domingo, 19 de julho de 2020

EUA | Morreu John Lewis, "um gigante" e "herói" da luta pelos direitos cívicos


John Lewis, membro do Congresso norte-americano, defensor da não-violência e dos direitos cívicos nos Estados Unidos, morreu aos 80 anos, devido a um cancro no pâncreas

Pacifista e defensor dos direitos civis dos negros, que marchou com Martin Luther King Jr. e foi congressista durante décadas, John Lewis era um ícone da luta pelo direitos dos afro-americanos e travou toda a vida uma dura batalha contra a discriminação racial e a injustiça.

Foi repetidamente espancado pela polícia e preso durante os protestos em que participou contra as leis segregacionistas e os crimes praticados contra os negros nos Estados Unidos, mas a sua voz nunca se calou perante a injustiça.

Ainda em junho, apesar de já muito debilitado pelo cancro que agora o vitimou, Lewis ainda fez questão de viajar para Washington, para participar no movimento Black Lives Matter contra a discriminação racial, na sequência da morte do afro-americano George Floyd às mãos da polícia de Minneapolis.

"Hoje, a América lamenta o desaparecimento de um dos maiores heróis da história do país", escreveu a presidente da Câmara dos Representantes, a democrata Nancy Pelosi, num comunicado divulgado na sexta-feira.

John Lewis foi eleito para a Câmara dos Representantes em 1986 e era o mais novo e o último sobrevivente do movimento de defesa dos direitos cívicos, liderado pelo reverendo Martin Luther King Jr.

"Que a sua memória seja uma inspiração e nos leve a todos, perante a injustiça, a criar 'bons problemas e problemas necessários'", acrescentou Pelosi, numa referência a uma das frases mais usadas pelo antigo camarada de Martin Luther King. E sublinhou: "Era um titã do movimento dos direitos civis, cuja bondade, fé e valentia transformaram nossa nação".

O líder da maioria no Senado, o Republicano Mitch McConnell, fez também questão de juntar a sua voz às homenagens, afirmando que Lewis era um "pioneiro líder dos direitos cívicos, que pôs a vida em risco para lutar contra o racismo, promover direitos iguais e levar o país a aproximar-se mais dos princípios fundadores".

Neste sábado, a Casa Branca recordou igualmente a sua carreira em defesa dos direitos humanos. "O congressista John Lewis foi um ícone do movimento pelos direitos civis, e deixa um legado duradouro que nunca será esquecido", disse no Twitter a secretária de imprensa da Casa Branca, Kayleigh McEnany.

"A sua família está nas nossas orações, lembramos as incríveis contribuições do legislador John Lewis para o nosso país", escreveu ainda a assessora.

Aos 25 anos, quando liderava uma marcha pacífica, Jonh Lewis foi espancado pela polícia, na ponte Edmund Pettus, em Selma, no estado do Alabama. Mas acabaram por ser as imagens difundidas da brutalidade policial que forçaram o país a encarar de uma vez por todas a opressão racial que grassava nos estados do Sul.

Poucos dias depois desse episódio, que ficou conhecido por "Domingo Sangrento", Martin Luther King liderou milhares de pessoas em novas marchas no mesmo estado, o que levou o então Presidente norte-americano Lyndon Johnson a pressionar o Congresso para aprovar a lei que permitiu à população negra votar.




Uma vida dedicada à luta pela igualdade

John Lewis nasceu em 21 de fevereiro de 1940, nos arredores da cidade de Troy, no Alabama.

Era o quarto de dez irmãos de uma família de camponeses e cresceu numa comunidade negra, onde frequentou escolas públicas segregadas e rapidamente sentiu na pele a cruel discriminação por causa da cor da pele., o que o levou a agir. Tinha apenas 21 anos quando se tornou um dos fundadores dos "Passageiros da Liberdade", que sacudiu as consciências adormecidas dos americanos em relação ao sofrimento imposto à população negra no país.

John Lewis foi também o líder mais jovem da manifestação de 1963 em Washington, na qual Luther King proferiu seu histórico discurso "I have a dream" ("Tenho um sonho").

Dois anos depois, quase morreu durante a manifestação antirracista pacífica em Selma, no estado de Alabama, quando a polícia o espancou brutalmente, causando-lhe uma fratura no crânio.

Aquele dia ficou conhecido como "Domingo Sangrento" e, exatamente meio século depois, Lewis caminhou com Barack Obama, o primeiro presidente negro dos Estados Unidos, até ao emblemático local do icónico protesto.

John Lewis entrou para o Congresso em 1986, onde se tornou numa das suas autotidades morais. A atual líder Demecrata ali, Nancy Pelosi, considerava-o como "a consciência do Congresso". E de todos os quadrantes políticos têm chegado as homenagens ao corajoso activista, congressista escrupuloso e homem bom que foi John Lewis.

O presidente francês, Emmanuel Macron, saudou este sábado a sua memória, referindo-se à sua "vida de combate pelos direitos civis. Uma vida de belas lutas, para lutar por um mundo mais justo. Muito progresso foi feito graças a ele. John Lewis era um herói", escreveu na sua conta de Twitter.

John Lewis, que tinha anunciado em dezembro que tinha um cancro em estado avançado no pâncreas, afastou-se nos últimos meses da vida política para fazer tratamentos, mas no início de junho voltou a Washington para participar no movimento "Black Lives Matter".

"O vento está a soprar, a grande mudança está a chegar", profetizou numa debate sobre o racismo entre congressistas.
O antigo Presidente norte-americano Bill Clinton e a antiga secretária de Estado Hillary Clinton elogiaram também, por seu turno, Lewis, como "um gigante" que se tornou "na consciência da nação".

Barack Obama, que em 2011 lhe atribuiu a Medalha da Liberdade, a maior distinção civil dos Estados Unidos, voltou agora a homenagear, no Twitter, a sua memória.

"Poucos de nós vivemos para ver nosso próprio legado desdobrar-se de maneira tão significativa e notável. John Lewis conseguiu", escreveu o ex-presidente Obama.

Diário de Notícias com agências (ontem)

Imagem: John Lewis morreu aos 80 anos. Era o mais novo e único sobrevivente do movimento de defesa dos direitos cívicos liderado por Martin Luther King // © EPA/Erik S. Lesser

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