segunda-feira, 7 de novembro de 2022

PALOP querem clima reconhecido como Património Mundial da Humanidade

Os países africanos de língua portuguesa querem que o clima seja reconhecido como património comum da humanidade e vão, para isso, mobilizar o apoio de toda a sociedade civil. Ideia será apresentada na COP27, no Egito.

Os movimentos ambientalistas lusófonos, encabeçados por Portugal, pretendem lançar o tema do reconhecimento do clima como Património Mundial da Humanidade na conferência das Nações Unidas sobre as alterações climáticas (COP27), que começou este domingo (06.11) e que termina a 18 deste mês, no Egito.

Cabo Verde, país extremamente vulnerável às alterações climáticas, apoia a proposta. "Claro que ainda estamos a entender bem o que é isso implica. Porque isso vai mudar todo o paradigma e toda a forma como nós lidamos com as políticas na área do ambiente", diz à DW África Dirce Varela, diretora executiva da Plataforma das Organizações Não Governamentais (ONG).

A ativista cabo-verdiana precisa que não há qualquer tipo de divergência em relação à proposta de ONG portuguesas apresentada numa conferência, em Lisboa, nos dias 28 e 29 de outubro, com o objetivo de repensar e restaurar o clima como património comum. 

"Cabo Verde tem as suas especificidades como país altamente vulnerável; o que nós temos é aquilo que foi discutido aqui: rever as políticas nacionais de cada Estado e adaptá-las aos recursos e também a cultura de cada país [e ver] como é que nós podemos realmente fazer a diferença", acrescenta.

Dirce Varela reforça que "é preciso repensar a governança do clima". Por outro lado, espera que da cimeira sobre as alterações climáticas no Egito saia como resultado o reforço do comprometimento do que deve ser feito para salvar o ambiente e o planeta terra. 

Uma questão fundamental

O reconhecimento do clima como património comum "é uma questão fundamental e pertinente", segundo Miguel de Barros, diretor executivo da ONG guineense Tiniguena. Uma proposta que, na sua opinião, deve ser partilhada a nível nacional e regional, e sobretudo ao nível das estruturas supra estatais, repensando as vantagens para as comunidades, em particular, devido às assimetrias entre os países lusófonos.

"Quer em relação ao acesso à tecnologia, quer em relação ao acesso aos benefícios de exploração de matérias-primas, particularmente na questão, por exemplo, das energias fósseis", indica.

"Temos países que são grandes produtores de energias fósseis, os casos do Brasil, Angola, Guiné Equatorial e de Moçambique, e que têm ainda dificuldades de distribuição equitativa das vantagens dessa exploração", exemplifica.

"Então, quando se fala sobre estas questões, é necessário consensualizar todos os trâmites para essa transição, permitindo que os erros cometidos nos outros contextos não sejam repetidos", acrescenta o ativista guineense.

A justiça ambiental no plano financeiro é outra preocupação abordada por Miguel de Barros. "Justiça ambiental para que aqueles que poluem menos e estão expostos às vulnerabilidades climáticas possam beneficiar de um quadro de compensação pelo esforço de conservação e ao mesmo tempo pela situação de apoio económico que impacta nos modos de produção da economia e que gera empregos limpos, sustentáveis, e também condições de vida mais favoráveis", sublinha.

Dirce Varela e Miguel de Barros são dois dos ativistas dos países africanos que se fizeram representar na conferência em Lisboa para expressar o seu contributo à iniciativa portuguesa, discutida na véspera da Cimeira do Clima (COP27), no Egito.

Obstáculos

A discussão do estatuto jurídico do clima agora lançada em Lisboa visa inscrever a proposta na 28ª conferência das Nações sobre as Alterações Climáticas (COP28), a ter lugar em 2023, nos Emirados Árabes Unidos, como conta Paulo Magalhães, da Casa Comum da Humanidade e fundador do Grupo de Missão para o Reconhecimento do Clima como Património Comum. 

"É lógico que há obstáculos. Portanto, esta é uma ideia de reconhecer um bem que existe dentro e fora de todas as fronteiras numa escala global, só que acontece que este bem é intangível, não é um bem territorial", admite.

Na perspetiva do académico português, os Estados precisam de um clima estável para poder exercer a sua soberania sobre o território e isso só se consegue gerindo o bem comum. "A preocupação da humanidade são as alterações climáticas. Não é o clima, que é o património. Isso faz toda a diferença. A primeira regra para gerir um bem comum é haver congruência entre a provisão do bem e a apropriação do bem. E isso não está no Acordo de Paris", critica.

"Mudar isto é uma mudança de paradigma económico", refere Paulo Magalhães, considerando que é benéfico ter ecossistemas que representem criação de riqueza.

João Carlos (Lisboa) | Deutsche Welle

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