Durante três meses de pandemia os
bilionários norte-americanos registaram um aumento da sua riqueza em 20%,
enquanto 45,5 milhões de trabalhadores dos EUA ficavam desempregados e milhões
de outros caíam num estado de extrema pobreza
José Goulão | AbrilAbril | opinião | Imagem de Brendan McDermid / Reuters
A filantropia está na moda. Não
se trata apenas da tradicional caridadezinha, os que podem aos que precisam,
mas de qualquer coisa muito mais grandiosa e assegurada por nomes sonantes da
elite que nos governa à escala global, dir-se-ia que compadecidos das
desigualdades gritantes, compungidos com as injustiças avassaladoras. Mergulham
as mãos nos seus biliões e espalham uns trocos no apoio a causas fracturantes e
que mobilizam a consciência de grande parte da humanidade. É certo que isso não
os impede de serem cada vez mais ricos, antes pelo contrário, mas quem pode
levar-lhes a mal? O mundo é assim!...
Personalidades como Al Gore,
George Soros, Mark Zuckemberg, Richard Branson, Jeff Bezos, Bill Gates,
fundações emanando de poderosos grupos como Ford, Rockefeller, Bloomberg,
Walmart, Heinz, Kellog, Lockheed Martin, empresas como a Shell, o fundo Black
Rock, os bancos JP Morgan Chase ou Goldman Sachs distribuem os seus fartos
lucros não apenas pelos accionistas mas também por indivíduos e organizações
envolvidos em activismo por grandes causas, sejam elas a revolução social, o
combate às alterações climáticas, a luta contra o racismo e outras de
equivalente generosidade. São, na aparência, corajosas e desinteressadas acções
filantrópicas cuja importância não escapa à comunicação social privada e
global, rendida a tão singular fenómeno como é o de os principais responsáveis
pelo estado degradado em que se encontra o planeta e pela situação humilhante a
que é submetida a humanidade serem os mesmos que colocam as fortunas ao serviço
da erradicação dessas anomalias. Assim como alguém que mata a sua própria
galinha dos ovos de ouro.
Existe, portanto, qualquer coisa
de invulgar nestes arroubos filantrópicos dos que gerem a plutocracia global.
Tão invulgar como o facto de as legiões de profissionais da comunicação de
gestão corporativa não se interrogarem sobre o que estará por detrás dessas
ostensivas exibições de generosidade.
Por exemplo, poderiam fazer
perguntas como: por que razão membros da casta ultraminoritária que embolsa
milhares de dólares por segundo, 24 horas por dia e 365 dias por ano, graças ao
capitalismo, sobretudo nas suas versões mais selvagens, financia «revoluções»
para supostamente instaurar a justiça social? Ou então, por que motivo, sendo a
discriminação social e o racismo inerentes ao capitalismo, os mais poderosos
entre os poderosos do capitalismo patrocinam acções alegadamente
anti-discriminatórias que minam o capitalismo? Ou ainda, quais as razões que
movem os principais destruidores do planeta a sustentar actividades que têm
como fim declarado o de regenerar o planeta?
Algumas hipóteses de respostas
Para tentarmos encontrar
respostas a estas e outras perguntas poderemos levantar várias hipóteses: os
plutocratas têm consciência do mal que fazem e pretendem atenuá-lo para
ganharem o reino dos céus; ou os plutocratas usam a filantropia para escaparem
aos impostos e amealharem assim mais uns biliões; ou os plutocratas compram o
activismo social, profissionalizando-o através da filantropia, para minarem
causas humanas fundamentais – o combate eficaz e consequente pela paz, pela
protecção do meio ambiente, pelo fim de todas as discriminações, por sociedades
onde prevaleçam a justiça social, a liberdade e os direitos humanos.
Sejamos francos e reconheçamos
que a primeira hipótese é meramente académica porque um capitalista que leva ao
apogeu a lei do mercado seguindo a liturgia sagrada da propriedade privada tem,
por definição, o lugar garantido no reino dos céus.
As outras hipóteses são válidas,
convergentes e explicam singelamente a proliferação de tantos actos
filantrópicos.
Regra geral, a generosidade de um
plutocrata não é gerida a partir dos próprios bolsos mas sim da gestão fiscal
das suas empresas, ou através de canais vocacionados para dois efeitos:
poupança nos impostos e filantropia. Assim nascem e se multiplicam as tão
aclamadas fundações que encaminham as doações para múltiplos fins, que podem ir
desde gestos que caem bem na opinião pública, mecenatos oportunistas
proclamados ao som das trombetas mediáticas, a actos de conspiração, subversão
e ingerência política – de que são exemplo muito conhecido, mas pouco
explicado, as «revoluções coloridas».
A corrupção da revolução
Uma «revolução colorida» assume
normalmente uma designação poética, mas não é isso que as uniformiza nos
objectivos. O que está em causa é a manipulação de movimentos de massas através
de instituições de activismo profissional, sustentada por filantropos e
serviços secretos, com a finalidade de mudar regimes e governos cujos comportamentos
não estejam sintonizados com o sistema imposto pelo regime neoliberal
globalista e que estabelece o padrão único de «democracia» – para funcionar
como ditadura económica.
