Daniel Oliveira –
Expresso, opinião
Não sei, nem me
parece especialmente relevante, se todo o circo montado por Paulo Portas tinha
como objetivo este final. Se tinha, o seu cinismo e maquiavelismo
ultrapassa ainda mais o que já se supunha. Se não tinha, a sua
inconsequência e imponderação eram um segredo bem guardado. A verdade é esta:
toda a encenação resultou num extraordinário reforço do CDS no governo.
Paulo Portas fica
com a coordenação da economia, o que terá de incluir o dinheiro do QREN -
única fonte de financiamento público que sobra para o investimento -, com as negociações
com a troika - o verdadeiro ministério das Finanças - e ainda a
suposta reforma de Estado - que corresponde, basicamente, aos cortes
de despesa pública. Fica com o deve e com haver. Será, basicamente, na
companhia do novo ministro da Economia do CDS, o novo primeiro-ministro.
Esta sua nova
posição levanta dois problemas ao governo. Nenhuma coligação pode ser realmente dirigida
pelo seu partido mais fraco. Um país não pode ser dirigido por alguém que nem 12% dos
votos conseguiu. Trata-se de um subversão democrática que duvido que o PSD
suporte por muito tempo. E, apesar de ter reforçado a sua posição interna na
coligação e, por isso, no próprio CDS, Paulo Portas saiu muito
fragilizado, junto da opinião pública, em todo este processo. A imagem de
irresponsabilidade e oportunismo passou a estar colada à sua figura de forma,
essa si, irrevogável.
Tudo isto seria
resolvido se Portas conseguisse cedências extraordinárias da troika,
uma reforma do Estado aceitável pelos parceiros sociais e uma política
económica que contrariasse a espiral recessiva em que vivemos. Ou seja, se
Paulo Portas conseguisse não um, não dois, mais três milagres em simultâneo.
Eu, homem de pouca fé, duvido. Caso contrário, Portas será o novo Gaspar:
o bode expiatório de todas as desgraças. Com a diferença de ter, ao contrário
do "finado" ministro, de segurar o reduzido eleitorado do CDS.
Não tenho dúvidas
que Portas tentará fazer uso do seu talento para transformar pequenas
conquistas simbólicas em enormes sinais de mudança. Isso funcionava quando era
ministro da Defesa ou dos Negócios Estrangeiros. Agora são coisas palpáveis e
um pouco mais relevantes que estão em causa. E ele deixará de poder estar com
um pé dentro e outro fora do governo. Deixará de poder culpar Gaspar ou
Passos por cada desastre. E isto em vésperas da 8ª avaliação, que vem com
propostas lunáticas da troika (como a redução do salário mínimo para jovens) e
uma realidade cada vez mais distante da prometida recuperação. E isto num
governo que é uma ruína e em que nenhum português, depois da semana que passou,
alguma vez voltará a acreditar. E isto com ministros do PSD, a começar pelo
primeiro-ministro formal, a querer minar um pouco mais a sua credibilidade.
Esta é a única
vitória de Passos Coelho: Portas terá, finalmente, de dividir com ele os
espinhosa coroa de todas as derrotas e desgraças. Sim, Passos afunda-se. Mas
sabe que levará Portas com ele. O País ganha alguma coisa com isto? Nada.
Tem um governo mais desacreditado no interior e mais fraco para o exterior.
Esta vitória de
Portas é uma derrota de todos. É a imagem acabada da degradação de um governo,
de um programa de "ajustamento" (em que já nem o FMI se revê mas que,
como de costume, os seus funcionários continuarão a aplicar com notável zelo)
e, temo, da própria democracia. Tudo porque o País não pode aguentar a
instabilidade que provocariam eleições. Como se pudesse haver situação mais
instável do que esta.
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