quarta-feira, 19 de março de 2025

Conflito na RDC: O desnível entre o Exército e o M23

Nikolas Fischer | Deutsche Welle

Fracasso das tropas congolesas é explicado pela corrupção sistémica que gera logística débil, considera investigador. Já M23 têm demonstrado capacidade de organização e coordenação das suas ações do terreno.

Os combatentes do Movimento 23 de Março (M23), apoiados pelo Ruanda, continuam a avançar no leste da República Democrática do Congo (RDC). O grupo ocupou desde janeiro as cidades de Goma e Bukavu, embora tenha menos efetivos do que o Exército congolês.

As Nações Unidas estimam que o M23 conta apenas com alguns milhares de combatentes, apoiados por cerca de quatro mil soldados ruandeses, um número muito abaixo das estimativas do efetivo das Forças Armadas congolesas.  De acordo com o Instituto Internacional de Estudos Estratégicos, em 2022, as tropas congolesas tinham cerca de 135 mil soldados. E o número pode ter aumentado, segundo estimam especialistas.

Em 2023, o Presidente congolês Felix Tshisekedi aumentou o orçamento para a defesa, fixando-se em 732 milhões de euros. Muitos críticos questionam o avanço do M23 com todo este dinheiro.

Mas Alain De Neve, investigador do Instituto Real Superior de Defesa em Bruxelas, diz que o fracasso das tropas congolesas é explicado pela corrupção sistémica que gera uma logística débil.

Corrupção e pilhagem

Jakob Kerstan, chefe do escritório da Fundação Konrad Adenauer em Kinshasa, acrescenta que "o dinheiro é distribuído maioritariamente através dos generais".

"Isto torna as unidades do Exército extremamente dependentes dos generais", sublinha.

Este cenário é confirmado por Ciaran Wrons-Passmann, diretor da Rede Ecuménica Alemã para a África Central, para quem a corrupção e a pilhagem proporcionam uma "oportunidade para os líderes se enriquecerem".

Wrons-Passmann acrescenta que, desde a chegada do Presidente Félix Tshisekedi ao poder, houve muitas mudanças nas chefias militares no país, o que pode ter contribuído para a desarticulação das operações.

"Se olharmos para o número de Chefes de Estado-Maior, já houve pelo menos três ou quatro", adianta. "Também há muitas rotações nos serviços de informação. Isso mostra um pouco que, em princípio, ele não encontrou o pessoal certo para implementar as suas ideias, se é que as tem", refere Wrons-Passmann.

Já Tshisekedi disse ao jornal americano "The New York Times" que o seu Exército tinha sido "traído por dentro", acusando alguns membros das Forças Armadas de falta de patriotismo.

Reformas militares de Tshisekedi

Por outro lado, Tshisekedi acusou o seu antecessor, Joseph Kabila, de não ter investido na construção de um Exército forte, ao longo dos 18 anos em que esteve no poder. Terá sido para tentar remediar isso que o Presidente decidiu fazer reformas militares no país, tendo aprovado o aumento de salários dos soldados.

Jakob Kerstan observa, no entanto, que esses salários não são nada comparados com os dos mercenários europeus que "recebiam dezenas de milhares de euros por mês".

O défice de formação e de equipamento é outro grave problema nas tropas congolesas, segundo Alian De Neve, investigador no Instituto Real Superior de Defesa em Bruxelas.

O pesquisador observa que, em contrapartida, os combatentes do M23 beneficiam de uma formação estruturada e de táticas de combate bem adaptadas ao terreno montanhoso do Kivu do Norte.

Kerstan concorda, acrescentando que as tropas congolesas estão bastante desatualizadas, quer em termos de tecnologia ecomo de logística.

"Kinshasa, por vezes, não sabe para onde se deslocam partes do Exército no leste do Congo. O Exército é, por vezes, coordenado via Whatsapp, o que torna extremamente difícil para Kinshasa dar instruções claras que são depois implementadas no terreno", explica.

No entanto, os rebeldes do M23, com o apoio do Ruanda, teriam demonstrado capacidade de organização e coordenação das suas ações do terreno.

Ler/Ver em DW:

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