quarta-feira, 2 de setembro de 2020

Portugal | Os bancos maus

Domingos De Andrade* | Jornal de Notícias | opinião

O que se passou com a resolução do BES em 2014, no Governo PSD/CDS, e a venda do Novo Banco ao Fundo Lone Star em 2017, no Governo PS, é demasiado sério para que o relatório da auditoria da Deloitte pouco mais tenha servido do que de arma de arremesso da Oposição ao Governo socialista e dos socialistas ao Governo então liderado por Passos Coelho.

Do que se sabe, e é pouco, do que se saberá depois do documento ser expurgado dos segredos do sigilo bancário, e prevê-se que pouco seja, sublinham-se os milhares de milhões de prejuízos, que residem num passado longínquo onde tudo cabe e as responsabilidades se diluem.

Esse, o passado, começa no comunicado do Ministério das Finanças, que assinala "insuficiências e deficiências graves de controlo interno no período de atividade até 2014 do Banco Espírito Santo". São apontadas perdas de quatro mil milhões de euros em 283 operações, a grande maioria das quais recuando ao tempo da resolução.

São as primeiras informações que permitem, por exemplo, à Administração do Novo Banco justificar as perdas incorridas à "exposição de ativos que tiveram origem no período de atividade do BES e que foram transferidas para o NB". Permite mais, segundo um comunicado da Administração de António Ramalho: "evidencia a importância da alienação de ativos para a recuperação do balanço" do banco. Em linguagem simples, contas simples: o passado é mau, o presente é extraordinário, o futuro é radioso.

O presente, e a auditoria só abrange o período entre 2000 e 2018, deixa de fora dúvidas tão legítimas quanto se a venda à Lone Star agravou ou não as condições da instituição, ou como foi possível que em cinco operações o banco tenha perdido 600 milhões de euros, mais a rede intrincada dessas vendas e a quem.

Claro é o facto de um banco bom criado para salvar um banco mau ter hoje a sua credibilidade nacional e internacional hipotecada, apenas suportado pela resiliência dos clientes. E dos contribuintes, para quem nada disto pode ser normal.

*Diretor

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