Artur Queiroz*, Luanda
As gravuras e pinturas rupestres de Tchitundo Hulo (Monte do Céu) estão inseridas numas das mais importantes estações arqueológicas do mundo. Em Angola é seguramente a mais estudada. Um dos estudiosos foi Carlos Ervedosa, um angolano prodigioso ao qual devemos a divulgação e promoção da Literatura Angolana, através dos cadernos da Casa dos Estudantes do Império. Nesta empreitada contou com a colaboração de Fernando Costa Andrade (Ndunduma) poeta, artista plástico e jornalista. Nos estudos arqueológicos fez equipa com o Professor Santos Júnior, um cientista de dimensão universal.
A estação arqueológica está “poisada” num morro de granito à vista do deserto. As comunidades da região chamam-lhe Tchitundo Hulo Mulume (Morro do Homem). Aqui existem pinturas e gravuras rupestres. A tinta da maior parte das pinturas foi obtida a partir de carvão e água. Também ostenta fundos de cabanas e vestígios de indústria lítica (produção de ferramentas em pedra).O que nos leva às nossas primeiras Mamãs e Papás. Milhões de anos. Mais três elevações secundárias completam a estação: O Tchitundo Hulo Mucai (Morro Mulher),só tem pinturas, a Pedra da Lagoa (só com gravuras) e a Pedra das Zebras, apenas gravuras insculpidas na superfície rochosa.
O primeiro estudioso desta preciosidade do fabuloso Mosaico Cultural Angolano foi um técnico superior do Serviço de Geologia e Minas, Camarate França. Corria o ano de 1952, há precisamente 70 anos. O geólogo encontrou mais de 100 gravuras e inúmeros artefactos de pedra, colhidos à superfície. Não foi necessário escavar. Ironia do destino. Ele só viu, recolheu e estudou as preciosidades da base do Tchitundo Hulo Mulume. As do alto do morro continuaram incógnitas. E apesar de estar mesmo ao lado da Pedra da Zebra (Buá Mamuxombo), Pedra da Lagoa (Buá Ioxirinde) e Tchitundo Hulo Mucai, não as viu. O seu estudo, AS GRAVURAS RUPESTRES DO TCHITUNDO-HULO (DESERTO DE MOÇÂMEDES), foi publicado em 1953 e revela pormenores importantíssimos.
O geólogo também conviveu com as pessoas. E narraram-lhe esta história sobre Tchitundo Hulo: Desde há muito, muito tempo, no tempo dos avós, dos avós, dos avós, dos avós (até ao infinito) uma leoa vai todos os anos ter as suas crias entre os pedregulhos no ponto mais alto do morro. Quem subir até lá cima, seja homem ou mulher, não pode nunca olhar para trás. Se o fizer, será perseguida ou perseguido até à morte pelas leoas e suas crias. Sobre os Cuvales (uma parte dos angolanos da região) leiam hoje mesmo a monumental obra do Padre Carlos Estermann, o estudioso do Sul e Sudoeste de Angola.
Em 1954, chamado pelo estudo de Camarate França, o etnólogo alemão Herman Baumann, acompanhado de um Mais-Velho Cuvale, anónimo até à eternidade, chegou ao morro Tchitundo Hulo Mucai. O mundo ficou a conhecer a casa de nossas Primeiras Mamãs e nossos primeiros Papás. Título da obra: VORLAUFIGER BERICHT UBER NEUE FELSBIDER-FUNDE IM SUD-ANGOLA (RELATÓRIO PROVISÓRIO SOBRE NOVOS ACHADOS DE PINTURAS RUPESTRES NO SUL DE ANGOLA). O cientista alemão descobriu gravuras com uma girafa e dois antílopes. Imaginem a antiguidade destas preciosidades. Ainda existiam girafas no deserto do Namibe!
No tecto do abrigo há pinturas fabulosas com símbolos solares, um jacaré, uma serpente e um peixe, uma tartaruga, uma ave. É isso mesmo, o que distingue o Homem dos outros animais é a Arte. O que faz de Angola um dos países mais importantes do mundo é o seu Mosaico Cultural ancorado em nove línguas nacionais e 11 regionais.
