segunda-feira, 17 de junho de 2013

ENTREVISTA A JOSÉ EDUARDO DOS SANTOS “DESANUVIOU TENSÕES”



Ricardo David Lopes - Sol

A entrevista televisiva do Presidente angolano permitiu “claramente desanuviar” alguma tensão entre os dois países, gerada por “sectores minoritários”, disse ao SOL o secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e Cooperação português, Francisco Almeida Leite.

“A entrevista acertou no alvo”, considerou Almeida Leite, que falava ao SOL à margem da comemorações do Dia de Portugal em Luanda. “Muita gente precisava de ouvir da boca do senhor Presidente que o nível das nossas relações não é afectado por sectores minoritários quer da sociedade angolana, quer portuguesa”, acrescentou, aludindo a notícias surgidas nos últimos meses.

Outro tipo de tensões foram despertadas pelo facto de a SIC ter sido escolhida para José Eduardo dos Santos para pôr termo a 10 anos de silêncio televisivo (a última entrevista foi à brasileira Globo). A Presidência sofreu fortes críticas de vários comentadores angolanos pelo facto de a entrevista – transmitida em Angola pela TV Zimbo – não ter sido concedida a um órgão nacional. E, por outro lado, não esconderam a estranheza de o canal português ser de um grupo de comunicação com um histórico de relações tensas com Luanda.

Ao SOL, fontes da Presidência angolana invocaram que a entrevista foi solicitada por um canal de televisão de Israel para ser também transmitida pela SIC e Globo – uma versão que contraria a da direcção de informação da TV portuguesa, publicada no sábado passado no Expresso.

Parceria estratégica

O secretário de Estado, que termina hoje uma visita oficial de cinco dias a Angola, debateu com governantes locais a realização da primeira cimeira bilateral, no segundo semestre, que deverá “colocar as relações mútuas noutro patamar, de parceria estratégica”.

Sublinhando que “a sociedade civil e o Governo português são muito amigos de Angola”, garantiu que os dois Estados apoiam “investimentos cruzados e o cruzamento de participações entre empresas”. “Também é isso que se pretende fomentar com a realização da cimeira bilateral”, que se prevê ocorrer em Luanda no segundo semestre deste ano.

Almeida Leite explicou que, actualmente, as relações entre os dois países estão baseadas em programas plurianuais – Programa Indicativo de Cooperação –, mas que “chegou o momento de avançarem um patamar”. O objectivo é a criação de uma “parceria estratégica, que passa por traçar metas em vários domínios, avaliadas numa base anual ou mesmo semestral”.

Cavaco no lugar de Passos

“Não queremos uma relação de passado, mas de futuro, e ambos desejamos uma cimeira com conteúdo e resultados”, afirmou, elegendo a necessidade de protecção dos investimentos recíprocos, a educação e capacitação de quadros, a saúde, a agricultura e o desenvolvimento sustentável como “prioridades” na agenda do encontro, que está a ser preparado, para já, ao nível técnico.

Também Manuel Augusto, secretário de Estado angolano das Relações Exteriores, considerou que a cimeira é o “ponto alto” da relação entre os dois países, este ano.

Em declarações aos jornalistas após um encontro com Almeida Leite, no início da semana, o governante disse esperar que, no decorrer da cimeira, os Presidentes José Eduardo dos Santos e Cavaco Silva possam “marcar uma nova etapa nas relações entre os dois países”.

Contudo, a presença dos dois chefes de Estado na cimeira bilateral não é ainda uma certeza, ainda que essa seja a situação “ideal”, soube o SOL. Em causa está o facto de este modelo de cimeira ser ‘pioneiro’ e levantar questões protocolares que os dois países estão a tentar resolver. Em regra, as cimeiras bilaterais são ao nível de primeiros-ministros, ou seja, chefes de Governo, mas em Angola este é simultaneamente o Presidente. Deve, portanto, ter como interlocutor privilegiado Cavaco Silva, e não Passos Coelho. A solução, contudo, “deverá ser encontrada”, porque a cimeira é do interesse de ambos os países ao mais alto nível.

Nada de novo para a oposição

A reacção dos partidos da oposição à entrevista de José Eduardo dos Santos não se fez esperar. “Para ser honesto, a entrevista não traz nada de novo. Não traz uma reflexão de vulto sobre os problemas actuais que Angola vive”, considerou Alcides Sakala, o porta-voz da UNITA.

Para Sakala, José Eduardo dos Santos “não se assumiu como presidente de todos os angolanos, porque falou mais na perspectiva do MPLA”.

Já para o líder da CASA-CE, Abel Chivukuvuku, “o Presidente já não tem resposta para os desafios a que Angola faz face e, por isso, deve abandonar o poder”. “Chegou o tempo de sair, porque já não está à altura dos desafios do futuro”, disse, acrescentando que, “a mudança será inevitável em 2017 ou antes disso”.

*com Carlos Ramos

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