Paulo Baldaia* | Jornal de Notícias
| opinião
Não me parece que seja necessário
um QI muito elevado para distinguir entre informação obtida ilicitamente que
tem relevância criminal e que não tem relevância de espécie alguma.
Serve esta introdução para deixar
claro que não vejo a menor relevância na forma como o primeiro-ministro se
referiu aos médicos que terão recusado trabalhar em condições de risco elevado.
Na verdade, tirando a expressão
pouco elegante, utilizada por António Costa para classificar a decisão dos
médicos que estavam destacados para trabalhar no lar de Reguengos, nem sequer
há o mínimo de novidade em relação ao que o chefe do Governo pensa da Ordem dos
Médicos e aos médicos com que entra em conflito. É, aliás, muito fácil imaginar
o que dirá o primeiro-ministro, em conversas privadas, sobre a bastonária da
Ordem dos Enfermeiros. Fica entre eles e os amigos dele. O contrário deve ser
igualmente verdade.
De igual forma, sendo obtida
ilicitamente nunca faz prova, mas havendo indícios criminais, essa informação
deve dar origem a um inquérito. Considerar, como muitos fizeram, que a conversa
do primeiro-ministro com jornalistas deve ser considerada em igualdade com a
informação obtida por Rui Pinto a propósito de alegados crimes cometidos no
mundo do futebol ou na criação da fortuna de Isabel dos Santos pretende apenas
lançar a confusão. Uns porque pretendem desvalorizar a informação conhecida
sobre os crimes de colarinho branco e outros porque entendem que no combate
político vale tudo.
A verdade é que ficamos presos a
uma discussão sem sentido feita a propósito de um tom desagradável usado por
António Costa, a propósito de uma polémica que estava a causar mossa na imagem
da ministra da Solidariedade, em particular, e na imagem do Governo, de uma
forma geral. Gastamos sempre menos tempo a discutir o essencial que a discutir
o acessório.
Medimos tudo pelo grau de
polémica que o debate pode ter. Até os que atacam António Costa pela expressão
que utilizou para se referir a médicos lhe estão, afinal, a fazer um favor. Não
houve tempo, nem qualidade de debate para tentar saber com mais certeza se o
relatório da Ordem dos Médicos, apontando falhas graves no Lar e na ação do
Governo, era apenas o relato de factos ou um acerto de contas com o Executivo.
Voamos rápido para a guerra das claques, o que facilita a vida a quem tem o
poder. Nunca há responsabilidade pelos erros cometidos. Há apenas uma eterna
confusão em que ninguém se entende e se procura, apenas, contar os likes de um
lado e do outro.
*Jornalista
Nota: Paulo Baldaia cessa
hoje a sua colaboração no JN. A Direção agradece a dedicação que ao longo
destes anos demonstrou para com o Jornal.
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