A
passagem repentina do "olhem para nós a mostrar ao Mundo como se faz"
para o "estamos a caminhar assustadoramente para o abismo dos
contágios" é um traço distintivo da esquizofrenia lusitana.
Somos
campeões olímpicos da variação coletiva de estados de alma. Ainda assim, não
devemos render-nos a esta fatalidade. Estamos a colher o que semeámos. No que
gerámos de expectativas não cumpridas, no que não acautelámos no passo decisivo
rumo ao desconfinamento.
Apesar
de, durante a reclusão inicial, os portugueses terem sido exemplares, apesar de
terem sido criadas condições políticas ímpares, apesar da tremenda abnegação
dos profissionais de saúde. Hoje, com a viagem tormentosa a meio
(esperamos), só podemos dar graças pelo facto de o Serviço Nacional de
Saúde não ter colapsado. Fomos competentes a lançar os dados.
É
justo reconhecer que a gestão de uma pandemia desta envergadura não traz livro
de instruções. Estamos a viver as dores mais sofridas do regresso à vida.
Travar a fundo é uma coisa, abrir urgentemente, mesmo que a medo, é outra. E
por isso é natural que a tensão entre os cientistas e os políticos se agudize.
Porque as incertezas decorrentes de uma maior imprevisibilidade nos
comportamentos individuais fazem aumentar o risco.
Os
políticos precisam de respostas cabais para tomar decisões, mas elas não
abundam. Nem mesmo entre os que produzem linhas orientadoras a partir dos
factos. Se há coisa que aprendemos é que todos os que cantam algum tipo de
vitória sobre este vírus maldito acabam por levar com as canas dos foguetes na
testa.
As
guerras videirinhas entre Norte e Sul sobre quem está a lidar melhor com o
"bicho" são tão mais paroquiais e absurdas quando falamos de um país
que se percorre de ponta a ponta em cerca de sete horas. O perigo muda de
geografia num sopro.
Ninguém
estava preparado para o que vinha, mas o exército de contaminados dará agora
lugar a um exército de desempregados, sobretudo nos setores mais atingidos,
como o turismo. É assustador pensar que, no final deste mês, quase 40% dos
restaurantes vão encerrar, quando terminar o período do lay-off simplificado.
É
assustador pensar que a galinha dos ovos de ouro da economia vai deixar a cesta
vazia durante não se sabe quanto tempo. De resto, o muro agora erguido pelos
ingleses faz adivinhar uma catástrofe ainda maior para a economia, ainda maior
para o Algarve. Era bom, por isso, que não falhássemos aqui como falhámos no
desconfinamento. O vírus é diferente, mas mata na mesma.
*Diretor-adjunto
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