Tiago Matos Gomes* | Diário de Notícias | opinião
Olhar para os nomes e símbolos dos principais partidos portugueses é, por um lado, uma viagem no tempo e, por outro, verificar como são desadequados às suas políticas e ao seu eleitorado. Mas que em parte a sua manutenção serve a narrativa de alguns dos seus adversários.
Começando pelo partido do governo. Alguém intelectualmente honesto pode considerar o Partido Socialista como sendo socialista? O símbolo (também ele ultrapassado - e do qual nem Mário Soares gostava, como revelou décadas mais tarde após a fundação do PS) bem pode ter um punho fechado, mas as lutas dos "socialistas" sempre foram bem moderadas e muito alinhadas com toda a ideologia e prática dos partidos sociais-democratas europeus. Nunca o PS, nem mesmo nos anos seguintes à sua fundação, pós-1973, foi um verdadeiro partido socialista. Nem os seus dirigentes alguma vez foram socialistas, nem as bases do partido alguma vez foram socialistas, nem o seu eleitorado alguma vez foi maioritariamente socialista, ainda que o PS capte voto útil à esquerda mais radical.
É verdade que a partir de certa altura os dirigentes do PS começaram a dizer que eram socialistas democráticos, para distinguir o PS do PCP, esse sim pertencente ao socialismo real, uma espécie de sinónimo de comunismo. O problema é que "socialismo democrático" é uma contradição de termos. Se é socialista não é democrático, se é democrático não pode ser socialista. O PS é um partido social democrata, moderado, de centro-esquerda, que defende uma democracia liberal e que convive bem com o capitalismo, desde que muito regulamentado.
É por isso que se torna inverosímil a narrativa da Iniciativa Liberal, fazendo uma divisão entre socialistas e liberais, como se PCP, BE, PAN e PS (às vezes incluindo o PSD) fossem todos socialistas. E afirmando que vivemos num país socialista, o que está muito longe de ser verdade. Países socialistas são Cuba e Venezuela, para lembrar os mais óbvios. Portugal, retirando o curto período do PREC, nunca teve nada parecido com um regime socialista.
Mas o PSD também não é nem nunca foi social-democrata. Aliás, nasceu com o nome e siglas que deveria ter mantido sem ter acrescentado "PSD". Partido Popular Democrático, PPD, é a verdadeira essência daquele que se autodenomina como o mais português dos partidos em Portugal, embora este atributo seja bastante discutível. O PPD/PSD nasceu da ala liberal da ditadura do Estado Novo. É um partido que surge à direita do espectro político português. Nunca foi um partido de centro-esquerda, como são todos os verdadeiros partidos sociais-democratas europeus, partidos irmãos do PS.
E desde o início que o PPD/PSD captou a maioria do eleitorado do centro-direita e direita no pós-25 de Abril. Os pequenos e grandes empresários, os descontentes com a revolução, os saudosistas do Estado Novo, os descontentes com a descolonização em África... todos se colocaram dentro ou junto do PPD/PSD. E, claro, parte destes, em muito menor número, para dentro ou junto do CDS (outro partido que nunca foi centrista, apesar de ter "centro" no nome).
É certo que todas estas designações profundamente erradas para os partidos em questão têm uma explicação histórica. Saindo de um regime ditatorial de extrema-direita e fascista é natural que os partidos nascidos na nova democracia de 1974 não quisessem qualquer tipo de associação à direita, mesmo que democrática. E assim escolheram nomes bem mais à esquerda do que era a sua matriz. Tanto que o partido mais à direita, com um eleitorado bastante conservador, se chamou, e ainda chama, Centro Democrático Social.
Talvez fosse tempo de os partidos mais antigos começarem a actualizar os seus nomes, símbolos e estética. Já passou quase meio século da revolução e a política do país, da Europa e do mundo mudou muito.
* Presidente do movimento Partido Democrata Europeu
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia
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