Artur Queiroz*, Luanda
O professor perguntou ao aluno: Menino, quem escreveu o livro Sagrada Esperança? E o rapaz, pensando que estava à pega por ter aprontado mais uma, responde sonso: Eu cá não fui senhor professor. Todos sabemos que não foste tu. Mas quero que me digas quem foi. E o miúdo insistiu uma, duas, dez vezes: Eu cá não fui. O mestre foi beber uma cuca no fim das aulas e, por acaso, encontrou-se com o chefe Miala. Vejo que está zangado, senhor professor! Pois estou, chefe. O filho do Adalberto da Costa Velho fez-me perder a cabeça. Perguntei-lhe quem escreveu Sagrada Esperança e ele respondeu sempre que não foi ele. É igual ao pai.
O chefe Miala desviou a conversa. Falaram da vitória dos Palancas Negras contra a Namíbia. Da demissão de Ângelo Veiga Tavares. Do patrocínio da Primeira-Dama aos aos prémios Sirius, esbanjados pela Deloitte, uma empresa privada altamente lucrativa. Até falaram do dinheiro fácil que faz correr o Grupo Carrinho. Depois cada um foi à sua vida.
No dia seguinte, o chefe Miala procurou o senhor professor: Tenho uma novidade para si, mestre. O miúdo tem razão, não foi ele que escreveu o Livro Sagrada Esperança. Foi o pai! Levei-o para o meu cárcere privado mais à mão e dei-lhe tanta porrada que confessou o crime. Foi ele! O pai é um criminoso.
Um dia estava na azáfama do Jornal das 13 horas na Emissora Oficial (RNA) e aquilo não corria nada bem. Ainda ninguém falava no “pré gravado em directo” e nós já usávamos esse artifício nos nossos noticiários. Para os ouvintes pensarem que as notícias iam em directo para o ar às 13 horas, uma hora antes começávamos a gravar a primeira metade. A dupla de locutores tinha de cometer erros muito leves, que não abalavam o edifício sonoro nem perturbavam a atenção gerada pela expectativa, pelo contrário, davam-lhe mais força. O Chico Simons era imbatível nessa técnica. Tinha a noção exacta que a Rádio é o espectáculo dos sons e tem como artista principal a voz humana.
Estava este vosso criado nesse negócio altamente lucrativo quando me apareceu José Mena Abrantes. Ele, sempre sereno, sempre muito confiante, muito calmo, naquele momento extravasava alguma inquietação. Pensei que tinha desabado o mundo. Ou os sicários da UNITA tinham tomado a Rádio de assalto. Ele trazia uns papéis na mão. Pensei que era a ordem para nos rendermos. Li à pressa e aquilo não tinha importância nenhuma. Os papéis eram listas dos esquadrões da morte onde estavam incluídos os nomes de pessoas a abater onde quer que se encontrassem.
O Zé Mena Abrantes foi directo ao tema: Os nossos nomes constam nestas listas! O que me chateia mais é que o teu vem antes do meu. Animei-o: Isso não é para te diminuir, os assassinos usaram a ordem alfabética e tu ou estás a meio do abecedário se fores José ou no fim se fores Zé. O Agualusa ainda não aprendeu esta parte mas já alinha muito bem as palavras por alturas. É um génio literário parido da imaginação do Jonas Savimbi.
Um dos esquadrões da morte chamava-se Brigadas da Juventude Revolucionária (BJR) e um dos responsáveis juvenis era o chefe Miala. Começou muito novo a sua carreira. E eu, às portas dos 80 anos, tive artes de me manter vivo! Somos dois casos de sucesso, Eu no ofício de resistir, ele na arte de eliminar. É um homem de larga visão. Conseguiu meter as BJR no SINSE.
A maka das ditaduras é que a partir de um determinado ponto fazem tudo à bruta. Não escondem nada. Convencem-se de que ninguém lhes faz frente e abusam do poder. Neste quadro, a demissão de Ângelo Veiga Tavares causou grande perplexidade!
O senhor Presidente da República apressou-se a acusar o demitido de estar a usurpar as funções da Procuradoria-Geral da República/Ministério Público e do Serviço de Investigação Criminal. Uma boa jogada porque ao mesmo tempo deixou um aviso a João Pinto. Traçou-lhe as linhas vermelhas. Isso de Inspecção Geral da Administração do Estado é alcunha. Quem manda sou eu. Nada de incomodar os meus ajudantes.
Fernando Garcia Miala vem agora dar a sua versão do infausto acontecimento através do pseudónimo Graça Campos, num texto intitulado “Ângelo a História Mal Contada”. No tempo do Semanário Angolense, (era propriedade do chefe do agora Serviço de Inteligência e Segurança do Estado) Graça Campos fazia todo o serviço. Foi lá que nasceu a candidatura de João Lourenço à Presidência da República. Vejam quem fazia opinião naquelas páginas e têm o quadro completo da golpada.
Para o chefe Miala, Ângelo Veiga Tavares é corrupto e estava a abusar do poder. Tão abusador que estava a meter-se nos negócios do chefe supremo. Isso faz-se? Acreditar que em Angola o combate à corrupção atinge todos, é mais ridículo do que acreditar no Pai Natal e escrever-lhe cartas pedindo ao velhote que nos livre do mobutismo reinante. Ou pedir-lhe que leve o campeão da paz em África para a mansão de Miami. Meninas e meninos, o Pai Nata kl sou eu. Vão chamar pai ao outro! Não faço filhos e muito menos em mulheres alheias.
Nem de propósito, o Tribunal de Contas, pela voz do venerando Presidente Sebastião Gunza, manifestou preocupação com a falta de cooperação de entidades que são alvos de acções de fiscalização. Criam imensos obstáculos na cedência dos documentos solicitados para o trabalho inspectivo. Sebastião Gunza também manifesta "profunda preocupação com a falta do cumprimento legal e do dever de cooperação destas entidades”.
E está lançada a confusão. O Tribunal de Contas, até 2028, vai mesmo ver se a Lei é cumprida. E para ter sucesso, está em marcha um plano estratégico a fim de garantir a eficiência e a transparência da gestão dos recursos públicos, aperfeiçoamento dos mecanismos de controlo e fiscalização das finanças públicas, de modo a garantir uma actuação mais eficaz.
A deputada Mihaela Webba diz que a Lei da Segurança Nacional está cheia de inconstitucionalidades. É um perigo para a democracia. A legislação aprovada na generalidade pelos deputados é péssima. Põe em causa as liberdades individuais. Nem sequer prevê a instalação das fogueiras da Jamba em todo o país. Espantoso. Os deputados da UNITA abstiveram-se, não votaram contra. Nem a deputada Michalea Webba! Ela é uma anedota sem piada nenhuma Está para lá do prazo de validade. Se fosse comestível era tóxica.
* Jornalista
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