Idah Z. Pswarayi-Riddihough* | O País | opinião
Como diz o ditado, prevenir é melhor do que remediar. Essa sabedoria popular aplica-se tanto às crises de saúde pública, aos desafios de segurança e desenvolvimento assim como à prevenção de conflitos. Prevenir conflitos não apenas salva vidas, o que por si só bastaria, mas também protege os ganhos económicos e sociais alcançados durante o processo de desenvolvimento económico. Igualmente importante, ao afetar a educação e saúde públicas, a infraestrutura e as instituições fundamentais do estado de direito, os conflitos afetam a capacidade do país se desenvolver a longo-prazo, comprometendo seriamente as chances de progresso das gerações futuras.
No ano passado, Moçambique assinou um acordo de paz com a RENAMO para pôr termo a um longo conflito. Ao mesmo tempo que esta assinatura representa uma oportunidade real para uma paz duradoira e sustentável, uma nova frente emergente e potencialmente mais complexa de conflito violento vem se consolidando na província mais setentrional de Cabo Delgado.
A escalada da violência
Pouco se sabe ao certo sobre os perpetradores, seus patrocinadores ou suas intenções: no entanto, o que está claro é que quanto mais tempo o conflito durar, mais arraigado se tornará e maiores serão os custos em termos de destruição humana, social, e capital cultural; em termos de vidas perdidas; em termos de jovens ligados a grupos extremistas; e em termos de perda de crescimento económico e potencial de desenvolvimento.
Prevenir o início ou escalada de conflitos violentos e administrar crises é complicado pela confluência de múltiplos desafios que reforçam e amplificam a fragilidade institucional existente. Fragilidade institucional, por sua vez, reforça a pobreza e limita os esforços em criar oportunidades equitativas para todos.
Por outro lado, o desígnio de
acabar com a pobreza e aumentar oportunidades económicas sofreu seu pior revés
globalmente este ano desde que começamos a rastreá-lo de forma consistente, uma
vez que
Populações deslocadas internamente,
populações vulneráveis, jovens, mulheres, idosos e aqueles que ganham a vida
nas margens ou no setor informal já encaram dificuldades imensas para aceder a
serviços básicos, uma fonte de sustento, abrigo e segurança alimentar. São
estes grupos que terão sido mais afetados por estes choques consecutivos e que
estão em maior risco agora com os impactos do conflito violento
A eclosão da pandemia COVID-19 em Moçambique num momento em que o país começava a recuperar-se da devastação causada pelos dois ciclones de 2019, destaca o papel das vulnerabilidades pré-existentes na determinação da capacidade e habilidade das instituições formais e informais para mitigar o impacto dos choques.
É nossa convicção que o custo humano e económico do conflito exige que todos os envolvidos trabalhem de forma mais colaborativa por meio de abordagens direcionadas, flexíveis e sustentáveis para apoiar as agendas nacionais e regionais de prevenção.
Nos três meses desde que assumi o cargo de Diretora do Banco Mundial em Moçambique, tive a oportunidade de me encontrar e ouvir perspetivas de uma ampla gama de partes interessadas. Estas conversas reforçaram que, como parceiro do Governo de Moçambique, do povo de Moçambique e dos atores de desenvolvimento do país, o Banco Mundial tem um papel fundamental a desempenhar no apoio aos esforços do Governo para abordar as questões centrais de desenvolvimento que sustentam os desafios da fragilidade em Moçambique.
À luz desses elevados riscos em Moçambique, e numa tentativa de alinhar os esforços do Governo com os da comunidade de desenvolvimento para mitigar o perigo de uma escalada da violência, Moçambique é elegível para assegurar um financiamento adicional de USD $ 700 milhões da Associação de Desenvolvimento Internacional do Banco Mundial (IDA), especificamente para tratar das causas subjacentes de fragilidade e conflito no país.
A experiência global destaca uma série de lições importantes para uma prevenção bem-sucedida: que a prevenção eficaz tem que ser um empreendimento coletivo; conduzido internamente pelo governo como o principal ator na formação de um caminho para o desenvolvimento sustentável e a paz; e construído sobre os pontos fortes existentes com o apoio local e de parceiros internacionais em todo o espectro político, humanitário, de segurança e paz, para facilitar uma ação oportuna e eficaz.
Os exemplos mais bem-sucedidos de prevenção, incluindo da Indonésia, Burkina Faso, Quênia e Serra Leoa, envolveram uma extensa consulta e mobilização de uma coalição de actores domésticos para alavancar as vantagens comparativas da sociedade civil, incluindo grupos de mulheres, jovens, atores religiosos e do setor privado, contando com o apoio da comunidade internacional. Em resposta à instabilidade subnacional em Camarões, Ucrânia e Nigéria, mecanismos multilaterais como Avaliação da Recuperação e Construção da Paz (Recovery and Peacebuilding Assessments), têm apoiado governos por meio de capacidade técnica e diálogo político para traçar uma trajetória inclusiva pós-conflito e um plano de desenvolvimento para abordar os principais constrangimentos socioeconómicos. Esses mecanismos também se mostraram poderosos no alinhamento dos financiamentos nacionais e internacionais para um esforço de recuperação mais eficaz.
A maneira mais eficaz de evitar que as sociedades caiam no caos é fortalecer sua resiliência, investindo nas pessoas através da promoção de um modelo de desenvolvimento inclusivo e sustentável. Experiências em contextos tão variados como da Tunísia e Níger, Irlanda do Norte e Nepal demonstram que os esforços visando fortalecer e reformar instituições para promover uma maior inclusão são a chave para manter a paz e a estabilidade, apesar de serem de longo prazo e às vezes levando gerações.
Da mesma forma, abrir espaços para uma sociedade mais democrática onde a voz e a participação da sociedade civil é incentivada, não é fácil e nem desprovido de riscos, mas é fundamental para aumentar a representatividade e amenizar descontentamentos relacionados às perceções de exclusão, principalmente entre os jovens. Paralelamente, os esforços para lidar com as desigualdades e a exclusão, redistribuindo recursos, são importantes para preservar o tecido social, fortalecer a coesão social e aumentar as capacidades dos indivíduos, comunidades e da sociedade em geral para mitigar impactos de crises e choques.
O Banco Mundial compromete-se, na qualidade de parceiro e amigo de Moçambique, a acompanhar o Governo e o povo no caminho da construção de uma sociedade mais inclusiva, transparente e equitativa. Apoiaremos os esforços para a paz e estabilidade em Moçambique, alavancando experiências globais, usando diálogo político e parcerias, e através da aplicação da nossa capacidade técnica.
O Banco Mundial tem estado a
implementar e pretende aumentar as intervenções do Governo visando abordar as
causas da fragilidade, conflito e violência
Também estamos empenhados em atender às necessidades dos mais vulneráveis, especialmente aqueles afetados pelo COVID-19, expandindo a proteção social e as redes de segurança social, apoiando os esforços para aumentar o acesso à educação de qualidade e serviços de saúde e intensificando os esforços para abordar a fragilidade institucional e as lacunas em matérias de políticas públicas.
Acreditamos que temos a obrigação
de atuar como parte de um coletivo para fazer face aos desafios centrais que
estão por detrás da fragilidade
*Idah Z. Pswarayi-Riddihough é directora do Banco Mundial para Moçambique, Madagáscar, Maurícias, Seicheles e Comores
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