A propósito das
questões que a perspectiva da independência da Escócia levantaria, uma
entrevista polémica. Tariq Ali reflecte a partir de uma grelha de análise que
odiario.info não compartilha em muitos aspectos. Isso não impede que os seus
pontos de vista representem uma interessante crítica das forças em presença.
JF: Os políticos
trabalhistas escoceses afirmam-se internacionalistas, e a miúdo acusam os
partidários da independência de provincianismo e de nacionalismo mesquinho.
Como internacionalista que vive em Londres, porque apoia a independência?
TA: Porque não
aceito quando os New Labour ou coalizões semelhantes proclamem que são eles os
internacionalistas. Essencialmente o seu internacionalismo significa subordinar
totalmente o Estado britânico aos interesses dos Estados Unidos. Esses fizeram
da Inglaterra um estado vassalo no Iraque, no Afeganistão, e em muitas outras
coisas. Não é sequer um grande segredo.
Assim desafio qualquer ideia que afirme que os governos do Estado britânico foram
internacionalistas. Já há muito tempo que o não são. Temos de tirar isso da
cabeça.
Em segundo lugar: uma Escócia independente, um Estado pequeno, alberga muito
mais possibilidades de um internacionalismo real e genuíno. Isso significa
estabelecer vínculos directos com muitos países e povos. Os noruegueses, por
exemplo, tanto nos seus meios de comunicação como na sua cultura estão ligados
a países de todo o mundo. Estive na Noruega na semana passada, numa convenção
do Médio Oriente, presidida por uma diplomata norueguesa. Ela afirmou que
acabava de passar dois anos na cidade palestiniana de Ramallah, e sabia tudo
sobre o assunto. Portanto, o facto de ser pequeno não significa que vamos
tornar-nos provincianos. Pelo contrário, pode supor-se o contrário.
JF: Muitos
políticos laboristas também chamaram ao Partido Nacionalista Escocês populista
neoliberal, anti classe trabalhadora e outros. Como vê o nacionalismo escocês?
TA: O partido
nacionalista escocês transformou-se. Quando surgiu era um partido conservador
com «c» maiúsculo e um pouco arcaico. Mas isso mudou com o grupo dos 79. Embora
muitos dos seus membros fossem expulsos de início, incluindo Alex Salmond,
estão agora no governo. Além disso, o Partido Nacionalista Escocês tem
recrutado muita gente, incluindo partidários trabalhistas e os primeiros
membros de grupos de extrema-esquerda. Pessoalmente não estou de acordo com o
seu programa social e económico, creio que é demasiado débil. Noutros aspectos,
também tenho certos receios.
Mas, creio que definitivamente apoiaria o voto ao «sim», apenas pela razão de
que o povo da Escócia tem o direito democrático à autodeterminação do seu
próprio futuro. Esta é a primeira vez que de facto lhe pedem para votar sobre
este problema. A União que se desenvolveu através do oportunismo, da corrupção
e do suborno em 1707 não foi resultado de um voto democrático, como todos
sabemos. É essa a razão por que tiveram de lutar na batalha de Culloden. Esse
foi um episódio decisivo da história escocesa, porque essa derrota em Culloden
criou a União tal como a conhecemos, algo totalmente controlado pela
Inglaterra.
O Partido Nacionalista Escocês tenta gora romper com essa tradição, assim, de
modo efectivo pede aos escoceses que declarem a independência que já tiveram. E
creio que seria muito melhor para a Escócia e até para a Inglaterra. Na minha
opinião o Novo Labour está totalmente corrupto, em todas as suas frentes
social, politica e económica. O New Labour é o novo Tartan Tories.
Isso não quer dizer que não deva discutir-se com o Partido Nacionalista
Escocês, que não deva debater-se e estou convencido de que as pessoas das suas
fileiras o farão. E a aliança pela Independência Radical desempenha um papel
importante em tudo isso. Fui convidado a participar numa reunião a favor do
«Sim» organizada pelo Partido Nacionalista Escocês em Kircaldy em Junho, o que
farei.
Estou totalmente a favor da independência da Escócia e sempre estive, apesar
dos desencontros com o Partido Nacionalista Escocês. A ideia de que se não
possa estar em desacordo com o Partido Nacionalista Escocês e apoiar a
independência é absurda.
JP: Poderíamos
falar um pouco sobre as possíveis implicações globais de uma ruptura com a
Inglaterra?
TA: Creio que, em
concreto, seria muito positivo para a Inglaterra, a qual foi sempre o factor
dominante da União. Abrirá um novo espaço político. Pode ser que no início não
beneficie os congressistas, mas pelo menos permitirá discutir sobre política
sem a carga do passado. Principalmente: será bom para a democracia inglesa, já
que se encontra num estado bastante triste.
