Rafael Barbosa | Jornal de Notícias
| opinião
Devem ser poucos os portugueses
que nunca assistiram à homilia televisiva da hora de almoço (que também passa à
hora de jantar). Todos os dias, Graça Freitas, Marta Temido e António Lacerda
Sales trazem-nos as novas sobre a pandemia.
Quantos casos suspeitos,
infetados, mortos, recuperados, internamentos, quantos em cuidados intensivos.
No início, associavam os números a subidas abruptas, depois destacaram os
sinais de acalmia na curva, até chegarem ao planalto atual, que, um dia, nos conduzirá
de novo ao sopé da montanha e à tranquilidade. Ou talvez não. Porque a
conferência de Imprensa não retrata, nem de perto, a dimensão da catástrofe. Há
muito mais vidas diminuídas ou destruídas do que aquelas que ali se reportam. E
também mereciam um "briefing" diário, com números, curvas e gráficos,
embora diferentes protagonistas. Siza Vieira, para nos atualizar sobre a subida
abrupta do número de empresas e trabalhadores em lay-off (mais de um milhão e a
subir a uma velocidade na ordem das dezenas de milhares por dia). Ana Mendes
Godinho, para nos mostrar a curva dos despedimentos massivos (houve 65 mil
novos pedidos de subsídio de desemprego no último mês). Mário Centeno, para
destacar a quebra nas receitas dos impostos, seja no IRS, no IRC, ou no IVA, ou
seja, as receitas que o Estado já não tem para pagar as despesas que assumiu.
Suspeito que nesta conferência de Imprensa, que não existe, estaríamos longe de
ver sinais de acalmia na curva e ainda mais longe da chegada ao planalto.
Suspeito também que, existisse este esclarecimento diário, e os portugueses já
teriam percebido que a quarentena não só não trouxe a cura como arrastará muita
gente para a miséria. Protejam-se, portanto, os grupos de risco (88% das
vítimas mortais têm 70 ou mais anos) e regressemos à vida. Abram-se creches,
escolas, fábricas, restaurantes, cabeleireiros, lojas. Disfarce-se o medo com
máscara, luva, viseira e desinfetante. A luta contra o vírus do empobrecimento
e da miséria só se vence com um regresso massivo ao trabalho. Já agora, com
salários decentes.
*Chefe de Redação
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