Tiago Mesquita –
Expresso, opinião
Não vejo outra
solução para levar Isaltino Morais a cumprir a pena de prisão a que foi
condenado que não passe por um pedido dirigido ao próprio para que colabore com
a justiça, que faça justiça pelas próprias mãos. Ou deveria dizer pés?
Dirija-se até à cadeia da área de residência, entregue-se e mostre ao país o
homem proactivo que diz ser. Pode, inclusivamente, pedir ao sobrinho taxista
uma boleia, para tornar a situação ainda mais deliciosamente estúpida. É que só
mesmo um político português para conseguir engavetar-se a ele próprio, depois
de gozar com a justiça portuguesa durante o tempo que bem entendeu.
Quarenta e quatro
recursos e centro e trinta e três mil euros depois, Isaltino Morais continua a
ver o sol sem ser aos quadradinhos. Correção: esteve preso durante 23 horas.
Repito: 23 horas. Jantou, viu a bola, leu os jornais do dia, tratou da papelada
que tinha em atraso, e saiu fresquinho que nem uma alface, a tempo de ir à
pastelaria Garrett tomar o pequeno-almoço depois de o motorista o apanhar junto
ao Estabelecimento Prisional de Lisboa. A situação é de tal forma ridícula que
começaram a surgir pedidos desesperados. Segundo o jornal i noticiou esta
semana, um magistrado do MP insiste que a juíza de Oeiras que tem em mãos o
processo tem de ter a "coragem" de emitir um mandado de captura.
"A partir do momento em que está transitado em julgado é para executar.
Nenhum recurso terá influência sobre a condenação."
Ora bem, vivendo
num Estado apelidado de direito, julguei, na minha inocência, que não seria
necessário chegarmos ao ponto de magistrados andarem a pedinchar coragem na
aplicação da justiça nos casos que têm em mãos. Deveriam limitar-se a fazer
cumprir a lei, independentemente dos cidadãos, das susceptibilidades feridas e
dos desconfortos políticos e institucionais causados. Mas a verdade é que
prender um político em Portugal é menos provável do que encontrar um pinguim a
chupar cubos de gelo na praia da Oura.
O facto de o senhor
Isaltino Morais, ao dia de hoje, não se encontrar a cumprir a pena de prisão a
que aparentemente já foi condenado há muito tempo só demonstra uma coisa
simples: a justiça em Portugal tarda e falha.
Adenda:
aparentemente o "Tribunal Constitucional recusou o recurso de Isaltino
Morais, o que deixa agora ao Tribunal de Oeiras a decisão de ordenar o
cumprimento da pena de dois anos de prisão efetiva, aplicada ao autarca." (notícia
lida enquanto escrevia este texto)
Não me atrevo a
pedir à senhora juíza que emita um mandado de captura e faça cumprir a lei. Não
sou tão ousado. Peço antes a Isaltino Morais, até porque já provou ser
competente em matéria judicial, que não deixe que a justiça portuguesa continue
a envergonhar-se a ela própria, e ao país, e acabe com a palhaçada. Senhor
Isaltino, importa-se, por favor, de ir preso pelos próprios pés?
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