Entrevista a Jacinto Veloso
O
Major-General na Reserva, Jacinto Veloso diz que o principal objectivo do
terrorismo em Cabo
Delgado é atingir o projecto de gás. Falando no programa
Grande Entrevista, da Stv, considera que estamos todos impreparados para lidar
com o terrorismo naquela província e não concorda com as hipóteses segundos as
quais as acções resultam do descontentamento de uma certa ala dentro do partido
no poder, a Frelimo
Jacinto
Veloso, com uma larga experiência em matéria de segurança do Estado e
negociações para a paz, vamos falar dos 45 anos da independência, neste
capítulo da paz, que parece continuar a ser uma miragem para os moçambicanos.
Por que razão nós nunca experimentamos a plena paz em Moçambique?
Bom,
é uma pergunta difícil de responder, porque na realidade desde o
desencadeamento da Luta de Libertação Nacional, em 25 de Setembro de 1964, até
hoje, praticamente ainda não houve uma paz completa e total. É verdade que a
primeira guerra foi a guerra pela independência nacional. Portanto, uma guerra
justa, que culminou com a independência em 1975, mas mesmo depois disso, outras
guerras de desestabilização continuaram. Portanto, até hoje ainda não houve paz
total e definitiva, mas houve uma paz quase total depois dos acordos com a
Renamo, sobretudo a última série de negociações do actual Presidente, o
Presidente Filipe Nyusi com o falecido Afonso Dhlakama, que criaram caminho
para a paz definitiva. Infelizmente não está totalmente conseguida devido às
manifestações da auto-proclamada Junta Militar da Renamo, no centro do país,
que continua a fazer acções armadas, violentas, para conseguir objectivos que o
líder desta Junta pensa que é por via militar que os deve conseguir. E,
infelizmente também, desde há dois, três anos para cá a desestabilização em Cabo Delgado pelo
fundamentalismo islâmico. Portanto, nós temos paz na totalidade do território,
mas não temos uma paz total, e isto praticamente desde a independência.
Caracterizou
perfeitamente o cenário vivido, de instabilidade política e militar no nosso
país, nos últimos 45 anos após a independência, que são de guerra e pouca paz.
Ou seja, intervalos de paz. Olhando para este ponto que se referia, da cisão na
Renamo e emergência de Mariano Nhongo e a auto-proclamada Junta Militar, que
também veio pôr em causa esta paz que o Presidente da República estava a
negociar. Pela sua experiência em negociações para a paz, por onde é que se
deve começar a negociar este processo com Mariano Nhongo?
Eu
acho que daquilo que eu conheço, pela imprensa, pelas fontes públicas de
informação, o que é preciso fazer é o que está sendo feito. Pelo menos daquilo
que eu tenho conhecimento, que é exactamente pelo contacto pessoal, pelo
diálogo bilateral, usando todos os meios de persuasão, tentar convencer este
comandante Nhongo que será do interesse dele viver num clima de paz, do que
manter uma guerra. É preciso que este senhor e o grupo dele entendam que o que
é preciso preservar é o interesse nacional de Moçambique, dos moçambicanos, não
os interesses de um grupo que aparentemente ele defende.
Isso
já não sei dizer, mas acho que de acordo com aquilo que tenho lido de alguns
mensageiros, que fazem parte do processo de DDR, contactos imagino, tanto da
parte do Governo, como da parte da Renamo, que em princípio, imagino, devem
estar a trabalhar. Se não estão, deviam estar a trabalhar para aproximar este
comandante dissidente, para que perceba que o interesse do país, assim como o
dele não é aquele, ele tem que compreender que aquilo é prejudicial a ele
próprio.
Considerando
que na sua obra “A Caminho da Paz definitiva” descreve a Renamo como sendo o
grande iceberg, 20 por cento visível, 80 por cento invisível. Com Mariano
Nhongo a liderar os ataques, considera-o como sendo o novo iceberg?
Não,
acho que não. Neste caso acho que não há um iceberg. Existe um pedaço de
gelo flutuante ali, mas não tem dimensão profunda. É um gelo flutuante, talvez
tenha alguns apoios, mas são apoios que na minha opinião são muito pequenos.
