Cristina Mestre – Voz da
Rússia
A Comunidade de
Países de Língua Portuguesa (CPLP) pode vir a transformar-se num grupo de
Estados com objetivos muito diferentes daqueles para que foi criada em 1996.
Foi recentemente
recomendado, numa reunião cúpula em Luanda, a adesão de um país-observador, a
Guiné Equatorial, como membro efetivo da organização, a ocorrer na próxima
cúpula deste ano em Díli.
A CPLP reúne os
países lusófonos, “nações irmanadas por uma herança histórica, pelo idioma
comum e por uma visão compartilhada do desenvolvimento e da democracia”,
conforme indica o site da organização.
De acordo com os
seus estatutos, “a CPLP é regida pelos seguintes princípios: primado da paz, da
democracia, do Estado de Direito, do bom governo, dos direitos humanos e da
justiça social”.
Se assim fosse,
seria muito bom. Ora a adesão a Guiné Equatorial porá em causa estes mesmos
princípios.
O semanário português
Expresso desta semana escreve: “Aos comandos da Guiné Equatorial está, há 35
anos, Teodoro Obiang Nguema Mbasogo, considerado um dos piores ditadores
africanos (…) É um país onde, segundo uma inspeção da ONU, a tortura é o
meio normal de investigação, onde mutilações, violações, choques elétricos são
prática comum, onde falta justiça, liberdade de expressão e informação e onde
sobram execuções extrajudiciais e raptos pelo Governo. Obiang foi, à semelhança
dos déspotas Idi Amin e Bokassa, acusado de praticar canibalismo contra
inimigos”.
O que de pior se
pode apontar aos mais mal governados países africanos (e não só) está presente
na Guiné Equatorial: Má governo (78% com habitantes abaixo do limiar de pobreza
não obstante o país ser um dos maiores produtores de petróleo de África, metade
da população sem acesso a água potável ou eletricidade); corrupção
generalizada, (o país foi incluído entre os 12 Estados mais corruptos do
mundo); repressão e utilização da tortura; culto da personalidade (o presidente
é chamado “Deus do país”); democracia de fachada (delegados eleitorais da
oposição tiveram de assinar, com uma arma apontada à cabeça, o relatório da
contagem oficial de votos nas últimas eleições).
É este país que os
países lusófonos vão aceitar na organização e considerar membro de pleno
direito?
Até agora, Portugal
tinha uma posição “claramente negativa” sobre a adesão da Guiné-Equatorial à
CPLP enquanto não fosse abolida a pena de morte, que existe naquele país. De
fato, a Guiné Equatorial está longe de obedecer aos parâmetros democráticos,
para além de a língua principal na Guiné Equatorial ser o castelhano e não o
português (a língua de Camões foi imposta pelo presidente como segunda língua
oficial em 2011, mas ninguém a fala).
Mas, no passado dia
20 de fevereiro, o ministro português dos Negócios Estrangeiros, Rui Machete,
parece ter mudado de opinião. Segundo foi informado pelo próprio, a Guiné
Equatorial terá aprovado “há três dias um instrumento legal que suspende a pena
capital”.
A moratória sobre a
pena de morte era uma das condições, para além da promoção do uso da língua
portuguesa, para o ingresso da Guiné Equatorial, estabelecidas pela organização
lusófona na cúpula de Luanda, em 2010.
O mais caricato é
que a Guiné Equatorial não mudou a sua legislação para cumprir os critérios. A
prometida democratização é uma miragem. Tudo se limitou, segundo o ministro Rui
Machete, a “uma garantia solene feita pelas afirmações do ministro das Relações
Exteriores da Guiné Equatorial na reunião de Maputo”, realizada no dia 20 deste
mês.
Pelo visto, para
aceitar um país despótico, basta a garantia oral de um dos seus ministros.
A questão, no
entanto, tem uma explicação mais prosaica.
Uma empresa estatal
da Guiné Equatorial vai investir 133 milhões de euros no Banif, um banco
português em dificuldades, dirigido pelo ex-ministro dos Negócios Estrangeiros
Luís Amado. Pelo visto, a pressão diplomática para a entrada da Guiné
Equatorial tem a ver com negócios e petróleo. Daí virá a súbita mudança de
opinião do atual ministro português. Não importa a origem do dinheiro, é
preciso que seja “injetado”. O governo português parece não ter resistido à
força dos interesses económicos.
Aparentemente, os
petro-Estados mandam mais hoje na CPLP do que mandavam em 1996.
Muitas vozes em
Portugal dizem que a entrada da Guiné Equatorial na CPLP viola claramente as
regras da organização em termos de liberdade, democracia e direitos humanos,
sendo um desrespeito pelos povos que a organização representa.
O regime ditatorial
de Teodoro Obiang precisa da CPLP para ter reconhecimento internacional. Não
havendo outros motivos de credibilidade, esta pode ser comprada.
Nós, cidadãos, não
nos conformamos com isso. Portugal deve utilizar o seu direito de veto e
impedir que a Guiné Equatorial adira à CPLP, porque há princípios que unem os
países lusófonos que não queremos que sejam postos à venda.
1 comentário:
PARA AZAR DOS SAUDOSISTAS DO IMPÉRIO PORTUGUÊS, AS CARAVELAS TINHAM O VENTO COMO FORÇA PARA SE PODEREM DESLOCAR... E O PETRÓLEO SÓ VIRIA A SER APROVEITADO MUITO MAIS TARDE, QUANDO A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL ORIGINOU O USO DOS MOTORES A COMBUSTÃO!
POIS AGORA, OU ACEITAM O PETRÓLEO TAL QUAL ELE É... OU A CPLP LEVA-A O VENTO!
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