Fernanda Câncio – Diáriode Notícias, opinião
Que levará alguém a
enforcar um coelho em protesto contra um primeiro-ministro com apelido de
láparo? Não sei se pergunta-ram ao moçoilo que ostentava a coisa que raio
queria dizer com o preparo nem se tal nunca sucedeu antes porque desde Sá
Carneiro que não há PM com nome de animal e uma ovelha sai cara e pesa. Mas foi
a primeira vez que tivemos em Portugal algo de parecido com as efígies dos
políticos enforcados ou em chamas que nos chegam periodicamente, pela TV, de
outras partes do mundo.
Há quem considere a
imagem radical. De mau gosto, chocante, gratuita, até obscena, é. E muito pior
que isso se a virmos como uma ameaça do autor/autores em relação ao PM. Mas
sabemos que ninguém a vê como tal -nem as dezenas de polícias que estiveram na
Universidade de Lisboa, já que, ao contrário do que tem sido hábito com os
cantores do Grândola (sem que a PSP justifique, como é obrigada pelo artigo
250º do Código do Processo Penal, o procedimento - e como poderia, se não há
suspeita de crime invocável?), nem terão, que se saiba, identificado o dono do
coelho. É pois, acima de tudo, uma piada de mau gosto que nada mais pressupõe
que vontade de "vir na TV". Deve ser reprovada, claro. Mas
considerá-la como sinal de "radicalização" é não saber o que é
radicalização - ou, paradoxalmente, querer radicalizar a situação.
Porque, claro,
falar de "radicalização" serve para assustar. Para dizer "nós ou
o caos". Mas se um coelho enforcado ou insultos em corredores são
radicalização, que dizer do partido que agora clama "reprovações
enfáticas" à sua esquerda mas que quando há meses um seu deputado,
presidente da JSD, afiançou que bateria em Sócrates se o encontrasse na rua,
não achou necessário demarcar-se disso? Que dizer do Governo que de cada vez
que o confrontam com as suas responsabilidades acusa o Executivo anterior de
todos os males do País? Que expele discursos de ódio contra quem o antecedeu e
arrasa, em histérico exorcismo, as marcas da governação PS? Que dizer de um
político que chegou ao poder a prometer o fim da austeridade "para as
pessoas" e que logo a seguir jurou ir "além da troika"? Que na
oposição defendeu a criminalização dos governantes que fazem previsões
económicas sistematicamente erradas e que no poder, sem acertar uma, diz que
"previsões são previsões", sem sequer se desculpar? Que chama piegas
aos que o elegeram e os manda emigrar, que diz que o desemprego e falências
aumentam porque "tem de ser"?
Ser radical é
recusar bom senso e consenso, ser cego e surdo a tudo o que não seja a sua
conceção do certo e do caminho, ter a obstinação brutal dos fanáticos. É fazer
do ódio discurso, chamar necessidade à violência, deitar fogo para fazer novo,
"obra", sobre as cinzas. Radical é Passos e este Governo, não o tonto
estudante com seu pobre bicho enforcado. E não é prisão nem banimento, muito
menos morte (ridículo), que se lhe exige: demissão chega - mas urge.
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