Está
em curso o processo de DDR. Acredita na desmilitarização definitiva da Renamo?
Acredito,
sobretudo porque a própria Renamo já concordou com isso. Eu acho que a Renamo
hoje, o caminho que está a escolher, daquilo que eu entendo, pelas entrevistas
e conversas… eu não sou conselheiro da Renamo, mas o que a Renamo deve fazer é
preparar-se politicamente para ganhar eleições e para fazer um programa que
seja alternativo ao desenvolvimento de Moçambique. E que as pessoas, o cidadão
normal compreenda que esta via é a boa via. Bom, não sei se é fácil isso, mas o
caminho, na minha opinião, é esse. Um caminho pacífico e político, de disputa
política, não militar, quer dizer, está fora de questão o uso da via militar
para atingir os fins políticos.
Por
não se crer que a via militar seja o caminho para atingir fins políticos, o que
é que deve pressupor ser o processo de reintegração dos homens da Renamo, para
que não haja muitos descontentamentos?
Não
estou muito por dentro desse [ponto] particular, mas acho que daquilo que eu
conheço, aquilo que está a ser feito é o que deve ser feito, e que os membros
desmobilizados reintegrem e consigam reorganizar a sua vida e das suas
famílias. Penso que este é que é o segredo do sucesso, agora tem que haver os
meios mínimos para que cada um dos desmobilizados possa conseguir reorganizar a
sua vida já numa sociedade livre de guerra.
Não
é um risco reduzir a importância dos ataques perpetrados por Mariano Nhongo,
considerando até a experiência do surgimento da própria Renamo, que no
princípio era descrita como sendo bandidos armados que em pouco tempo poderia
se ter algum controlo sobre eles, mas o tempo provou que não? No caso de
Mariano Nhongo, não estaríamos a reduzir a sua importância?
Do
ponto de vista prático, a hipótese a considerar é que pode haver algum apoio,
mas eu estou seguro, pelas informações de que disponho, que Mariano Nhongo não
tem uma retaguarda como teve a Renamo no seu início, porque a Renamo, no seu
início, teve algum apoio interno. Houve descontentamentos internos, que foram
bem aproveitados pela Renamo e também havia outros interesses, outros
interesses a nível global, sobretudo na confrontação Leste-Oeste, do conflito
bipolar União Soviética-Estados Unidos da América, socialismo
científico-capitalismo, que estava muito interessada em apoiar as intenções da
Renamo dentro de Moçambique, para desestabilizar o sistema da Frelimo, que era
considerado um sistema pró-União Soviética ou pró-socialismo científico,
concretamente pró-comunismo, o que desagrada e põe os Estados Unidos
imediatamente contra criar as condições para enfraquecer esse regime.
Além
disso, era uma grande ameaça a um sistema socialista tipo União Soviética e uma
grande ameaça aos interesses capitalistas na África do Sul, na Rodésia, na
altura, depois mais tarde Zimbabwe, já depois da independência nossa, em toda a
região, e os interesses da Europa e dos Estados Unidos. Portanto, é muito
diferente ter uma organização que desenvolve uma guerra com o apoio dos Estados
Unidos e seus aliados, do que um apoio interno, pequeno, de dissidentes, mas
que não é um apoio substantivo. Portanto, para responder a pergunta, acredito
que não, não é o caso.
Os
ataques de Mariano Nhongo, na região centro do país, não são a única prova da
falta de reconciliação nacional. O terrorismo em Cabo Delgado é também
um exemplo disso. Qual é a face negra da penetração do Daesh em Moçambique?
É
uma situação que ainda não está bem esclarecida, há várias hipóteses, têm
havido vários estudos de académicos moçambicanos, franceses, portugueses,
norte-americanos, finlandeses e outros que têm estudado o assunto e creio que
não estão explicadas as razões, mas…aliás, a tendência de todos estes estudos e
investigações tendem a concluir que é uma revolta interna, dentro de
Moçambique, dentro dos muçulmanos de Cabo Delgado, que estão descontentes com o
Governo da Frelimo, portanto, que o Estado é fraco e por isso estão
descontentes e revoltaram-se.