Uma «revolução colorida» acontece
actualmente na Bielorrússia, a exemplo do que sucedeu na Geórgia e outras
ex-repúblicas soviéticas, especialmente na Ucrânia, onde levou o nazismo à
esfera do poder. Cabem na mesma definição as «primaveras árabes»,
designadamente a da Líbia, que culminou com a destruição do país por uma coligação
militar entre o terrorismo islâmico e a NATO; e a da Síria, onde entre os
grupos manipulados para a executarem figuram a al-Qaeda e o Estado Islâmico.
Também o golpismo em vigor na Venezuela recebe o patrocínio de filantropos e
das correspondentes agências norte-americanas dependentes dos serviços
secretos, como é o caso da United States Agency for International Development
(USAID) e do National Endowment for Democracy (NED). O exibicionista excêntrico
Richard Branson, dono da Virgin, foi um dos patrocinadores da operação golpista
«humanitária» que cobriu a tentativa de infiltração terrorista na Venezuela em
Fevereiro de 2019.
Pode o leitor estar certo de que
por detrás de cada «revolução colorida» é possível encontrar o financiamento do
magnata húngaro-norte-americano George Soros, através da sua constelação de
fundações Sociedade Aberta (Open Society).
Uma «revolução colorida» é,
portanto, uma corrupção e uma inversão do conceito de revolução social porque
tem como objectivo forçar o alinhamento de um determinado país no sistema
capitalista neoliberal. Para isso servem os filantropos.
Os salvadores do planeta
A exemplo do que acontece com as
«revoluções coloridas», por detrás de cada «agenda verde» para adaptar o
planeta às alterações climáticas e para sanear o meio ambiente está uma miríade
de plutocratas na sua função de filantropos.
O ex-vice-presidente
norte-americano Al Gore é uma figura de topo destas operações através do seu
grupo de empresas «verdes», isto é, que se dedicam a transformar em prometedores
negócios as alterações económicas alegadamente orientadas por instaurar uma
sociedade menos poluente e menos poluída. Ao seu lado vamos encontrar um vasto
universo de fundações com inspiradores nomes sonantes – Rockefeller, Ford,
Valmart, Bloomberg, Hewllet – instituições como os bancos JP Morgan Chase e
Goldman Sachs, o fundo Black Rock e os inevitáveis George Soros e Bill Gates,
uma espécie de filantropo-mor com patrocínio de múltiplas actividades. Como
pode ver-se, são estrelas das mais cintilantes na estratosfera do capitalismo
neoliberal, causador da destruição do planeta; e que surgem agora, por encanto,
como salvadoras do planeta.
Em Portugal também. Vejamos o
exemplo doméstico dado pela Fundação Gulbenkian, que deve a sua estrepitosa
abundância à exploração de combustíveis fósseis e reservou um milhão de euros
para a jovem sueca Greta Thunberg, uma activista profissional sustentada pela
estrutura de «negócios verdes» e anti-petróleo de Al Gore. A dissonância do
prémio é apenas aparente porque, em boa verdade, ninguém pensa em deixar de
explorar combustíveis fósseis enquanto houver combustíveis fósseis.
Tal como acontece como as
«revoluções coloridas», a filantropia «ecológica» não passa de um exemplo de
investimento ligeiro em operações que potenciam o capitalismo neoliberal,
proporcionando mais e chorudos lucros. É assim que os mais ricos entre os mais
ricos continuam a engordar as suas obscenas fortunas a alta velocidade, mesmo
em plena pandemia, enquanto o mundo se afunda no descalabro económico e social.
A herança de George Floyd
O bárbaro assassínio de George
Floyd e o movimento de repúdio que se lhe seguiu contribuiu para destapar um
pouco, mas não em condições de chegar à comunicação social corporativa, o
carácter ambíguo e colaboracionista de entidades, como Black Lives Matter
(BLM), que rapidamente tomam conta e manipulam movimentos genuínos de massas.
As fundações Soros, Rockefeller,
Ford e Kellog, e até grandes bancos, figuram entre os financiadores do BLM e
certamente não é para combater o racismo, que é inerente ao capitalismo.
Os factos falam por si. Ao
manipular as manifestações contra o racismo por causa de George Floyd, o Black
Lives Matter, contando com elevado nível de propaganda na comunicação social
corporativa, contribuiu para a sua gradual extinção. Para que tudo tenha ficado
exactamente na mesma, como deve ser. Com a particularidade, neste caso, de a
entidade em causa ser utilizada para traficar fundos ilegais destinados à
campanha do candidato presidencial Joe Biden – uma vez que o universo
filantrópico e globalista está preferencialmente associado ao Partido
Democrata, a outra face do partido único do regime totalitário dos Estados
Unidos da América.
A filantropia praticada pelos
plutocratas é o oportunismo e o cinismo elevados à mais alta potência. Assenta
em fuga legal aos impostos, em investimentos moderados com grandes taxas de
retorno, em manipulação e descrédito de causas que poderiam fazer abalar o
sistema económico e político vigente.
Empresas de guerra como são os
grandes fabricantes de armamentos Raytheon e Lockheed Martin, responsáveis por
milhões de mortes em todo o mundo, também integram a brigada dos filantropos:
as suas «fundações caritativas» dedicam-se, por exemplo, a projectos educativos
e até, imagine-se, a salvar vidas – mas desde que sejam ameaçadas pela
COVID-19.
A filantropia assim praticada é
uma fórmula garantida para degradar ainda mais uma sociedade doente à escala
global.
Para que o mundo seja e continue
assim.
José Goulão, Exclusivo O Lado Oculto/AbrilAbril
Sem comentários:
Enviar um comentário