domingo, 24 de maio de 2020

Tumultos em Hong Kong controlados pela polícia neste domingo


Gás lacrimogéneo disparado, prisões feitas enquanto milhares reúnem-se para protestar contra a lei de segurança nacional planeada por Pequim para Hong Kong

»Polícia de choque dispara gás lacrimogéneo no distrito comercial de Causeway Bay, enquanto manifestantes cantavam slogans antigovernamentais

»Pelo menos 120 pessoas presas às 16h30, de acordo com a página oficial da polícia no Facebook

A polícia de Hong Kong disparou gás lacrimogéneo e usou um canhão de água no distrito comercial de Causeway Bay este domingo, quando milhares de pessoas foram às ruas para protestar contra Pequim pela instauração da lei de segurança nacional planeada para a cidade, denunciando a legislação proposta como uma ameaça às liberdades civis e ao fim do princípio “um país, dois sistemas”.

Os manifestantes espalharam-se pelas ruas de Causeway Bay e Wan Chai, com alguns erguendo barreiras nas estradas usando grades desmontadas e outros materiais.  Num post no Facebook, a força policial disse que pelo menos 120 pessoas foram presas às até às 16h30, incluindo cerca de 40 acusados de fazerem barreiras na estrada de Gloucester.

Enquanto isso, cerca de 30 pessoas, incluindo trabalhadores de primeiros socorros identificados, foram parados e revistados à porta da zona de Sogo.

A polícia levantou bandeiras azuis avisando os manifestantes que convergiam para fora da loja para dispersar antes que o gás lacrimogéneo fosse disparado pela primeira vez perto do cruzamento da Hennessy Road com a Percival Street às 13h24.

Atrás da loja, quatro pessoas vestidas de preto foram detidas e revistadas enquanto manifestantes gritavam: “Libertem Hong Kong. A revolução do nosso tempo”.

Às 14h, os manifestantes ocuparam a Gloucester Road, enquanto outros segurando uma faixa com a inscrição “o céu destruirá o Partido Comunista Chinês” começaram a marchar em direção a Wan Chai. Havia também exibições de bandeiras americanas.

Outros podiam ser ouvidos provocando a polícia, com alguns gritando “independência de Hong Kong. A única solução".

A polícia disparou granadas de gás pimenta visando um grupo na Gloucester Road e removeu algumas das barricadas, enquanto mais manifestantes eram presos fora de Sogo.

A força divulgou um comunicado às 14h dizendo que "a força mínima necessária, incluindo gás lacrimogéneo" havia sido usada quando os manifestantes atiraram guarda-chuvas e garrafas de água contra eles.

Um veículo blindado e um canhão de água também estavam sendo conduzidos ao longo da Hennessy Road, com membros do esquadrão tático especial da polícia em cima do carro blindado apontando suas armas para a multidão em redor.

Na Canal Road, a situação ficou tensa quando a polícia ergueu a bandeira azul várias vezes, empurrando e apontando spray pimenta e gás lacrimogéneo para repórteres e vereadores. Mais tarde, o canhão de água foi disparado contra manifestantes que tentavam colocar barricadas na rua, enquanto mais gás lacrimogéneo era usado do lado de fora do shopping Hysan Place.

O ativista estudantil Joshua Wong Chi-fung, que estava no local, disse que, embora possa entrar em conflito com a iminente lei de segurança nacional, ele planeia lutar e continuar fazendo lobby com o apoio de países estrangeiros, algo que o projeto de lei provavelmente abordará.

"Quando Pequim anunciou a lei, era hora de contestar", disse Wong.




Um manifestante, de sobrenome Tang, disse ter visto mais repressão pelo governo de Hong Kong nas últimas duas semanas, incluindo a tomada do principal comité da Câmara do Conselho Legislativo por parlamentares pró-establishment.

"Pode haver pouco que possamos fazer, mas ainda temos que sair à rua independentemente do resultado", disse ele.