E
não concorda com essa teoria?
Não
concordo. Que haja descontentamento, que a gestação dos interesses da população
de Cabo Delgado não esteja a ser a melhor possível, ou se calhar não é possível
ser a melhor possível, posso concordar. Mas que a revolta vem daí, para mim
está fora de questão. Que esta desestabilização em Cabo Delgado ,
claramente agora, já tinha dito antes, mas agora está claro que é o Estado
Islâmico, como sabe, é uma organização muito poderosa, que tem muitos meios,
tem muita capacidade de actuação, tem técnicos, tem pessoas, tem quadros,
especialistas militares de todo o tipo para actuar, que sabem como fazer
desestabilização, sabem como desenvolver o terror nas populações, para poderem
criar um ambiente favorável à sua actuação, e portanto, isso só pode ser feito
a partir do exterior.
A
minha hipótese de trabalho é que há um interesse algures, não consigo ainda
identificar onde, mas algures, que está preocupado com o desenvolvimento…mas o
principal, depois posso falar dos outros, é o desenvolvimento das reservas de
gás natural. As reservas de gás natural despertam na competição, na
concorrência algumas ideias de que isto pode ser prejudicial aos interesses de
outros desenvolvimentos de gás e petróleo noutras partes do mundo, e que é
preciso atrasar ao máximo esse curso.
Então,
eu creio que o objectivo final do desencadeamento do fundamentalismo islâmico em Cabo Delgado pretende
atingir o projecto do gás. Existem outros objectivos secundários, que talvez
são aqueles que parecem mais evidentes, e nós sabemos pelas informações
públicas, aliás, já bastante difundidas, que em Cabo Delgado existe
uma série de actividades informais, ilegais, que desenvolvem muitos projectos,
pedras preciosas, semi-preciosas, madeiras importantes, pesca de certos
produtos, etc., e como um corredor de droga, há-de haver interesses de
indivíduos ligados ao Estado Islâmico, que usam esta desestabilização para
manter ou desenvolver os seus negócios.
Considerando
que as intervenções externas ganham mais pujança quando existe este
descontentamento local, não acha que é demasiado arriscado assumir que é apenas
motivação externa e desconsiderar factores como exclusão, como a fraca presença
do Estado como razões ou factores que determinam esta situação?
A
ideia não é essa, a ideia é que o interesse, o objectivo final são grupos de
pessoas que conhecem a realidade, sabem o que querem e usam o esquema dos
serviços secretos ou vários serviços secretos conjugados, que usam os meios
para, primeiro certamente, antes disto tudo começar, a violência começar,
estudaram que problemas existem em Cabo Delgado , que tipo de descontentamento
existe, que possa ser utilizado para introduzir, apoiar ou fomentar revolta
interna. Este é o primeiro passo, porque o descontentamento nesse aspecto de
que falam os académicos e outros existe em praticamente todo o Moçambique, o
Governo não consegue por limitações orçamentais e outras resolver os problemas
de toda a população em todo o Moçambique, não é possível.
Mas
no caso de Cabo Delgado, não terá sido a razão maior para que estes agentes
terroristas conseguissem encontrar um terreno fértil para as suas acções?
Eles
estudaram, na minha perpectiva eles estudaram…a coisa é assim, o serviço
secreto como é que funciona na minha opinião, neste caso? Primeiro, qual é o
objectivo? O objectivo é perturbar, desestabilizar o projecto do gás. Agora,
como atingir esse objectivo? Vamos estudar a situação no local. Quais são os
descontentamentos e por que razões existem? Neste caso, sendo uma região
islamizada existiam algumas contradições entre o islão clássico e algum
fundamentalismo que já se tinha introduzido de alguma forma, que não
concordava, que era preciso ser mais radical, etc. Isto foi utilizado por esse
grupo que estudou o assunto para actuar. Portanto, o objectivo é de perturbar o
projecto do gás. Então, a utilização do descontentamento é produto do estudo
que a entidade desestabilizadora fez, para instalar a desestabilização, não sei
se me estou a fazer entender. Porque depois há outros interesses, interesses de
pedras preciosas, são sub-interesses.