Segundo é que ajudará os unionistas mais fanáticos de Inglaterra a compreender
que o jogo terminou, e que têm de alguma maneira de abandonar as pretensões
imperialistas. Essas pretensões persistem apesar de serem um absurdo no
sistema, e só funcionam por cortesia dos Estados Unidos. E quem sabe? Talvez
abra de novo um espaço para a independência britânica. Ou seja uma
independência britânica real, o que não acontece desde 1956.
Veremos o que se passa mas duvido muito que os efeitos sejam negativos. Também
acho que uma Escócia independente, que desempenhe um papel independente na
política mundial e na Europa terá o seu impacto na Inglaterra.
Outra coisa que vale a pena dizer é que isto só pode fazer-se com o consentimento
dos escoceses. Nada pode forçá-lo. Portanto não pode haver qualquer discussão
sobre coacções. A campanha do medo e de intimidação que Londres está a brandir
e que é absolutamente patética, e espero que os escoceses lutem contra ela.
Lembro-me quando Tony Blair veio na sua última visita à Escócia e declarou: «se
votarem pela independência todas as famílias perderão 5000 libras por ano».
Quem inventou esse número? Algum burocrata em Whitehall que queria algo para
assustar os escoceses. E ainda há poucos dias Danny Alexander repetiu esses
mesmos números absurdos. Fazem isso para assustar as pessoas, afirmando que os
seus níveis de vida irão baixar. Mas não há razão para baixarem se a economia
funcionar de forma adequada.
JF: Acha que as
elites britânicas estão preocupadas com a perspectiva da independência?
TA: Algumas secções
devem estar, porque o vêem como uma bofetada nas pretensões britânicas. Mas
também julgo que pode existir uma parte da elite que pode dizer: «isso pode
poupar-nos dinheiro, cortar os subsídios, etc. e de qualquer forma a Escócia
não produz grande riqueza. Essa é a parte da elite que acha que a única maneira
de continuar para a frente é efectivamente vender a economia britânica e as
cidades do sul aos ricos, a oligarcas de várias nacionalidades, Ucrânia,
Rússia, Arábia, etc. que dominam extensas partes dos mercados financeiros de
Londres actualmente. A essa parte da elite, que acha que é esse o futuro, nada
lhes interessa, apesar do que dizem.
JF: Acha que os
unionistas estão a fazer uma tempestade sobre a questão da união da moeda?
TA: Creio que estão
a exagerar. Mas, creio que Alex Salmond porá as cartas. «Se se comportarem de
um modo tão mesquinho e ruim, então a Escócia só terá como opção criar a sua
própria moeda. De facto, a moeda escocesa já é diferente da inglesa. A Escócia
imprime essa moeda. E vamos imprimir a nossa própria moeda e se nos tirarem a
influência, buscaremos outros caminhos. Creio que Salmond deve actuar com muita
cautela neste caso e mostrar as suas cartas. Não deveria ter medo.
JF: Posso perguntar
algo mais sobre o elemento histórico disso tudo? Porque acha que a
contra-revolução neoliberal teve tanto êxito em Inglaterra?
TA: Bom. Não diria
que foi um êxito. Ou se o foi, será devido em grande medida a que os sindicatos
e o partido laborista não assumiram qualquer luta quanto a isso. Vejamos na
América do Sul, mesmo pequenos países desse continente que enfrentaram o
neoliberalismo e que se separaram dele a vários níveis, fizeram-no graças a
enormes movimentos sociais. Infelizmente, o movimento sindical britânico
sentiu-se tão derrotado depois da greve mineira que simplesmente o abandonaram.
Não lutaram, não se digladiaram, já que o partido laborista se assassinara a si
próprio ao transformar-se no New Labour, Tony Blair transformou-se no núcleo
duro da liderança tatcherista e continuou na mesma velha senda de Tatcher.
Assim pois, quanto a oferecer alguma alternativa a essa gente, os New Labour e
os conservadores colaboraram ao afirmar que não houve qualquer alternativa. E
as pessoas apoiaram-no, principalmente após o crack de Wall Street em 2008. O
que realmente acontece é que não surgiram alternativas.
Se a Escócia conseguir a independência e os seus lideres tiverem coragem,
poderá romper com o neoliberalismo. Em Inglaterra, não surgiu qualquer força
que lhe faça frente. As pessoas sentem-se derrotadas, desmoralizadas e acham
que aqueles em quem confiaram durante tanto tempo, os traíram. É assim, a
maneira como as pessoas o enfrentam mesmo a direita. O apoio principal do
Partido para a Independência do Reino Unido (UKIP) em concreto é uma forma de
oposição aos jogos efectuados pela elite. É um disparate, porque Farage e
companhia nada oferecem. Mas é essa a escala do desespero. E não existe nada na
esquerda para o enfrentar. Noutros lados da Europa, existem choques a partir da
esquerda. Mas não na Inglaterra. Não diria que as pessoas os aceitam, diria que
não se lhes mostrou qualquer alternativa por parte de nenhum grupo ou pessoas.