Em 1955, o Professor António de Almeida, chefe da Missão Antropológica de Angola foi em demanda da estação arqueológica, guiado pelos estudos de Camarate França e Herman Baumann. Levava uma companhia de peso, o cientista Abbé Breuil. Filmaram, fotografaram e tomaram notas sobre as preciosidades da estação arqueológica. Este material foi a estrela principal do primeiro Congresso Pan-africano de Pré-História e Estudo do Quaternário, que se realizou em Leopoldville (Kinshasa). A República do Congo nasceu em 30 de Junho de 1960. Portanto, decorreu nos últimos meses da presença belga no país. Título da obra apresentada ao congresso: SUR LES GRAVURES ET LES PEINTURES RUPESTRES DU DÉSERT DE MOZAMEDES.
As fotos publicadas na obra mostram pinturas com cor preta, branca, vermelha ou as três juntas. Abundantes figuras geométricas e figuras humanas correndo ou paradas. Muita harmonia na arte das nossas Primeiras Mamãs e primeiros Papás. A estação arqueológica Tchitundo Hulo é um dos nossos berços.
Por fim, chegou a vez do cientista angolano Carlos Ervedosa. Ele e o Professor Santos Júnior começaram a estudar profundamente a estação arqueológica em todas as suas vertentes, em Março de 1971. Regressaram em Fevereiro de 1972. Foram estes dois sábios que descobriram a Pedra da Zebra e a Pedra da Lagoa. E fizeram escavações.
Em 1974, Carlos Ervedosa publicou
a obra monumental ARQUEOLOGIA ANGOLANA da Edições 70, um marco indelével na
História da Cultura Angolana. O Professor Santos Júnior também publicou os seus
estudos com o título ARTE RUPESTRE EM ANGOLA, igualmente em
A estação arqueológica Tchitundo
Hulo (Monte do Céu) fica no município do Virei, a
As estações de arte rupestre são joias preciosas do Mosaico Cultural Angolano e ocupam lugar único no mundo. Uma escarpa sobre o rio Zaire, a Pedra do Feitiço, residência de Seembi, o deus do rio, foi a primeira identificada em Angola, no ano de 1816.O capitão inglês J. K. Tuckey é autor do estudo intitulado NARRATIVE OF AN EXPEDITION TO EXPLORE THE RIVER ZAIRE USUALLY CALLED THE CONGO IN SOUTH AFRICA. Este livro viveu no Museu de Angola até ao 25 de Abril de 1974. Hoje não sei. Na zona de Noqui também existe a Pedra do Raio (Taddi Enzazzi).
No Negage, temos as pinturas rupestres
da Cabala ou Quissádi. Entre Samba Caju e Camabatela, numa picada que servia a
fazenda Girão, a
As pinturas rupestres do Ebo foram localizadas em 1971, por um anónimo funcionário da administração. Habitantes da região levaram-no a um dos nossos preciosos berços. Mais tarde, Carlos Ervedosa e Santos Júnior localizaram e estudaram dezenas de pinturas e gravuras. Cuidado, o acesso é muito difícil.
Os berços da Kissanga e do Uaco
Cungo (Cela) têm acesso mais fácil. Na aldeia da Cumbira, a ocidente o Ebo,
existe uma fabulosa estação de arte rupestre na base do morro Colohumbi. São
dois blocos de granito acavalados. O Povo chama-lhe pindala dândi à botóto.
Cores das gravuras vermelho, branco e apenas três a negro. Quase todas figuras
humanas. A noroeste do Ebo existe a estação de pintura rupestre da aldeia
Delambira, num abrigo com uma boca de
Do Planalto Central ao Zambeze há milhares de estações arqueológicas. Importantes. Riquíssimas. O melhor do fabuloso Mosaico Cultural Angolano. Obrigado, Carlos Ervedosa, meu querido e saudoso amigo Carlitos, que morreste lá longe com saudades da tua Luanda. Mil vezes obrigado por tudo o que nos deste. E o suplemento literário do Província de Angola (Jornal de Angola) não foi o menos valioso. Ali divulgaste o melhor da Literatura Angolana.
Por falar em Jornal de Angola leiam agora uma notícia ali publicada há poucos dias, assinada por César Esteves. O poeta Malaquias, quando acabou de ler, exclamou: “Meu amor! Eu vi o nosso berço arder!”
