Joana Amaral Dias* | Diário de
Notícias | opinião
A adjunta da actual ministra do
Trabalho propôs uma autêntica acção revolucionária: ocupação da Ponte 25 de
abril. A razão? Protesto pelo direito à habitação. Portanto, pertence ao
governo mas não encontra melhor alternativa do que insurgir-se contra o
governo, contra si própria. Que visionária! Eis uma vanguardista! Agora, só
falta António Costa organizar uma manifestação contra o primeiro-ministro de
Portugal.
"Não sei quantos quilómetros
tem a ponte, mas devem ser bués!", declarou na TV Inês Franco Alexandre,
que também propôs um patrocinador das tendas para montar e abancar no tabuleiro
que une as duas margens do Tejo. Por isso mesmo se auto-proclama empreendedora
- com as barraquinhas solucionava a escassez de casas e ainda os
engafarramentos. Uma breve consulta às suas redes sociais confirma a craveira.
Dá, por exemplo, webinares sobre "a importância de gerir relações de forma
estratégica".
Enfim, em plena crise de
habitação, a respectiva política deste governo é mesmo fazer de uma casa para
um jovem ou para um trabalhador uma quimera e um escárnio. Talvez por isso
tenha escolhido para titular da pasta alguém que nunca fez nada da vida além de
assessoria parlamentar. Na área da educação.
Vejamos: os preços da habitação
estão proibitivos. Para quem consegue, a aquisição de casa na capital
representa um esforço de dois terços dos rendimentos. Noutros pontos do país o
cenário não é muito diferente.
Em 2022, esses valores aumentaram
ao maior ritmo destas três últimas décadas e só vão piorar com a crescente
procura internacional - de particulares, de fundos imobiliários e de turismo.
Esta demanda já duplicou e também vai continuar a subir. Lisboa já é uma cidade
europeia recordista em AL por 100 mil habitantes. Agora, o peso da procura
estrangeira chega a 12% a nível nacional, mas duplica em Lisboa e no Porto.
Portanto, há escassez porque quase dois milhões estão em Alojamento Local,
segunda habitação ou, simplesmente, desabitadas.
Impressionante. O mercado já
estava desregrado mas o Estado só contribuiu para a especulação, concedendo
benesses tributárias aos fundos de investimento imobiliário, a residentes não
habituais e nómadas digitais com rendimentos elevados, que também inflacionam
os valores das casas. Portanto, se forem vistos gold ou reformados estrangeiros
endinheirados carregadinhos de borlas fiscais, há casas. Se forem professores,
enfermeiros, funcionários, estudantes portugueses, chupam no dedo e Costa
promove a facilitação dos despejos e da cessação de contratos de arrendamento.
Já para não falar dos escravos amontoados nos quartos sobrelotados das camas
quentes. Como é que isto será possível compatibilizar com a oferta de serviços
essenciais?!
Urge responder a esta perigosa
injustiça.
Dar incentivos a mais construção
não chega, porque os não privados apostarão em fogos acessíveis e o
desenvolvimento do prime/luxo só agudizará o problema. Importa travar a
especulação imobiliária, recuperar devolutos, reforçar a oferta pública de
habitação (em Portugal representa apenas 2% ) e até considerar o controlo do
preço máximo das rendas, que já existe em cerca de metade dos 27 países da UE.
Já um acampamento precário
suspenso a mil metros de altitude com quase 3 km de comprimento talvez
seja um pouco megalómano, não acha Sr.ª Adjunta?
*Psicóloga clínica.
Escreve de acordo com a antiga ortografia.