JF: Esta semana vai
falar sobre «desmantelar» o Estado britânico. Algumas pessoas perguntam o que
quer dizer com isso.
TA: Quero dizer que
o Estado britânico, criado pela União no século XVIII, nunca foi efectivamente
posto na encruzilhada. O único escrito da constituição britânica é o Tratado da
União de 1707. Agora, aquilo por que os escoceses vão a votos — se, como
espero, disserem «sim» é o desmantelamento do Estado britânico tal como ele é
agora. O que sucederá depois se verá. Mas, certamente, com a separação da
Escócia, o Estado britânico desmantela-se.
JF: Muitos
socialistas negariam que haja algo especialmente tóxico sobre o Estado
britânico, e diriam que todos os estados capitalistas são maus. Claro, que
sabemos que rivais como a França, Alemanha e Itália também têm os seus
problemas. Acha que o Estado britânico tem alguma característica distinta?
Significa isso que temos de enfrentá-lo de um modo diferente?
TA: Por um lado,
pode dizer-se que a economia capitalista desses Estados é mais ou menos a
mesma. Mas esses Estados têm as suas peculiaridades. No caso de Inglaterra,
como indicou o meu velho amigo Tom Nairn, essas peculiaridades vivem no âmbito
da sátira. A preservação de uma coroa, mantida através do internacionalismo
monárquico da casa de Hannover, que encontrou dirigentes para Inglaterra quando
se lhes acabaram os naturais. Criar e manter esta monarquia é uma farsa. A
Câmara dos Lordes é também inteiramente antidemocrática. Tudo isso dá ao Estado
britânico um carácter arcaico. O facto de o absurdo de Downton Abbey ser
incrivelmente popular é um sinal do que significa. Tudo isso levou em
Inglaterra à deferência para com o líder, o colocar-se à sombra, o que também
sucede na Escócia, no sentido de que a família real tem uma casa em Balmoral
quando se trata de falar da Escócia.
Tudo isto obstou à modernização da Inglaterra. O Estado britânico tem as suas
características. E acho que é algo com que temos de romper. Mas é impossível
romper de outro modo, portanto a independência da Escócia seria um bom começo.
Claro que quando os noruegueses decidiram separar-se da Suécia em 1905,
fizeram-no por razões muito semelhantes, queriam o seu próprio país e estavam
fartos de serem dominados por Estocolmo. Passou-se de forma relativamente
amistosa. Podem acontecer coisas assim.
Pode argumentar-se que desde que o capitalismo domine em toda a parte, nada
deveria ser feito. Mas isso seria um passo atrás para a passividade total e o
fatalismo.
JF: A Grã Bretanha
perdeu o seu império há muitas gerações, mas é ainda a Inglaterra imperialista?
TA: Bom, trata-se
de um subimperialismo, contraído com o único império existente hoje em dia, os
Estados Unidos da América. Mas outros países albergam ainda pretensões
imperialistas. Alguns tratam de reviver o passado, como Putin está a fazer na
Ucrânia. Outros fingem-no e de facto levam uma carga demasiada porque estão
amarrados ao nome de império existente. Se olharmos os grandes impérios que já
passaram, os japoneses, os alemães, os franceses, os britânicos, onde estão
agora? Estão amarrados aos Estados Unidos da América. Não podem fazer
absolutamente nada sem permissão de Washington. Os Estados Unidos são afinal o
único império.
JF: Mencionou o mau
estado em que se encontra a democracia inglesa. Preocupa-o o auge das políticas
de direita populistas na Inglaterra? Porque acha que têm agora tanto êxito na
Inglaterra?
TA: Bem, tem êxito
porque não há mais nada. Efectivamente, as duas questões sobre as quais versam
as campanhas do UKIP são a União Europeia e a imigração. Estão ligados, porque
a imigração que atacam, em grande medida, é a que provém da União Europeia.
Infelizmente, estas são demandas populares em toda a Europa neste momento
devido à crise económica.
De resto, na minha opinião, a esquerda tem sido muito débil ao não se adiantar
com fortes críticas à União Europeia e seu funcionamento, porque tem medo de
ser considerada antieuropeia. Mas não é antieuropeu dizer que a União Europeia
está totalmente corrupta, é burocrática, antidemocrática, dirigida por elites e
que é, efectivamente, uma união de banqueiros. Isso é um facto. Mas a esquerda
não está a fazer campanha, excepto na França.
