Boustani em Nova Iorque, outro envolvido
no caso das dívidas ocultas.
Ação deve ser apoiada pelos
moçambicanos
Relativamente à ação moçambicana,
o Centro de Integridade Pública (CIP) não tem nada a apontar, justificando,
contudo, a falta de domínio sobre o seu conteúdo e até mesmo sobre os contornos
da dívida.
Borges Nhamire, investigador
da ONG, é a favor da iniciativa: "É uma ação necessária,
primeiro porque Londres é a praça onde as dívidas aconteceram. De princípio, é
a instância correta e Moçambique, que não concorda em pagar parte das dívidas
ocultas, faz muito bem ao iniciar o processo em Londres".
Mesmo assim, segundo o
pesquisador, "sobre os méritos da ação, [ainda será] preciso
esperar que o julgamento comece para ver os argumentos que Moçambique vai
apresentar, porque a ação em si não traz todas as provas que as partem têm.
Elas podem ir sendo apresentadas durante o processo. Então, neste momento penso
que é prematuro discutir [isso]. Mas é uma iniciativa excelente que deve ser
apoiada pelos moçambicanos."
São também alvo da ação
moçambicana a Privinvest e Iskandar Safa, dono da empresa. A Privinvest vendeu
barcos a uma das três empresas envolvidas nas dívidas ocultas, a EMATUM. A
empresa recebeu o dinheiro diretamente do Credit Suisse, numa clara violação
procedimental, uma vez que o dinheiro deveria ter entrado primeiro nos cofres
moçambicanos.
Arbitragem internacional, uma
arma pesada
Os dois visados não contestaram
ainda a ação moçambicana. No entanto, contestam a competência do tribunal onde
foi submetida a ação para dirimir o caso. Preferem, por exemplo, resolver o
contencioso numa instância de arbitragem internacional. O jurista Rodrigo
da Rocha suspeita que seja uma tentativa de sair em vantagem nesta
"guerra".
"Decisões arbitrais
normalmente desfavorecem o Estado à partida e, quando são instaladas
contra um Estado, desfavorecem o Estado. O que se entende nas ações arbitrais é
que o Estado está sempre a atuar como um poder regulamentar e um poder
legislativo e que, por isso, é um elo forte numa ação arbritral. Por isso é
que, tradicionalmente, os estados têm a intenção de fugir de uma arbitragem e
atribuir a um poder judicial normalmente constituído", esclarece.
E não é tudo: "Depois há uma
outra situação, que é a do recurso. Em regra, as arbitragens não permitem
recurso e as ações judiciais permitem. Isso, por si só, é uma grande vantagem
para uma parte que quer esgotar todos os meios processuais para fazer valer
aquilo que é a sua pretenção", diz ainda Rodrigo da Rocha.
Há o entendimento de que os
visados, com as suas contestações, estariam a tentar desencorajar as ações do
Estado moçambicano.
Nádia Issufo | Deutsche Welle
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