terça-feira, 22 de maio de 2012

O BOSQUE EM FLOR



Rui Peralta

O quadrilátero mortal

A convergência

         O quadrilátero mortal é formado pela convergência de 4 factores explosivos, na actual crise sistémica global. Bancos, Bolsas, Dividas e Reformas. Enquanto aguardam que a UE estruture um projecto politico, social e económico comum, de médio e longo prazo, os operadores permanecem prisioneiros das medidas de curto prazo, da incerteza grega, da indecisão das políticas económicas e financeiras da UE e dos riscos das dívidas públicas.

         Enquanto isso nos USA o constante adiar da retoma económica (o que já provocou um retorno ás prácticas das suprimes), aliado às renovadas preocupações com a saúde do sector financeiro norte-americano (exemplo recente do JP Morgan) e ao problema enorme do endividamento do país levam os operadores económicos e financeiros a temer um futuro Basta amargo (Basta lembrar que por cada 1 dólar de crescimento os USA geram dois dólares e meio de divida. É o problema de todas as economias cujo endividamento torna-se excessivo e que os bem falantes e parecidos keynesianos sempre se esquecem quando apregoam as suas balelas contra as politicas de austeridade. No mundo real é necessário um equilíbrio entre redução do endividamento e medidas de crescimento).

         No Reino Unido a recessão junta-se á incapacidade em dominar os défices, para além de um mal-estar crescente entre a população e no Japão a estagnação económica e o enfraquecimento das exportações ampliam o excessivo endividamento do país.

         Para os operadores e para as simples famílias esta convergência vai significar alto risco. Nos primeiros vai depurá-los, sendo de importância fundamental as duas primeiras vertentes da convergência: Bancos e Bolsas. Não irei referir aqui estes dois factores, preferindo passar aos segundos (as famílias) que irão empobrecer substancialmente. Para estes há dois elementos desta convergência que são fundamentais: as reformas e as dívidas das famílias. Sobre as reformas já todos sabemos que os decisores preparam profundas alterações nos sistemas de segurança social, alterações que apesar de saber em que sentido caminham, ainda não estão completamente desenhadas. É pois sobre as dividas que vou focar a minha atenção e pedir a vossa.

As dívidas públicas e privadas

         Em 2008 existiam 30 milhões de milhões de USD (30 biliões de USD) de activos fantasmas no sistema financeiro mundial. Hoje restam 15 biliões de USD, que correm sério risco de esfumarem-se até final do ano. Isso implica que após esse momento será criado um novo sistema financeiro internacional e também a falência, ou a intervenção salvadora dos estados, de 10% a 20% dos bancos ocidentais. Só que desta vez, ao contrário do que aconteceu em 2008 e 2009, os accionistas serão as primeiras vítimas. Apenas os accionistas que possuírem um importante peso geopolítico (fundos soberanos, estados amigos) serão merecedores de atenções especiais.

         Em termos de divida privada, as famílias vão, principalmente no Reino Unido e nos USA, vão enfrentar, sem apoios, as consequências das altas de taxas e da insolvabilidade. Prisioneiros da austeridade e da recessão os estados ocidentais não têm meios de socorrer as chamadas classes médias (toda a média e pequena-burguesia) enquanto o crescimento não se fizer sentir.

         Nos USA, por exemplo, a questão da divida dos estudantes está prestes a tornar-se uma subprime bis. O fim da política de bonificação gerou uma alta das taxas e trouxe consigo uma situação desastrosa a milhões de jovens norte-americanos e aos seus pais. Por sua vez, na Europa o Reino Unido decidiu deixar a classe média por sua conta e risco, no enfrentar do seu endividamento excessivo, ou seja, está a permitir a proletarização de grande parte dos sectores da pequena-burguesia e á perda de rendimentos substanciais da média burguesia, transformando-a numa pequena burguesia encolerizada, que pragueja cada vez mais contra os seus dirigentes, todos da alta burguesia ou média-alta.

         No continente europeu os povos abriram frentes de confrontação (ainda democráticas, utilizando na maioria dos casos o voto de rejeição ou a rejeição do voto) contra as elites estabelecidas. Para que este confronto não tome feições de rebelião ou mesmo de insurreição, resta o caminho de nem carne nem peixe, apontado pelas recentes eleições presidenciais francesas. O novo presidente francês encarna a tentativa de abrir um caminho entre a austeridade e a retoma do crescimento. Se esta é ou não uma solução isso já é outra coisa.

         Até se concluir esse processo os sobressaltos políticos na Grécia e as negociações cada vez mais complexas no seio da UE, dominam a agenda, perante o grande nervosismo dos credores e dos mercados (a titulo de exemplo: o fundo soberano norueguês – tão estáveis que eles se consideram aos olhos do mundo – decidiu desembaraçar-se dos seus activos em divida soberana dos países mais fragilizados da UE, segundo o Le Figaro e a Market Watch).

         Este nervosismo dos mercados é agravado pelo facto das instituições financeiras da Wall Street e da City estarem fragilizadas (e de haver consciência disso, interna e externamente) face ao risco de não pagamento dos créditos, sejam dívidas públicas ou privadas, que representam os últimos restos do activo existente no seu balanço. O tema do endividamento incontrolado dos USA, anda cada vez mais ligado às reduções orçamentais automáticas, mecanismo que poderá vir a ser imposto devido á falta de acordo e decisões do Congresso, tentando evitar a todo o custo uma situação de caos fiscal.

Moral da História

         Iremos muito provavelmente assistir ao remake, mas em versão mais violenta do efeito que as dívidas europeias e norte-americanas já provocaram no ano passado, durante o Verão. Mesmo que os receios de que o Euro e a UE implodam, desapareçam (e se é possível hoje encararmos a saída da Grécia da zona Euro, sem colocar em causa esta ultima, não deixa de ser impossível que isso aconteça. Os meninos de coro do canto neokeynesiano, de Krugman a Roubini que apregoam o fim do euro, têm a mesma credibilidade dos adivinhos do Imperio Romano que liam o futuro nas entranhas dos animais. Por uma razão pratica muito simples, a tragédia grega não tem qualquer fundo platónico ou aristotélico. Façam de contas que são gregos. O que fariam se aparecesse um grupo de janotas bem vestidos a negociarem convosco para que trocassem os vossos euros por novos dracmas. O que é que faziam? Pois…sem comentários!) dizia eu, mesmo que os receios sobre o euro desapareçam, eles serão substituídos por um temor muito maior para os mercados: a monetarização maciça das dívidas dos USA (o antigo secretário do Tesouro dos USA, Robert Rubin, já mudou de casaco e de discurso, juntando-se aos que advertem para este grave risco a curto prazo).

         Ainda vai no átrio, a procissão.

Fontes

New York Times; 10/04/2012
CNBC; 06/04/2012; 26/04/2012;
Wall Street Journal; 13/05/2012
Times of India; 10/05/2012; 11/05/2012;
Market Watch; 09/05/2012; 10/05/2012;
China Daily; 28/03/2012; 06/05/2012;
Washington Post; 11/05/2012;
USA Today; 13/04/2012;
CERF; 21/04/2012
Le Figaro; 05/05/2012;
Reuters; 10/05/2012

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