Angola vai a votos a 24 de agosto. Mais de 14 milhões de eleitores são chamados a escolher o próximo Presidente da República e os deputados da Assembleia Nacional. Resumimos o que precisa de saber sobre o processo.
Está oficialmente lançada a corrida para a Presidência da República de Angola. São as quartas eleições gerais realizadas no período pós-guerra e o quinto processo eleitoral desde 1992.
Os partidos MPLA, UNITA, CASA-CE, PRS, FNLA, APN, P-NJANGO e Partido Humanista de Angola concorrem à Presidência. Buscam também o maior número de votos que lhes garanta mais assentos na Assembleia da República numa tentativa de equilibrar, pela primeira vez, a balança do poder no Parlamento angolano, dominado há décadas pelo MPLA.
1. Quem vota nestas eleições
Do ficheiro definitivo disponibilizado pelo Ministério da Administração do Território constam cerca de 14.399.391 cidadãos habilitados para exercer o seu direito de voto, incluindo os residentes na diáspora. É a primeira vez que angolanos residentes no estrangeiro poderão votar.
A votação será acompanhada por centenas de observadores. De acordo com a Comissão Nacional Eleitoral, foi estabelecido o limite de dois mil observadores nacionais e internacionais.
O mesmo órgão refere que foram endereçados convites para observar as eleições de 24 de agosto a um total de nove organizações internacionais: União Europeia, União Africana, Comunidade dos Países de Língua Oficial Portuguesa (CPLP), Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), Centro Carter dos EUA, Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), Conferência Internacional para a Região dos Grandes Lagos (CIRGL), Fórum das Comissões Eleitorais dos Países da SADC e Conferência das Jurisdições Africanas.
2. Os deputados no Parlamento
A Assembleia Nacional angolana é constituída por 220 deputados. 130 representantes são eleitos a partir das listas nacionais dos partidos, de acordo com o número de votos obtidos por cada formação política nas eleições. Os restantes 90 parlamentares são eleitos com base nas listas provinciais - cada província elege cinco deputados.
Atualmente, o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) tem uma maioria absoluta, ocupando 150 lugares na Assembleia, seguida da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), com 51 deputados, e da Convergência Ampla de Salvação de Angola - Coligação Eleitoral (CASA-CE), com 16.
O Partido de Renovação Social (PRS) conta apenas com dois deputados e a Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA) com um.
Esta configuração do Parlamento angolano "não favorece uma discussão democrática ou uma intervenção da oposição, podendo não constituir um desafio para quem detém o maior número de assentos", explica a jurista e professora universitária Margareth Nanga em entrevista à DW África.
3. Histórico dos processos eleitorais
A UNITA, o maior partido da oposição em Angola, arrebatou, em 1992, 34% dos votos, o que lhe conferiu um total de 70 deputados contra os 129 deputados do MPLA. Nesse ano, o partido contestou os resultados e o país mergulhou novamente na guerra.
Depois da paz, em 2002, como resultado das eleições gerais de 2008, o partido contabilizou pouco mais de 10% dos votos, traduzindo-se em 16 deputados contra os 191 deputados do partido no poder.
Já nas eleições de 2012, o maior partido da oposição em Angola obteve 18%, tendo duplicado o número de deputados.
Em 2017, o MPLA ganhou mais uma vez as eleições gerais - no entanto, com o menor número de assentos de sempre, 150 deputados, contra os 51 obtidos pela UNITA. Estas foram também as eleições em que a CASA-CE (que concorreu pela primeira vez em 2012) conseguiu o seu maior número de deputados na história das eleições em Angola: Elegeu 16 parlamentares.
Ao analisar estas estatísticas, a jurista Margareth Nanga acredita que o ideal é que, no Parlamento, nenhum dos partidos políticos consiga uma maioria folgada, que lhe permita sem esforço quase nenhum fazer passar os assuntos do seu interesse, uma vez que é "fundamental" haver equilíbrio na balança de poderes entre os órgãos de soberania.
4. Presidencialismo
A Constituição define o sistema político angolano como presidencialista.
O Presidente da República chefia o Governo, é o comandante-em-chefe das Forças Armadas Angolanas, "promove e garante o regular funcionamento dos órgãos do Estado, nomeia juízes, procuradores, ministros e embaixadores, e "representa a Nação no plano interno e internacional".
Segundo a jurista Margareth Nanga, o presidencialismo angolano é peculiar, "não consagra aqueles aspetos tradicionais fundamentais do funcionamento do sistema presidencialista tradicional".
Nanga esclarece que a responsabilidade política do Presidente, ao ser julgada e apreciada pelo Parlamento com a possibilidade de impeachment ao seu mandato, "é uma nota fundamental possível nos sistemas presidencialistas tradicionais". Em Angola, não há essa possibilidade.
Questionada sobre o facto da configuração do sistema político angolano não consagrar aspetos tradicionais de um sistema presidencialista devido a uma "eventual imaturidade política", Nanga descarta esta possibilidade. Segundo a jurista, a maturidade política "não se ganha apenas com o tempo de maturação de um sistema de governo, mas também com a vontade dos titulares das instituições".
5. Fiscalização
Em entrevista à DW África, a jurista Elizabeth Nanga salienta que, ao contrário da Constituição portuguesa, a angolana não tem nenhuma norma que permita aos deputados fiscalizar os atos do Governo e da administração pública - uma norma que permitira aos deputados questionarem os ministros ou mesmo o chefe do Executivo sobre a sua ação política e governativa.
Neste capítulo, a Constituição angolana prevê apenas que os deputados devem analisar a Conta Geral do Estado e de outras instituições públicas "que a lei obrigar". Compete-lhes também analisar a declaração do estado de guerra, de emergência ou de sítio, além de "decretos legislativos presidenciais aprovados no exercício de competência legislativa autorizada".
A professora universitária Elizabeth Nanga refere que a introdução de mais competências de fiscalização permitiria à oposição fazer uma crítica melhor elaborada, tendo desde logo o direito de obter informação para depois manifestar a sua posição.
Neusa e Silva | Deutsche Welle
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