Susete Francisco – Jornal i
Miguel Sousa
Tavares chamou “palhaço” a Cavaco Silva. Belém perguntou à Procuradoria se é
uma ofensa, a PGR acha que pode ser e vai investigar, o jornalista chamou-lhe
um “deslize”. Liberdade de expressão ou ilícito criminal? Resposta do advogado
Carlos Pinto de Abreu: “Deixem-se de palhaçadas.”
"Nós já temos
um palhaço. Chama-se Cavaco Silva. Muito pior do que isso é difícil." As
palavras de Miguel Sousa Tavares ao "Jornal de Negócios" levaram
ontem a Procuradoria-Geral da República (PGR) a abrir um inquérito ao
jornalista e comentador, considerando que "as expressões proferidas são
susceptíveis de integrar a prática do crime de ofensa à honra do Presidente da
República". Foi o próprio chefe do Estado a solicitar à PGR a análise das
declarações.
Miguel Sousa
Tavares já veio admitir ter sido "excessivo". "É muito simples,
eu não tenho nenhuma consideração política pelo professor Cavaco Silva,
conforme é público, mas tenho pelo chefe de Estado, seja ele quem for e nesse
sentido reconheço que não devia ter dito aquilo", afirmou à Lusa,
qualificando as suas palavras como um "deslize". "Obviamente que
lhe chamei palhaço no sentido político", ressalvou ao
"Expresso".
Mas será o
"deslize" um ilícito criminal? Para Pedro Bacelar Vasconcelos a
resposta à pergunta é "não". "Na minha opinião pessoal trata-se
de um exercício de liberdade de expressão. No limite, mas um exercício da
liberdade de expressão. Tem uma carga insultuosa, mas atendendo a que se trata
de um cargo público a apreciação dos actos do seu titular tem de estar sujeita
a uma maior tolerância quanto aos termos usados pelos cidadãos", afirmou
ao i.
Já o penalista
Carlos Pinto de Abreu é mais cáustico: "Deixem-se de palhaçadas."
"Não têm coisas mais importantes para tratar? Todos, comentadores, Procuradoria-Geral
da República, Presidente da República", questiona. Rogério Alves,
ex-bastonário da Ordem dos Advogados, não vê razão para o assunto acabar na
barra dos tribunais: "Parece-me uma afirmação infeliz e deselegante, mas
que não chega a ter relevância criminal."
Na entrevista,
Sousa Tavares diz que "já não temos idade para brincar aos generais. O
pior que nos pode acontecer é um Beppe Grillo, um Sidónio Pais. Mas não por via
militar". Questionado sobre anteriores declarações de Pacheco Pereira, que
defendeu que o país pode acabar nas mãos de um "ditador populista, um
palhaço", o jornalista responde então que "nós já temos um palhaço.
Chama--se Cavaco Silva".
Bacelar Vasconcelos
admite que "há aqui matéria, do ponto de vista jurídico". Mas aponta
um caso "análogo", passado em França com Nicolas Sarkozy - um cidadão
francês foi condenado ao pagamento simbólico de 30 euros por ter exibido um
cartaz dirigido ao então presidente em que se lia "Vai-te catar, seu
idiota". O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos acabou por inverter a
decisão, invocando a liberdade de expressão.
O Código Penal
português estabelece que "quem injuriar ou difamar o Presidente da
República é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa", um
quadro agravado se a "injúria ou a difamação forem feitas por meio de
palavras proferidas publicamente" - como foi o caso. Neste caso é
aplicável "pena de prisão de 6 meses a 3 anos" ou "pena de multa
não inferior a 60 dias". O Código Penal acrescenta que o
"procedimento criminal cessa" se o Presidente "expressamente
declarar que dele desiste".
Que o caso envolva
o Presidente é inédito, mas não é a primeira vez que a palavra
"palhaço" aparece na vida política portuguesa e acaba nos tribunais.
Em 2008 o comentador Daniel Oliveira foi condenado ao pagamento de 2000 euros a
Alberto João Jardim, precisamente por ter chamado "palhaço" ao
presidente do governo regional da Madeira.
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