CAPTURAS E CAPTURADOS -- Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

Os chefes de posto quando precisavam de pessoal para trabalhar nas granjas ou reparar as picadas esventradas pela chuva torrencial de Março, mandavam os sipaios e “aspirantes” às sanzalas capturar homens, mulheres e crianças “com corpo para trabalhar”. Eram mandatos de captura à moda do colonial-fascismo. Hoje o mundo está sob a meaça do nazismo, desde Helsínquia até Washington, de Nova Iorque a Bruxelas. Quem se opõe à nazificação da Humanidade leva logo com um mandado de captura. Os manifestantes das ruas de Paris vão parar ao Tribunal Pena Internacional!

”O jornal sul-africano “The Southern Times” escreveu, há mais de dez anos,  sobre o Tribunal Penal Internacional:  “Há muitos líderes de nações em desenvolvimento acusados perante o TPI mas nenhum líder de um país ocidental foi processado até hoje por crimes contra a Humanidade no Iraque, Afeganistão, Costa do Marfim, Líbia e Prisão de Guantánamo. Qualquer um pode observar como o TPI foi rápido em atacar Charles Taylor e Muammar Kadaffi mas mantem as mãos nos bolsos, quando se trata de George W. Bush e Tony Blair”. Hoje está tudo na mesma.

Pelo caminho a Procuradora do Tribunal Penal Internacional, Fatou Bensouda, africana da Gâmbia, indiciou a Presidência Estados Unidos da América, Forças Armadas e a CIA por crimes de guerra no Afeganistão. Até dois generais foram acusados de crimes contra a Humanidade. Karim Khan, britânico, o actual procurador-geral do Tribunal Penal Internacional, arquivou o processo. 

A Procuradora Fatou Bensouda não brincou em serviço. Acusou os EUA de  violações de leis da guerra. Mas foi mais longe nas investigações e incluiu crimes cometidos pelas Forças Armadas, Guarda Nacional, forças de segurança e serviços de inteligência “contra a sua própria população  ou  contra cidadãos de países signatários das Convenções de Haia, 1899 e 1907, bem como violações análogas à definição de crime de guerra acordada durante as Convenções de Genebra”.

 A Procuradora elencou os crimes de guerra cometidos pelos EUA: “Genocídio, execuções sumárias de combatentes inimigos capturados, maus-tratos de prisioneiros durante interrogatórios, tortura e uso indiscriminado de violência contras populações civis e não combatentes”.

Os crimes de guerra de responsabilidade dos Estados Unidos da América começaram após a Independência, em 1776. Ao longo do século XIX, vários crimes foram cometidos pelas autoridades norte-americanas contra combatentes, civis e os índios, donos da terra, na Guerra da Secessão, Marcha para o Oeste e Doutrina do Destino Manifesto.

A partir do século XX, com a política intervencionista, o belicismo e o desenvolvimento do complexo industrial militar, os Estados Unidos da América protagonizaram conflitos internacionais marcados por atrocidades e violações das leis da guerra. Geografia dos crimes de guerra: Genocídio Filipino, Bombardeamentos de Hiroxima e Nagasaki com bombas atómicas, tortura e massacres de civis por intermédio dos ditadores às suas ordens na América Latina, massacres de civis nas Guerras da Coreia, Vietname, Médio Oriente, Iraque, Afeganistão e Síria.

Em Março de 2020, há apenas três anos, o Tribunal Penal Internacional autorizou a Procuradora Fatou Bensouda a abrir uma investigação sobre os crimes de guerra e de crimes contra a Humanidade cometidos por tropas norte-americanas na Guerra do Afeganistão.   O presidente Donald Trump decretou a aplicação de sanções económicas e restrições de viagens aos membros do Tribunal.

O Procurador Karim Khan, indicado para o cargo pelo rato de sacristia António Guterres, mal tomou posse resolveu o problema e já não existe processo. Ficou muito claro que os EUA rejeitam o Tribunal Penal Internacional mas ao mesmo tempo usam-no a seu favor. São públicas e notórias as pressões de Washington sobre o TPI para acusar inimigos como foi o caso do mandato de captura contra o Presidente Putin. Ao mesmo tempo dão ordens a Guterres e a Karim Khan para bloquearem processos contra os seus aliados do ocidente alargado. 

Angola está fora do Tribunal Penal Internacional que fez da Justiça um instrumento de agressão ao serviço do estado terrorista mais perigoso do mundo. Uma mancha na honra da Humanidade. O seu nascimento foi uma esperança para os oprimidos e injustiçados de todo o mundo. Mas rapidamente se percebeu que é uma extensão da CIA, do Pentágono e do Departamento de Estado. Neste episódio que envolve o Presidente Putin, apenas se salvou a declaração de Dmitri A Medvedev: “O mandado de captura nem para papel higiénico serve!”

Irene Neto deu uma entrevista ao Novo Jornal. Não vou comentar. Quando está em causa a Liberdade e a Justiça, os seus defensores não podem ajudar os violadores, chafurdando na lama. Mas por obrigação profissional sou forçado a divulgar estes factos:

O empresário angolano Carlos São Vicente está em prisão preventiva ilegalmente. Devia ter sido libertado há vários meses. A sentença em primeira instância foi rápida. O acórdão da Relação de Lisboa foi rapidíssimo. O acórdão do Tribunal Supremo, mais rápido ainda. O recurso para o Tribunal Constitucional está parado há meses! A Justiça tem o seu tempo. Aguardemos. Mas quem ama Liberdade e as Justiça não percebe demoras quando um ser humano está preso e reclama inocência.

O prisioneiro (em excesso de prisão preventiva) teve hemorragias internas e foi transferido da prisão para uma unidade hospitalar. Irene Neto diz na entrevista que a sua situação equivale a uma pena de morte. E mais não digo. O Estado Democrático e de Direito, pelos vistos, também foi condenado à morte. Como cantava Jim Morrison, daqui ninguém sai vivo!

*Jornalista