Quem
são os grandes players do gás no mundo com o interesse de retardar a
entrada de Moçambique?
Não
sei dizer, era preciso estudar isso melhor, não tenho informação exacta. O
Joseph Owner apresenta uma série deles como sendo a Rússia, no Médio Oriente
uns e outros, o Irão. Mas eu não iria entrar nisso, alguém terá que estudar
isso melhor, do que eu.
Jacinto
veloso diz num artigo publicado recentemente que todos nós estamos preparados
para reagir a esta pressão terrorista que se prevê que seja de grande
amplitude, mas ainda assim precisamos reagir. Por onde começar?
Disse
isso para reagir aos vários artigos e análises que foram feitas nos jornais,
sobretudo nos semanários, que apresentam sempre o assunto, os problemas em Cabo Delgado são
devido à existência de um Estado fraco de contradições, de falta de solução de
problemas, descontentamento interno local das pessoas quanto ao Governo e sobretudo
estas razões. E por outro lado, a deficiência das Forças de Defesa e Segurança
em relação ao fenómeno, portanto, também está fraco, quer dizer, tudo está
fraco, de uma maneira geral. E realmente, o que eu digo é que não estamos
preparados, todos estamos despreparados.
As
FDS estavam despreparadas, o Governo estava despreparado, esses jornalistas
estão despreparados, não têm noção exacta da realidade. Mas não estou contra
eles, eles fazem bem em fazer aqueles estudos e escritos, porque chamam a atenção,
contudo, falta-lhes informação de fundo. Mas talvez ninguém tinha na altura,
portanto, é nesse aspecto que eu digo que estamos despreparados. O processo
está em marcha, daquilo que eu sei e daquilo que conheço e do que já está
publicado nos jornais há uma melhoria substancial na resposta à agressão do
fundamentalismo islâmico.
Estão
em preparação uma série de medidas de governação para o desenvolvimento da
zona, não só em Cabo
Delgado , foi criada uma Agência de Desenvolvimento Integrado
do Norte, que engloba as províncias de Cabo Delgado, Niassa e Nampula, que tem
como missão exactamente ir atender estas províncias. O reforço das FDS está a
aumentar e a acção está a melhorar, embora estejamos a assistir nestas últimas
semanas, que o fundamentalismo islâmico também está a aumentar.
Não
dão trégua a esta guerra. Estão a aumentar, estão a avançar até para o interior
das cidades, disfarçando-se de comerciantes e procuram criar uma rede de
agentes adormecidos, para lograr sucessos a médio e longo prazo. Com este nível
de avanço que estratégias é que podem ser usadas para o contra-ataque?
Bom,
isso é preciso ter informação. A informação é a chave do sucesso. Mesmo a
Olívia tem que ter informação para preparar essas notas, tem que ter informação
mínima. Então, as FDS tem que melhorar, não sei se tem que melhorar, mas
certamente tem que intensificar a sua capacidade de recolher e analisar a
informação para poder reagir e neutralizar estas acções. Portanto, a chave é a
boa informação, bom equipamento de intersecção de informação, de gestão da
informação para poder fazer os planos de neutralização destas acções inimigas.
Como
é que analisa a estratégia do silêncio oficial sobre o terrorismo em Cabo Delgado ?
Há
alguma falta de informação, mas eu penso que isso vai melhorar.
Até
que ponto esta estratégia do silêncio é acertada, considerando a visibilidade e
o impacto da propaganda dos terroristas?
Eu
não creio que haja uma estratégia de silêncio, o que há talvez ainda é uma
falta de organização suficiente. O sistema de contra-informar e informar
publicamente…infelizmente temos recebido mais informações do Daesh, do que do
Governo, mas o Daesh tem uma máquina importante e grande, organizada para fazer
isso, inclusive com fotos, etc. Mas penso que estamos a nos organizar para
responder da mesma maneira, mas acredito que brevemente as coisas vão melhorar,
acredito.