Leiam porque vos incomodei até agora:
As pinturas rupestres de
Tchitundo-Hulo, localizadas no município de Virei,
As pinturas encontram-se numa
área descoberta, o que tem facilitado o seu desgaste. Aliado a isso, está o
facto de haver, no local, vários vestígios de remoção de partes das superfícies
rochosas contendo as pinturas feitas por aqueles povos, cuja
classificação étnica, até hoje, continua envolto em dúvidas, não obstante haver
correntes que dizem tratar-se dos Cuisses.
As remoções das camadas rochosas contendo as pinturas estão a acelerar o
processo de descaracterização das pinturas a um ritmo assustador. Acredita-se,
localmente, que as pinturas estejam a ser removidas por turistas estrangeiros
que se deslocam à zona sem passar pela administração municipal do Virei,
responsável pela guarnição da área.
Passando pela administração, o turista é levado ao local por um guia, que não
permite a danificação das pinturas. É por essa razão que eles evitam passar por
lá, contou uma fonte no local.
As pinturas estão, às centenas, espalhadas num morro granítico conhecido como
"Morro Sagrado dos Mucuísses”, que mede cerca de
A falta de uma fiscalização permanente tem permitido, também que a área seja
transformada numa zona de pasto do gado, que se alimenta da vegetação presente
nas rochas. Nos arredores da montanha há uma pequena comunidade que se
dedica à criação de gado.
As pinturas na gruta adjacente à montanha estão melhor conservadas,
provavelmente por não estarem muito expostas à radiação solar e porque, há bem
pouco tempo, estarem protegidas por uma grade, que impedia a entrada de
qualquer pessoa no seu interior.
Hoje, esta grade já não existe, o que tornou fácil o acesso à gruta.
A via de acesso para as pinturas de Tchitundo-Hulo é outro problema que se
coloca quando o assunto é chegar até àquelas pinturas milenares.
O primeiro desafio que se impõe é o troço Moçâmedes/Virei. É um martírio passar
por lá, devido aos inúmeros buracos na via. Consta que a mesma estava a ser
reparada mas devido à fraca qualidade das obras, teve de ser interrompida.
Até ao momento em que passamos por lá, não havia vestígio de retoma das obras
daquela via. Posto na Vila de Virei, começa outro desafio. Fazer os
Acredita-se ser este um dos factores que contribui para um reduzido
número de turistas na zona. De acordo com uma fonte da Administração Municipal
do Virei, as pinturas de Tchitundo-Hulo chegam a receber, anualmente, 50
visitantes, na sua maioria estrangeiros vindos da África do Sul e da
Namíbia. "Há uma presença bastante reduzida de nacionais. Os poucos que
visitam as pinturas são estudantes provenientes de Moçâmedes e da Huíla”,
frisou.
As pinturas rupestres de Tchitundo-Hulo são consideradas um dos tesouros
culturais mais valiosos da Pré-História, existente em Angola e o ponto de
partida das artes rupestres de África. Dados históricos dizem que elas têm uma
idade de cerca de quatro mil anos. As pinturas rupestres de Tchitundo-Hulo são
um conjunto de representações enigmáticas, muitas das quais com a forma de animais
e figuras circulares. Começaram a ser estudadas em 1952, pelo geólogo Camarate
França.
É desaconselhável visitar o local sem a presença de um guia turístico
disponibilizado pela Administração Municipal do Virei, por serem indivíduos que
conhecem, na palma das mãos, a geografia da área.
Plano de gestão do sítio
O especialista
No entender do académico, se for só pelas intempéries, as pinturas podem
permanecer aí por vários séculos. "Mas o maior perigo, neste momento, é o
próprio homem que por ignorância ou de forma intencional, está a desenvolver
acções que vão culminar com a degradação daquele bem”, alertou.
Benjamim Fernandes apelou às autoridades governamentais a tomar alguma medida
para evitar que as pinturas sejam danificadas no seu todo.
"Se não se fizer nada, de forma urgente, daqui a pouco podemos perder
aquele património que tem um valor inestimável, numa altura em que a comunidade
científica internacional, sobretudo aquela ligada à Arqueologia Rupestre, já
começa a mostrar um interesse muito grande em conhecer e estudar a arte
rupestre do Tchitundo-Hulo”, frisou o académico, para quem as pinturas
rupestres de Tchitundo-Hulo já ultrapassaram as nossas fronteiras há muitos anos.
