sábado, 25 de maio de 2013

Cavaco “palhaço”: Código Penal. "Palhaço", mas só em sentido político. Será insulto?

 

Susete Francisco – Jornal i
 
Miguel Sousa Tavares chamou “palhaço” a Cavaco Silva. Belém perguntou à Procuradoria se é uma ofensa, a PGR acha que pode ser e vai investigar, o jornalista chamou-lhe um “deslize”. Liberdade de expressão ou ilícito criminal? Resposta do advogado Carlos Pinto de Abreu: “Deixem-se de palhaçadas.”
 
"Nós já temos um palhaço. Chama-se Cavaco Silva. Muito pior do que isso é difícil." As palavras de Miguel Sousa Tavares ao "Jornal de Negócios" levaram ontem a Procuradoria-Geral da República (PGR) a abrir um inquérito ao jornalista e comentador, considerando que "as expressões proferidas são susceptíveis de integrar a prática do crime de ofensa à honra do Presidente da República". Foi o próprio chefe do Estado a solicitar à PGR a análise das declarações.
 
Miguel Sousa Tavares já veio admitir ter sido "excessivo". "É muito simples, eu não tenho nenhuma consideração política pelo professor Cavaco Silva, conforme é público, mas tenho pelo chefe de Estado, seja ele quem for e nesse sentido reconheço que não devia ter dito aquilo", afirmou à Lusa, qualificando as suas palavras como um "deslize". "Obviamente que lhe chamei palhaço no sentido político", ressalvou ao "Expresso".
 
Mas será o "deslize" um ilícito criminal? Para Pedro Bacelar Vasconcelos a resposta à pergunta é "não". "Na minha opinião pessoal trata-se de um exercício de liberdade de expressão. No limite, mas um exercício da liberdade de expressão. Tem uma carga insultuosa, mas atendendo a que se trata de um cargo público a apreciação dos actos do seu titular tem de estar sujeita a uma maior tolerância quanto aos termos usados pelos cidadãos", afirmou ao i.
 
Já o penalista Carlos Pinto de Abreu é mais cáustico: "Deixem-se de palhaçadas." "Não têm coisas mais importantes para tratar? Todos, comentadores, Procuradoria-Geral da República, Presidente da República", questiona. Rogério Alves, ex-bastonário da Ordem dos Advogados, não vê razão para o assunto acabar na barra dos tribunais: "Parece-me uma afirmação infeliz e deselegante, mas que não chega a ter relevância criminal."
 
Na entrevista, Sousa Tavares diz que "já não temos idade para brincar aos generais. O pior que nos pode acontecer é um Beppe Grillo, um Sidónio Pais. Mas não por via militar". Questionado sobre anteriores declarações de Pacheco Pereira, que defendeu que o país pode acabar nas mãos de um "ditador populista, um palhaço", o jornalista responde então que "nós já temos um palhaço. Chama--se Cavaco Silva".
 
Bacelar Vasconcelos admite que "há aqui matéria, do ponto de vista jurídico". Mas aponta um caso "análogo", passado em França com Nicolas Sarkozy - um cidadão francês foi condenado ao pagamento simbólico de 30 euros por ter exibido um cartaz dirigido ao então presidente em que se lia "Vai-te catar, seu idiota". O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos acabou por inverter a decisão, invocando a liberdade de expressão.
 
O Código Penal português estabelece que "quem injuriar ou difamar o Presidente da República é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa", um quadro agravado se a "injúria ou a difamação forem feitas por meio de palavras proferidas publicamente" - como foi o caso. Neste caso é aplicável "pena de prisão de 6 meses a 3 anos" ou "pena de multa não inferior a 60 dias". O Código Penal acrescenta que o "procedimento criminal cessa" se o Presidente "expressamente declarar que dele desiste".
 
Que o caso envolva o Presidente é inédito, mas não é a primeira vez que a palavra "palhaço" aparece na vida política portuguesa e acaba nos tribunais. Em 2008 o comentador Daniel Oliveira foi condenado ao pagamento de 2000 euros a Alberto João Jardim, precisamente por ter chamado "palhaço" ao presidente do governo regional da Madeira.
 

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