Agostinho Lopes [*]
De há uns tempos a esta parte
multiplicaram-se os comentários sobre a situação económica do país,
comparando-a com os países do Leste Europeu a partir do cotejo da evolução dos
respectivos rácios do PIB/capita. E as conclusões são sempre as mesmas: Portugal
ultrapassado até pela Roménia!
Os títulos são elucidativos: "Retrato de um país ameaçado pelo
marasmo"; "Assim não saímos do mesmo sítio"; "Causas da
nossa decadência". Para a SEDES, "é infelizmente necessário constatar
que, em termos de desenvolvimento económico e social, os últimos 22 anos se
saldaram por um rotundo fracasso".
A controvérsia não será certamente com as "conclusões" inscritas nos
títulos. Três breves anotações com o registo da superficialidade, mesmo o
simplismo, de algumas análises e surpreendentes "esquecimentos".
Aparentemente não passa pela cabeça dos analistas que no período de referência
utilizado, as duas primeiras décadas do século, a economia é definitiva e
estruturalmente marcada pela adesão ao euro e tudo o que a pertença à Zona Euro
arrastou, nomeadamente em termos de gestão orçamental.
A que se deve acrescentar as consequências da Estratégia de Lisboa (2000) e os
seus sucedâneos, com o carrossel das liberalizações e privatizações, uma
financeirização brutal, e consequências dramáticas nos sectores produtivos,
como foi a desindustrialização. Depois são análises que, metendo todos aqueles
países no mesmo saco, não conseguem ver que há dois grupos bem distintos.
Veremos no futuro o que vai acontecer, mas seria estranho que não se acrescentassem outros factores como os pontos de partida das suas estruturas produtivas, qualificação da mão-de-obra (uma "herança" do comunismo!), e até a sua maior proximidade geográfica à Alemanha e países do centro da Europa.
Depois, o "esquecimento" de que há mais de duas décadas todos estes analistas, e os jornais onde escrevem, e os partidos a que alguns pertencem, são os promotores, os ideólogos e estremes defensores das opções políticas estruturantes de sucessivos governos do PS (incluindo do actual), PSD e CDS, e de tudo quanto tem vindo da UE e sobretudo da Zona Euro. Exactamente as causas e as explicações para a situação de desastre económico e social em que o país se encontra e que povoa os títulos dos seus comentários.
Por fim, os reais objectivos daquelas análises.
Todos concentram as responsabilidades do ponto a que chegámos, não em mais de quatro décadas de políticas de direita do PS, PSD, CDS, particularmente as que geriram os 20 anos deste século, não na continuidade, no essencial, dessas mesmas políticas pelo actual Governo PS (caso da submissão à UE e ao euro), mas na paralisia do actual Governo PS peado no ímpeto reformista pelas "alianças" à esquerda, na concretização das velhas e conhecidas, e nunca assaz louvadas, "reformas estruturais".
Parecem "esquecer", também, que daqueles 20 anos a pontual e limitada interferência da esquerda se deu em cinco anos! Curiosamente, o único período em que crescemos acima da média da Zona Euro.
11/Junho/2021
[*] Dirigente
do PCP.
O original encontra-se em jornaleconomico.sapo.pt/noticias/fazer-o-mal-e-a-caramunha-749218
Este artigo encontra-se em https://resistir.info/
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