quinta-feira, 21 de maio de 2020

Portugal | Jogos florais


Rafael Barbosa | Jornal De Notícias | opinião

1. O Novo Banco é um bom assunto para trazer para cima da mesa quando não sobra nada de interessante para discutir. Transformou-se numa espécie de jogos florais parlamentares.

Bom para treinar a retórica, nunca para articular uma solução. "O maior crime de colarinho branco" de sempre, assegura agora Rui Rio, talvez julgando que os portugueses ainda não tinham percebido. Mais criativo só António Costa a recuperar a teoria primeiro formulada por Passos Coelho de que não haveria custos para os contribuintes. Até ao ano passado, o "banco bom" já tinha absorvido seis mil milhões de fundos públicos (dá uma média de 600 euros por português).

Há poucos dias, somaram-se mais 850 milhões (mais 85 euros por cabeça). Mas não há problema, é tudo para devolver até 2046. É como o Pai Natal, sabemos que não existe, mas nem por isso deixamos de esperar por ele. Mesmo que nunca nos traga mais do que um par de meias, em vez de uma prenda a sério: por exemplo, deixar falir o que não tem remédio; ou nacionalizar, em vez de entregar a interesses obscuros uma fonte de milhares de milhões.

2. Há um outro jogo floral em curso, mas fora do Parlamento, que a vida política também se faz a partir de Belém. Não é preciso ser uma pitonisa especialmente arguta para perceber que Marcelo Rebelo de Sousa tem caminho aberto à renovação de mandato. O voto não é uma formalidade, mas o resultado será o mesmo. António Costa faz contas tão bem como qualquer outro. Também ele quer renovar mandato e, acresce a isso, lidera um Governo em minoria. Quanto menos atrito, melhor.

A decisão informal de lançar a recandidatura de Marcelo mais do que política foi cálculo político. É provável que Ana Gomes se deixe ficar onde está, apesar da combatividade. São outros e mais marginais os que podem ganhar com uma candidatura de bloco central. Sobretudo André Ventura e a nova direita radical que lidera. É possível que acabe por tropeçar no seu próprio extremismo, mas entretanto talvez seja melhor não encarar o fenómeno como um jogo floral.

*Chefe de redação

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