Artur Queiroz*, Luanda
O colonizado tem muitos retratos nítidos ou desfocados. Se Frantz Fanon fosse vivo ficava confuso. Faz-nos falta saber com que cara e em que cenário ideológico se apresentam os descolonizados que ocupam o poder em África. Os movimentos independentistas puseram em primeiro lugar a Igualdade pela Justiça e a Autonomia pela Liberdade. Os seus herdeiros baniram esses valores. Condenaram os africanos à submissão perpétua. Milhões de seres humanos são espoliados violentamente dos seus direitos, liberdades e garantias.
A sociedade colonial era intoleravelmente injusta. Até uma criança dava conta das injustiças. Mas depois do 4 de Fevereiro de 1961, os próprios colonizadores davam sinais de que percebiam as monstruosidades que protagonizavam, apoiavam ou simplesmente aceitavam acriticamente. Alguns deles e seus filhos, ajudados pelo MPLA, perceberam que sem Liberdade não há Justiça e Angola nada tinha a ver com Portugal.
As primeiras pedradas no charco
fétido do colonialismo, no início do século XX, foram dadas pelas forças
independentistas que se uniram no MPLA. E tiveram o apoio militante de cidadãos
portugueses que foram presos e expulsos da colónia. A médica Julieta Gandra foi
um exemplo de coragem e abnegação. Nos anos
O juiz Albertino contrariou corajosamente as políticas de impunidade, até ser expulso de Angola por condenar colonos criminosos! Os crimes cometidos por taxistas, agentes da PSP e bufos da PIDE contra a população do Cazenga, no início dos anos 70, foram castigados com penas de prisão. Começava a despontar a Igualdade pela Justiça.
Na fase da transição, entre 25 de Abril de 1974 e 11 de Novembro de 1975, um angolano tomou em mãos o sector da Justiça, Diógenes Boavida. Lançou os alicerces do Poder Judicial e começou a sua construção. Ele e Agostinho Neto lançaram o conceito Estado Revolucionário e de Direito. Criaram a Faculdade de Direito após a Independência Nacional.
O Ensino Superior apenas chegou a Angola no ano de 1962, pelo Decreto- Lei nº 44.530 que cria os Estudos Gerais Universitários. Luanda, Huambo e Lubango foram as primeiras cidades universitárias. Mas não permitiram que fosse criado o curso de Direito! Lisboa não queria Justiça. Agostinho Neto e Diógenes Boavida mobilizaram uma vasta equipa para Angola rer uma Faculdade de Direito. O julgamento dos mercenários em Luanda foi um acontecimento indelével que marcou África e o mundo.A formação de juristas é custosa. Exige muitos sacrifícios dos próprios e do Estado. Formar magistradas e magistrados é ainda mais custoso. Mas Angola tem hoje milhares de quadros na área, entre advogados, magistrados e agentes do Ministério Público. Este fabuloso edifício foi erguido em menos de 50 anos. É uma das maiores vitórias do Povo Angolano.
Hoje o agente do Ministério Público Pascoal Joaquim, presente na cimeira da União Africana, mostrou-se muito feliz com o “combate à corrupção em Angola”. Disse que o processo é um exemplo para África e o mundo. Ainda não conhece o parecer do Conselho de Direitos Humanos da ONU sobre o processo do empresário angolano Carlos São Vicente. Existe desde o dia 14 de Novembro de 2023. O “combate à corrupção” em Angola afinal é feito com graves atropelos à Lei e com recurso a prisões arbitrárias.
Ao senhor Pascoal Joaquim deixo este excerto do parecer: “A privação de liberdade de Carlos Manuel de São Vicente, está em desacordo com os artigos 9 e 14 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e 9, 10 e 11 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, é arbitrária. O Governo de Angola deve tomar as providências necessárias para sanar sem demora a situação de São Vicente e a torne em conformidade com as normas internacionais pertinentes, incluindo as previstas na Declaração Universal dos Direitos Humanos e no Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos”.
A técnica de fingir que não aconteceu nada fica mal ao senhor procurador-geral adjunto, mas também a todo o Poder Judicial. Ir para uma reunião de alto nível gabar prisões arbitrárias e atentados à Declaração Universal dos Direitos Humanos pode cair bem ao Soba Grande no Palácio da Cidade Alta. Mas desvaloriza e desprestigia todos os operadores da Justiça. Todos, sem excepção.
Por isso é com grande perplexidade que registo o silêncio ensurdecedor da Ordem dos Advogados de Angola /OAA) sobre este parecer da Conselho dos Direitos Humanos da ONU, que não deixa pedra sobre pedra no badalado “combate à corrupção”.
Quanto ao silêncio dos poderes públicos, está em conformidade com o mobustismo reinante. O Titular do Poder Executivo e Presidente da República, seus auxiliares, deputadas e deputados eleitos ainda não perceberam que os destroços da demolição do Poder Judicial, mais dia, menos dia vão atingi-los.
O Ministério das Finanças, numa manobra de diversão ridícula, levou hoje à Assembleia Nacional peritos para ensinarem às deputadas e deputados tudo sobre seguros e fundos de pensões! Quem sabe tudo sobre isso é Carlos São Vicente. Ganhou muito dinheiro nessa actividade. Em Angola e no estrangeiro. Por ser um empresário de sucesso, por ter criado riqueza e milhares de postos de trabalho foi castigado com uma prisão arbitrária!
O Grupo Carrinho já está
posicionado no primeiro lugar para receber os “investimentos” dos EUA
O Movimento Democrático de Libertação de Portugal (MDLP) e o Exército de Libertação de Portugal (ELP) eram duas organizações terroristas que fizeram gravíssimos atentados em Portugal e Angola, em 1975. Uma unidade do ELP, do coronel Santos e Castro, marchou sobre Luanda mas foi derrotada. Não passou do Morro da Cal.
Destas organizações terroristas faziam parte artistas como Jaime Nogueira Pinto ou o número dois do partido Chega, racista e xenófobo. Nunca foram julgados e condenados porque Mário Soares os protegeu. Mas cometeram gravíssimos crimes. Os angolanos que votam em Portugal tenham cuidado. Não votem no terrorista Pacheco de Amorim!
*Jornalista
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