Considera
ou assume que o Daesh tem uma máquina de propaganda muito forte. Como combater
esta narrativa vitoriosa que eles têm propalado, e principalmente entender a
sua estratégia para melhor contra-ataque.
Isso
é preciso contra-actuar, neutralizar essas forças no local, lá no terreno. De resto,
não há outra solução, é contra-actuar com todos meios.
O
terrorismo é ainda o único crime penalizado em todo mundo. O que se pode
esperar do apoio vindo de outras latitudes?
Bom,
normalmente, mas isso depende do Governo de Moçambique, que apoios é que está a
solicitar, de uma maneira geral, diversos países e organizações já se mostraram
disponíveis, alguns em análises, informação, mas é sempre muito complicado na
parte, digamos militar, de deslocar pessoas. Por exemplo, da parte da África do
Sul, não sei qual é a atitude, mas provavelmente está disponível para apoiar,
mas para apoiar precisa de várias coisas, precisa pedir autorização do
Parlamento, há uma burocracia que tem que ser cumprida para poder apoiar. Mas
eu não conheço, não sei quais são as medidas, as solicitações que o Governo
está a fazer para apoios à luta contra o Estado Islâmico em Cabo Delgado.
Quais
são as experiências internacionais de protecção do interesse nacional, válidas
para Moçambique no contexto de ataques terroristas, como este que estamos a
sofrer?
Exemplos
sempre vem da Argélia, a Argélia há uns anos viu o fundamentalismo islâmico a
desenvolver-se, desenvolveu-se…a Argélia o que fez? A solução que encontrou foi
desenvolver as Forças de Defesa e Segurança para conter a acção do islamita
fundamentalista e permitir que a economia continuasse a funcionar, isto é
importante, porque uma das intenções destes terroristas islâmicos é paralisar a
economia para tirar as vantagens que podem tirar. Na Líbia, a acção terrorista,
que tomou conta de uma vasta área, incluindo poços de petróleo, chegou a vender
petróleo para contrabandistas de petróleo pelo mundo e fez as suas receitas, a
partir daí mataram e desalojaram. No Iraque ocuparam vastas zonas, mas foram
desalojados por uma coligação internacional muito grande, aliás, chefiada pelos
Estados Unidos da América e conseguiram recuperar todo o território ocupado, um
território enorme, superior a superfície de Inglaterra, que eles dominavam,
entre o Iraque e a Síria, mas mesmo assim não acabou a actividade do Estado
Islâmico, estão nas montanhas, do Iraque, em particular que faz incursões de
guerrilha, mas deixaram de administrar regiões. A acção tem que ser
político-militar, social e económica, para contra-actuar.
No
ano passado Moçambique assinou um memorando com a Tanzânia, para operações
conjuntas contra o terrorismo, mas desde 2017 mantinha contactos com o Uganda,
Quénia e República Democrática do Congo. No caso da Tanzânia, o contacto não
tardou, considerando que é um país chave em termos e passagem marítima,
terrestre, destes terroristas vindos da República do Congo?
Não
tenho informação sobre isso. Realmente não tenho.
Como
é que a Renamo pode ser incluída na luta contra o terrorismo?
Eu
penso que a luta contra o terrorismo, este fundamentalismo islâmico, a luta é
de interesse nacional, é o interesse nacional que está em jogo, e a Renamo,
acredito que no mínimo deve estar solidária com esta luta e pode ser, não é
pode ser, é que integrando, os membros da Renamo são cidadãos, se estão no
exército ou onde estão, certamente tem por obrigação participar nesta luta.
Esta é a minha opinião.
Como
é que o Estado deve organizar-se e prepara-se para acolher as vítimas deste
terrorismo, já é uma realidade o êxodo de homens, mulheres e crianças expostas
a esta acção?
Acho
que as instituições do Estado, como o INGC vão ter que actuar para fazer face,
acolher e dar assistência a essas pessoas deslocadas.
Fala-se
de evidências já remotas, desde 2007. De 2014 a 2017 foi o período de incubação política,
e de meados de Junho de 2017
a meados de 2019, os ataques foram marginalizados, e
parece ter havido uma reacção tardia a esses ataques. Porquê não tivemos a
capacidade de prever estas ameaças?