Existe assim uma situação em que um partido emerge das entranhas do velho Tea
Party e aparece com todas essas coisas e os grupos fascistas que começam a
fazer a sua entrada transformaram-se numa força política cujo principal
propósito é pressionar os Conservadores e separá-los da Europa. Claro que
tiveram sucesso na hora de empurrar todos os partidos em Westminster para a
direita no caso da imigração. Daí estarem no auge.
Mas, creio que há um problema mais profundo, argumentado por Peter Mair, um bom
politólogo, no seu livro póstumo, Rulling theVoid, (Governar o Vazio).
Argumenta, correctamente na minha opinião, que o que temos agora no mundo
capitalista avançado é uma situação em que a classe política não representa as
necessidades ou os pontos de vista da população. Isto ajuda a uma crescente
alienação da política como tal. Consequentemente, o défice democrático na
Inglaterra é muito forte. É enorme. E esta é também uma das razões pelas quais
os escoceses deveriam agarrar esta oportunidade e fugir do cárcere em que a
Inglaterra se converteu, desenvolver as suas próprias políticas e discutir
abertamente a maneira de seguir em frente. Não deveriam aspirar a uma versão
menor do neoliberalismo inglês.
JF: Muita gente
está preocupada com as implicações, se a Escócia se vai, com o futuro dos
governos trabalhistas de centro esquerda no resto da Inglaterra. No contexto do
UKIP, do populismo crescente, das revisões de Collins e outras, qual é o futuro
da social-democracia em Inglaterra?
TA: Expressei
abertamente a minha opinião sobre este assunto desde o aparecimento do New
Labour. Aceita-se de forma generalizada que não existe qualquer diferença
fundamental entre o centro-esquerda e o centro-direita na política britânica,
nem na francesa nem na alemã.
Efectivamente, o que temos é um extremo centro. «Extremo» porque apoia guerras
e ocupações. «Extremo» porque declara guerras contra a sua própria gente, tenta
culpabilizar as vítimas pelos crimes cometidos concebidos pelas elites.
«Extremo» porque se prepara para desmantelar direitos democráticos fundamentais
com o fim de prevenir dissensões nas discussões sobre o estado secreto.
Esse extremo centro cerca tanto o centro-esquerda como o centro-direita. Fazem
algum ruído quando se encontram na oposição, mas quando estão no poder, fazem o
mesmo. Até hoje, a primeira bancada dos New Labour não foi capaz de dizer que
se separaram das políticas fundamentais da coalizão em assuntos de economia.
Não podem dizê-lo, porque são as suas políticas. Não são diferentes.
Daí que toda essa conversa sobre a debilitação das forças de esquerda no que
ficará do Reino Unido é uma cortina de fumo. Uma cortina para quê? Para nada.
Não mantêm qualquer relação com a realidade. Os sindicatos são débeis, a última
greve geral convocou-se em 1926, portanto a noção de que se está a
transaccionar a unidade da classe trabalhadora escocesa e inglesa não tem
qualquer sentido. Em qualquer caso, essa unidade pode exercer-se a partir de fronteiras
independentes. Os socialistas sempre defenderam a unidade de uma classe
trabalhadora internacional, até que a primeira guerra mundial mostrou a força
do nacionalismo do tipo retrógrado, que também uniu os trabalhadores.
Assim em minha opinião nenhuma dessas ideias é séria. O núcleo duro unionista
tem um argumento forte ao afirmar que Deus, a igreja e a monarquia são os
factores que unem a União e que assim tem sido desde 1707, e que não deveríamos
quebrar isto e que os escoceses que o querem fazer serão castigados. Isso é
pelo menos uma perspectiva consistente, mas completamente anacrónica.
JF: Algumas pessoas
argumentam que a Escócia e a Inglaterra se afogariam depois da independência.
Também falam de impostos corporativos e outras coisas. Acha que as coisas
realmente melhorariam se a Escócia conseguisse a independência?
TA: Bom, acho que
se firmaram as bases para que as coisas melhorem. Se melhoram ou não depende de
dois factos, se os líderes do Partido Nacionalista Escocês estão preparados
para ir mais além em termos de criar uma social-democracia escocesa ou não.
Espero por Deus que estejam. Em segundo lugar e mais importante, depende de se
numa Escócia independente haverá o desejo das pessoas participarem de um modo
mais activo na política a todos os níveis. Não apenas através das instituições
que supervisionam e observam a nova democracia escocesa. Necessitam de
participar e falar alto e claro quando as coisas não vão bem. Acho que será
esse o efeito. A esquerda na Escócia deve interpretar o seu papel.
JF: Que acha do
modelo nórdico e de outras variantes do capitalismo? