sexta-feira, 10 de junho de 2022

Angola | Assassinos Perdoam e Desculpam as suas Vítimas -- Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

O chefe da UNITA, em 1992, durante a campanha eleitoral, perdeu toda a credibilidade quando mentiu aos jornalistas descaradamente. E convocou-nos para uma conferências de imprensa que só ele sabia da sua existência. Apareceram os representantes dos Media nacionais e internacionais. O director do Gabinete de Imprensa do Galo Negro, Norberto de Castro, mais tarde, pediu desculpas e disse que o jovem Adalberto era um mentiroso compulsivo e gostava de se fazer passar por dirigente do partido.

Os Media portugueses entrevistaram agira o chefe da UNITA e ele disse que “os observadores internacionais às eleições de 24 de Agosto não podem ser apenas os amigos do MPLA”. Que horror! Aqueles que destruíram o império colonial português e ajudaram a derrubar o fascismo, só querem amigos a fiscalizar o acto eleitoral, para fazerem fraude! O colégio de comissários da Comissão Nacional Eleitoral (CNE) deliberou que cada partido político e coligações de partidos concorrentes às eleições podem convidar até 18 observadores, para fiscalização do processo eleitoral. 

A Assembleia Nacional, onde a UNITA está representada, pode convidar, por sugestão dos partidos com assentos no parlamento, 50 observadores. O Tribunal Constitucional, pode convidar 24. A CNE decidiu que as organizações não-governamentais e outras instituições da sociedade civil podem convidar até três observadores por província. Cada igreja devidamente legalizada pode convidar até dez observadores por província. Quanto às missões diplomáticas (embaixadas) podem convidar observadores mas têm de obedecer aos princípios estabelecidos na Convenção de Viena

O que são os observadores internacionais? A Comissão Nacional Eleitoral esclarece. São considerados observadores internacionais, os cidadãos indicados por organizações regionais e internacionais, os observadores de organizações não-estatais, os observadores de governos estrangeiros, os observadores de organizações não-governamentais de direito estrangeiro reconhecidas em Angola e os observadores individuais.

Tomem nota, por favor. Adalberto da Costa Júnior e um aldrabão de trazer por casa. Um mentiroso compulsivo. Quando disse aos Media portugueses que a UNITA não podia aceitar que os observadores internacionais das eleições de 24 de Agosto, fossem apenas os amigos do MPLA, já sabia das decisões tomadas pelo colégio de comissários onde o Galo Negro está representado.

Marcolino Moco, Francisco Viana e outros trânsfugas do MPLA estão enganados. Os angolanos não vão escolher um vigarista vulgar para dirigir os destinos de Angola. Nem um milagre vai salvar o Galo Negro de uma derrota eleitoral estrondosa e, espero, definitiva.

Ao longo dos anos tenho recolhido informação sobre o golpe militar de 27 de Maio de 1977. Até escrevi um livro sobre o tema. Mas ainda tenho muito que contar. O Bureau Político do MPLA deu-me informações que nem constavam dos seus comunicados. No Jorna Página Um, na época um diário português de grande tiragem, publiquei dezenas de notícias e reportagens sobre o golpe e os golpistas. O material foi-me fornecido pela direcção do MPLA e outras fontes daminha inteira confiança.  Além do Página Um também escrevi sobre o 27 de Maio no Diário Popular, no Expresso e no semanário O Jornal. Este foi o único órgão de informação português que tinha um jornalista em Luanda, naquele dia, Manuel Beça Múrias, meu companheiro no Diário de Notícias e um grande amigo. 

O semanário O Jornal publicou material informativo recolhido pelo seu repórter em Luanda. Ele viu os tanques de guerra dos golpistas. Ele viu os postos de controlo dos golpistas desde o Kinaxixi à Mutamba. Ele viu um golpe militar, ao vivo! E contou o que viu. Curiosamente, todas e todos que escrevem sobre o 27 de Maio de 1977 ignoram o meu trabalho no Página Um e as reportagens de Manuel Beça Múrias, directamente de Luanda. Em cima do acontecimento.

Na sequência do texto que escrevi no dia 27 de Maio passado, recebi uma mensagem de um camarada do MPLA e companheiro de armas, que me contou o seguinte: “Quando percebi que se passava algo de anómalo, saí de casa às quatro da madrugada e como me competia fui para o Comando da IX Brigada, então instalado no antigo quartel da Engenharia do Exército Português, contíguo ao quartel dos Dragões, que albergava a Companhia de Reconhecimento da Brigada. 

Às seis da manhã os golpistas tentaram apanhar-me, porém, consegui escapar e fui para o Bairro do Saneamento, onde encontrei Mr. Katondo, vizinho do comandante Ndozi. Sem demoras pedi-lhe que informasse imediatamente o comandante Xyetu sobre a situação anómala que se desenrolava naquele momento, com algumas subunidades da IX Brigada. 

Posteriormente tentei voltar ao quartel, mas já não foi possível. Então, resolvi ir pra minha casa, pôr a salvo a minha família. Foi quando vi um turismo Ford, vermelho, com o Pitoco ao volante, estacionado à porta da minha casa. Como não tinha relações de amizade com ele, imaginei que o Pitoco era um fraccionista e imediatamente afastei-me da rua da minha casa. Mais tarde, pelo Pitoco, soube que o comandante N’Zaji estava dentro do carro. 

Mais pormenores sobre esse triste dia, posso relatar-te quando estivermos juntos. Ainda guardo na minha memória muitos episódios onde eu fui um dos participantes. Modéstia à parte, tive uma participação transparente e muito activa durante o período do fraccionismo e também no rechaço e neutralização do golpe de estado no dia 27/05/77, comandado pelo Nito Alves e o Zé Van-Dúnem”.

Não identifico o autor deste curto depoimento porque ele corre sérios riscos de perder as estrelas de general, conquistadas no terreno da luta, desde o maquis até à Frente Sul, quando os Heróis das FAPLA arrasaram os racistas de Pretória. Podem prendê-lo perpetuamente. Ou expulsá-lo do MPLA. Aquela declaração sobre o meu papel na divulgação dos pormenores do golpe de estado pode levar-me à comissão dos assassinos do 27 de Maio e arrisco uma condenação à morte. Mas aprendi que para a frente é o caminho e não há recuos na minha vida. Nunca. Um familiar do assassino Nito Alves garantiu hoje naTPA que os assassinados e seus camaradas estão desculpados e perdoados. Finalmente, os golpistas triunfaram. 

*Jornalista

Sem comentários:

Mais lidas da semana