Para
mim é uma incógnita também, não sei responder.
Sente
que houve uma má compreensão política e operacional em relação a esta situação?
Imagino,
mas não posso garantir se foram menosprezadas estas acções que estavam a
decorrer. Mas também, hoje diz-se que isso estava em incubação, isto é uma
análise a posterior, porque quem fez essa análise, hoje, se soubesse disso
naquela época, se tivesse dito está a acontecer isto, mas não disse nada.
Então, esta é uma análise a posterior, que é fácil fazer. É como o treinador de
bancada, que diz “se eu tivesse chutado, era golo”, o outro falhou porque
estava fora de jogo, quer dizer, são formas que pretendem chamar atenção do
Estado, que deve se organizar melhor. Nesse aspecto serve como conselho…nos
fizemos erros monumentais no passado, mas só nos apercebemos muito mais tarde.
Portanto, é fácil depois do acontecimento fazer críticas e perguntar por que
não fizeram. A minha hipótese é de que tomou-se consideração de que havia o
fenómeno, mas menosprezou-se o alcance do mesmo.
Nuno
Rogeiro, autor da obra “O Cabo do Medo - O Daesh em Moçambique 2019-2020” , diz no seu livro que o
SISE deu informações úteis, e que nem sempre foram seguidas por quem de
direito. Considerando que o SERNIC fez o seu papel em termos de investigação,
não acha que paralelamente faltou uma intervenção, força física repreensiva,
para cortar o mal pela raiz?
Isso
é o que diz o senhor Nuno Rogeiro. Diz isso, e eu conheço-o de nome. Pessoas
que conhecem muito bem este senhor Nuno Rogeiro dizem que é uma pessoa que quer fazer
coisas espectaculares para mostrar que sabe muito, portanto, isso é o que ele
diz. Entre o que ele diz e a realidade vai um espaço.
Isso
para dizer que não acredita que tenha sido mau uso da informação produzidas
pelas equipas de investigação no nosso país.
Pode
ser aquilo que eu disse antes, menosprezo da informação, mas eu próprio ponho
em dúvida que essa informação existiu da maneira como o senhor Nuno Rogeiro
diz.
Qual
é a sua teoria sobre a forma como Moçambique conduziu este processo para chegar
até onde está?
Eu
não tenho nenhuma teoria, só olho para a realidade, o que aconteceu é isto,
agora o que temos que fazer é reagir para neutralizar o que está a acontecer.
Podíamos ter feito um pouco antes, mas não fizemos, temos que fazer agora,
agora é que é preciso actuar, porque é agora que o problema se manifestou e que
nós tomamos a consciência plena de que estamos diante de um Estado Islâmico
altamente organizado, altamente bem financiado e municiado, que temos que
enfrentar, esta é a situação actual.
E
acha que os moçambicanos estão plenamente unidos para enfrentar o terrorismo?
Quanto
a esse aspecto, acho que plenamente não direi, mas 99 por cento acho que sim.
Fala-se
de rivalidades entre o SERNIC, o SISE e outros órgãos de inteligência das
Forças Armadas de Defesa de Moçambique e da PRM. A ser verdade, como eliminar
esta competição negativa e evitar que haja divisão em tempos que se exige mais
união?
Essas
são especulações exteriores a esses organismos, já no meu tempo isso existia,
mas como é que resolvíamos? Existe uma entidade chamada Comando Conjunto, em
que todas essas forças fazem parte. Então, esse Comando Conjunto resolve esses
problemas. Não há razão para haver competição entre este ou aquele. No passado
isto existia, mas sempre se resolve desta forma. Agora, o uso destas
desinteligências por parte dos críticos e analistas políticos é exagerado. Não
há razão para fazerem esses exageros todos.
Tem
esperança de testemunhar a paz efectiva em Moçambique?
Certamente,
não tenho dúvida.
A
curto, médio ou longo prazo?
Médio,
longo prazo. Isto por causa de Cabo Delgado, porque quanto ao resto não tenho
dúvida que será muito rápido.
Olívia Massango | O País
(mz)
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