ANDREIA SANCHES - Público
Os dados que são
apresentados nesta segunda-feira revelam um aumento dos processos nas comissões
de protecção de crianças e jovens.
Menos casos de
negligência. Mais crianças e jovens sinalizados como estando expostos a
comportamentos desviantes, sobretudo a actos de violência entre familiares. Um
ligeiro aumento dos casos de abuso sexual. E um aumento muito expressivo (65%)
dos menores que assumem, eles próprios, atitudes que afectam o seu bem-estar —
sem que os pais se oponham ou consigam evitá-lo. Estes são alguns dos dados
relativos à actividade processual das comissões de protecção de crianças e
jovens (CPCJ) que hoje serão apresentados.
O balanço do que
foi 2012 nas CPCJ é este: lidaram com 69.007 processos. Mais 1066 do que em
2011. Muitos deles já vinham de trás. No total, 29.149 foram abertos ao longo
do ano (mais 1202 do que em 2011). E, destes, 27.050 representam novas
situações de perigo.
Num ano em que
vários indicadores de risco social se agravaram — a começar pela taxa de
desemprego —, o relatório não avalia de que forma a crise pode ter tido impacto
no tipo de situações que chegaram às comissões de protecção.
Já o alargamento da escolaridade obrigatória é apontado como uma das
explicações para o aumento dos processos instaurados e reabertos. Como?
A lei manda que,
sempre que faltem sistematicamente às aulas ou desistam de estudar, as crianças
abrangidas pela escolaridade obrigatória têm de ser sinalizadas. Entende-se que
a ausência ou o insucesso é uma violação do direito à educação. E que, por
isso, o menor está em perigo.
A Lei n.º 85 de
2009 determinou que os jovens deveriam passar a concluir o 12.º ano (e já não
apenas o 9.º); a obrigatoriedade de ir à escola cessa quando perfazem os 18
anos, independentemente do nível de estudos que alcancem (antigamente, o limite
era 15 anos). A lei previu também uma aplicação gradual do alargamento: seriam
abrangidos, em primeiro lugar, apenas os alunos que em 2009/10 se matriculassem
no 1.º e 2.º ciclos do ensino básico, bem como os que entrassem no 7.º. Isto,
independentemente da idade que tivessem então.
O universo de
rapazes e raparigas abrangidos pela obrigatoriedade de estar na escola para
além dos 15 anos tem vindo, por isso, a aumentar gradualmente e, com ele, o
universo de jovens e de situações de incumprimento do direito à educação que as
escolas têm que sinalizar às CPCJ. Por exemplo: alguém que entrou no 7.º, em
2009, com 14 anos, já foi abrangido pela lei. E em Setembro do ano passado
chegou ao 10.º ano a primeira leva dos que terão de permanecer no secundário
até aos 18 anos (ou até ao 12.º).
Em 2012, as CPCJ
abriram 2537 processos de promoção e protecção motivados por situações de
abandono, absentismo ou insucesso escolar de jovens com mais de 15 anos. No ano
anterior tinham sido 1708 — ou seja, houve mais 829 processos abertos,
neste escalão etário, determinados por esta problemática. Conclui assim o
elatório anual da avaliação da actividade das CPCJ que o alargamento da
escolaridade justifica uma grande parte (69%) do aumento dos processos
instaurados em 2012 (mais 1202 do que em 2011, recorde-se).
Mas há mais
mudanças assinaladas no relatório: houve um aumento (23,5%) de situações
relacionadas com a exposição dos jovens a comportamentos que podem comprometer
a sua saúde, segurança e bem-estar. Estão nesta categoria os menores que, no
seu quotidiano, assistem a situações de violência doméstica, ou de consumo de
álcool ou de estupefacientes. Em 2012, foram acompanhados mais de 16 mil.
A exposição a
comportamentos desviantes tornou-se, aliás, a situação de perigo mais reportada
quando se olha apenas para os processos abertos em 2012 (excluindo, portanto,
os que transitaram de outros anos). É a primeira vez que acontece.
Diminuíram os casos
sinalizados de maus tratos físicos e psicológicos (mais de oito mil casos
acompanhados ao longo do ano). E a mendicidade ou exploração do trabalho
infantil (236 e 48 casos, respectivamente). Mas aumentaram as situações de
abuso sexual (de 1491 crianças acompanhadas, em 2011, contra 1525, em 2012).
Também o número de
criança ou jovens sinalizados com comportamentos que afectam o seu
desenvolvimento e saúde sofreu uma subida. Aliás, nenhuma situação de perigo
sinalizada às CPCJ aumenta tanto: 65% (6252 casos de perigo contra 3785 em
2011). Estamos a falar de comportamentos anti-sociais graves, de actos de
indisciplina ou de bullying, de consumos reiterados de droga ou álcool.
Outro dado novo: o
perfil etário dos menores acompanhados. Em 2011, o grupo predominante era o dos
11-14 anos. Seguiam-se as crianças até aos 5 anos. Um ano depois, a situação
inverteu-se. Houve uma redução do número de crianças acompanhadas com menos de
15 anos. E o escalão mais representado passou a ser o dos 15-21 — há quase duas
vezes mais jovens deste grupo nos processos das CPCJ.
Sem comentários:
Enviar um comentário