Minutos antes do primeiro gás lacrimogéneo ser disparado, o ativista do Poder Popular, Tam Tak-chi, foi preso enquanto coordenava o que chamou de "conversa sobre saúde" do lado de fora da loja de Sogo em Causeway Bay, no domingo, dizendo que essas conversas estavam isentas das regras do Covid-19 por serem reuniões com mais de oito pessoas.

“Esta é uma conversa sobre saúde e está isenta das regras. Temos enfermeiras aqui”, ele disse.  Ele acusou figuras locais pró-Pequim de querer fazer Hong Kong como qualquer outra cidade chinesa continental.

A polícia avisou a Tam que ele estava conduzindo uma assembleia não autorizada antes de prendê-lo logo em seguida.

"Luta pela liberdade!  Apoia Hong Kong!” cantou enquanto polícias o levavam.

Após a sua prisão mais de 100 pessoas reuniram-se do lado de fora do Sogo, cantando "Hongkongers, vingança!" e "A independência de Hong Kong é a única solução!"

No início do dia, a força instou os cidadãos na sua página do Facebook a não participarem em nenhuma assembleia não autorizada, dizendo que havia mobilizado oilícias suficientes para tomar medidas decisivas e realizar prisões.  Grupos da polícia de choque começaram a reunir-se em locais próximos à loja de departamentos antes do meio dia.

O protesto ocorreu dois dias após a apresentação de uma resolução para "prevenir, frustrar e punir" ameaças à segurança nacional em Hong Kong à legislatura chinesa, o Congresso Nacional do Povo.  O projeto de lei proibe atos de secessão, subversão e terrorismo.

Espera-se que a resolução seja aprovada em 28 de maio, autorizando o Comité Permanente do NPC a elaborar uma lei de segurança nacional sob medidas a impor a Hong Kong, contornando a legislatura da cidade.

A nova lei exige  que o governo de Hong Kong estabeleça novas instituições para salvaguardar a soberania e permitir que as agências do continente operem na cidade conforme necessário, provocando preocupações sobre agentes do continente fazendo prisões arbitrárias.

Em 2003, o governo de Hong Kong foi forçado a arquivar uma lei de segurança nacional depois que cerca de meio milhão de pessoas saíram às ruas para se opor à legislação, dando origem a temores de que isso restringisse os seus direitos e liberdades.

Agora, Pequim decidiu introduzir uma lei de segurança nacional através do Anexo III da mini-constituição da cidade, a Lei Básica, o que significa que a nova lei será promulgada sem a necessidade de legislação local.

Os políticos da oposição de Hong Kong disseram que o plano de introduzir a lei por decreto é equivalente a adotar um modelo de “um país, um sistema” na cidade, abandonando o princípio de “um país, dois sistemas” que garante à cidade um alto grau de autonomia.

A manifestação de domingo também foi convocada para protestar contra um projeto de hino nacional que criminalizará o abuso ao hino nacional chinês em Hong Kong. O projeto, que a líder da cidade Carrie Lam Cheng Yuet-ngor chamou de prioridade máxima, prevê penas de prisão de até três anos.

O Conselho Legislativo debaterá o projeto na quarta-feira.

Phila Siu e Chris Lau | South China Morning Post

*Tradução para português por PG

Autoria:

Phila Siu, também conhecido como Bobby, é jornalista desde 2009. Reportou sobre direitos humanos, segurança, política e sociedade em Hong Kong, China continental e sudeste da Ásia. Ele é bacharel em jornalismo pela Universidade Batista de Hong Kong e mestre em direito dos direitos humanos pela Universidade de Hong Kong.

Chris é um repórter especializado em assuntos jurídicos e judiciais em Hong Kong. De justiça criminal a questões constitucionais, ele traz as atualizações mais recentes e análises aprofundadas sobre questões jurídicas que afetam todos os aspectos da cidade. Ele também cobre extensivamente questões de direitos humanos.

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