Carvalho da Silva –
Jornal de Notícias, opinião
No argumentário
expandido pelo Governo foi insistentemente dito que o regresso aos mercados
aconteceria a 23 de setembro de 2013, que as eleições alemãs iriam modificar as
políticas europeias e, mais recentemente, tentam convencer-nos da
sustentabilidade dos sinais de inversão de ciclo económico. Tudo isto não passa
de tábuas imaginárias a que estes nadadores em apuros se tentam agarrar. O
Governo esbraceja mas já não nada.
O que vamos
sabendo, do receituário da troika, é que não há flexibilidade na aplicação do
seu programa e que, a existir, essa flexibilidade poderia não significar menos
sofrimento para os portugueses. Dos "mercados" não vem alívio, antes
pelo contrário, espremer-nos-ão o mais que puderem, inclusive em nome da falta
de estabilidade política. Da Alemanha não sopra bom vento e muito menos há
sinais de justiça e de solidariedade para com os povos que aquele país tem
explorado. Um segundo resgate, ou o que lhe queiram chamar, parece vir a
caminho.
Neste contexto,
qual o significado daquela outra formulação, "o período pós-troika"?
Que período será esse em termos de políticas que quererão impor aos
portugueses?
O chamado novo
fôlego do Governo durou pouco. Não é por trocar Gaspar por cópias em material
swap que passou a ser possível fazer o que Gaspar acabou por perceber não poder
ser feito: resolver com mais pobreza um endividamento galopante.
O endividamento
crescente, uma estrutura produtiva cada vez mais débil e o empobrecimento
tornam claro que a dívida portuguesa é impagável. Esta constatação
aprisiona-nos a elevadas taxas de juro dos títulos da dívida.
O
primeiro-ministro, ao atacar o Tribunal Constitucional e afirmar ser provável a
necessidade de um segundo resgate tem objetivos muito concretos:
desresponsabilizar-se face à crise económica e social que estamos a viver;
justificar as privatizações, os cortes nos serviços públicos e nas prestações
sociais que surgirão na proposta de Orçamento do Estado (OE) para 2014; tentar
consolidar a ideia de inevitabilidade da continuação da atual estratégia de
governação.
Estamos às portas
de se voltar ao ponto em que estávamos antes do verão, quando o Governo esteve
de saída. A evolução da situação do país e das condições de vida dos
portugueses, as trapalhadas em que o Governo se envolveu, confirmam quão
importante teria sido a demissão deste Governo no fim da primavera.
Aí perdeu-se uma
oportunidade de convocar os portugueses para decidirem em eleições o rumo e o
programa político a adotar. Os defensores das inevitabilidades e da não
existência de alternativas querem negar a força do querer de um povo. É preciso
abrir de novo essa oportunidade. Precisamos de um governo que faça frente à
chantagem dos "mercados" e dos instalados no poder, e gere sinais de
esperança no futuro.
A abertura de uma
oportunidade de mudança tem de ser feita contra a descrença, contra o
isolamento e a solidão. Há que lançar mão do diálogo e da convergência entre
quem quer contribuir para a mudança, aprofundar propostas políticas
alternativas, utilizar o voto e o direito de manifestação. E fazer da discussão
do OE um tempo de forte combate político.
Amanhã as eleições
são autárquicas, mas nem por isso menos consequentes no plano nacional. É
preciso votar. Não ceder à tentação da abstenção ou da anulação do voto que
acaba por eleger tanto como o voto expresso.
Estão convocadas
manifestações, pela CGTP-IN, para o dia 19 e pelo movimento Que se Lixe a
Troika para o dia 26 de outubro. É necessário vencer o desânimo, participar e
mobilizar para a participação. Fazer grandes as manifestações e transformá-las
num autêntico referendo que condene a brutal austeridade e empobrecimento que
nos destroem como povo e como país soberano.
Temos de arredar do
poder um Governo escandalosamente subserviente, um Governo que destrói emprego,
o valor do trabalho, os sistemas de educação e saúde, que nos faz regredir da
cidadania social para a caridadezinha. Temos de dizer não à ocupação permanente
de Portugal.
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