"Daí o enorme interesse da comunidade científica internacional”.
O especialista disse que, não obstante as placas rochosas contendo as pinturas
já estarem fragilizadas, em consequência da exposição às intempéries, são as
acções humanas que estão a contribuir para a degradação acelerada das gravuras,
caminhando constantemente sobre elas.
Disse que a elaboração de um plano de gestão do sítio seria apenas um
paliativo, tendo, por isso, apontado, como medida para médio e longo
prazo, a inscrição das pinturas rupestres de Tchitundo-Hulo a elevação a
património mundial da humanidade. Benjamim Fernandes referiu que a Unesco
dispõe de recursos humanos especializados, técnicos e materiais que ajudariam a
uma melhor conservação e preservação do património. Estando inscrito como
Património Mundial da Humanidade, segundo o académico, o país sairá a ganhar do
ponto de vista económico. "Porque as Nações Unidas têm recursos humanos,
técnicos e materiais capazes de emitir uma opinião especializada sobre a
preservação daquele bem”, aclarou.
O especialista
Autores das pinturas
Benjamim Fernandes disse que a identificação dos autores daquelas pinturas de
Tchitundo-Hulo constitui, nos dias de hoje, um dos grandes desafios da arte
rupestre, tendo apontado como um dos grandes impasses o facto de a referida
arte não ser uma prática que se continua a assistir nos dias de hoje.
Com isso, disse, fica-se sem como chegar aos autores para, a partir deles,
compreender, até, a mensagem que partilham por via daquela arte. Entretanto, referiu
que a Ciência permite interpretar alguns sinais da arte rupestre, tendo, por
isso, afirmado que grande parte das pinturas rupestres de Tchitundo-Hulo estão
ligadas à actividade de povos de cultura caçador-recolector. O académico disse
que aquela região do Namibe é habitada por povos que fazem parte do chamado
Fundo Antigo de Povoamento Médio Africano, comummente e de forma errada
chamados de Cuísses. "Esse termo Cuísse generalizou-se, mas, na verdade, é
uma expressão com conotação depreciativa, mas, infelizmente, é o nome que se
generalizou para chamar os povos detentores de cultura caçador e recolector”,
esclareceu.
Alterações impedem elevação a
património da humanidade
O director do Gabinete Provincial da Cultura, Turismo e Ambiente do Namibe,
Pedro Hangula, revelou que as alterações levadas a cabo pela acção humana,
sobre as pinturas rupestres de Tchitundo-Hulo, "engasgou” o processo de
inscrição delas a património histórico da humanidade junto da UNESCO. "De
acordo com um dos principais regulamentos da UNESCO, não é permitido, pois ela
exige que o seu espectro arquitectónico seja preservado”, frisou.
O responsável disse que a ideia de inscrever as pinturas de Tchitundo-Hulo a
Património Mundial da Humanidade passa por se conseguir alguma verba que
permita a sua preservação e sustentabilidade. "Infelizmente não há
recursos, por isso é que se luta para que seja elevado a património
histórico da humanidade”, salientou.
Pedro Hangula disse estar em curso, a nível da província do Namibe, a elaboração
de um Plano de Educação e Cultura, que visa o envolvimento dos turistas e
das comunidades indígenas, para um melhor tratamento das pinturas rupestres de
Tchitundo-Hulo. "Acreditamos que, num futuro muito próximo, poderemos
reverter esta situação”, garantiu.
As pinturas e gravuras do Tchitundu-Hulu perto de Virei, na província de
Namibe, no Sudoeste de Angola, são uma das melhores colecções de obras de arte
pré-históricas do mundo, retratando animais, reais e míticos, plantas e
círculos concêntricos pensados para representar o sol e as estrelas. As imagens
das pessoas não são figuras alongadas como outras na África, mas seres sólidos
de ombros largos com cabeças redondas. Situadas nas duas cavernas da grande
Colina Sagrada de Mucuísses, as pinturas e gravuras de Tchitundo-Hulo ou A
Colina da Alma foram datadas de 2600 anos até à Idade da Pedra e são
consideradas obra das comunidades de caçadores-colectores ovatwa que habitavam
esta região até depois da década de 1960, expressando os elementos essenciais
do seu sistema de pensamento e crença.
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