Fernando Dacosta – Jornal i, opinião
Acirrada zaragata
desabou sobre nós: uma figura relevante, a presidente do Banco Alimentar contra
a Fome, Isabel Jonet, disse alto, isto é na televisão, o que devia ter dito
baixo, isto é entre iguais. Exuberante a ajudar necessitados, a bondosa
senhora, acabada de chegar da Grécia, um horror de miséria, sentia-se, ante as
câmaras, irritada, crispada. Descontrolando-se, zás, confessou o que a azedava.
Os portugueses são uns megalómanos que pretendem viver acima das suas
possibilidades, que só comem carne, só sabem criticar, lamuriar, pedinchar.
Farta, a entrevistada caiu na negação: miséria, miséria era a da Grécia.
Comparado, Portugal revelava-se até um oásis – a imagem do oásis continua a
render.
Isabel Jonet
evoluiu, no entanto; tempos atrás a pobreza no país indignava-a. Com a subida,
porém, ao poder de Passos Coelho ela (a miséria) desapareceu. As suas
declarações encheram-nos de alegria, se já não há fome em Portugal (apenas
apetite), não são mais precisas organizações como a que lidera – e não temos de
continuar, oh que felicidade, a aturar os detestáveis pobrezinhos! Gonçalo M.
Tavares lembra, no seu notabilíssimo romance “Uma Viagem à Índia”, que “a
diferença entre pobres e ricos” é que “os pobres não têm dinheiro para exercer
a sua maldade”. Esqueceu-se que a exercem, e desalmadamente, pela internet.
Não podermos comer
bife todos os dias (nem uma bifana?) significa que podemos, talvez, comer
lagosta. Este é um raciocínio parecido ao que levou Maria Antonieta a responder
que se o povo de França não tinha pão, que consumisse brioches. A desastrada
monarca, por via dessas, ficou sem cabeça. Acontece.
Escreve à
quinta-feira
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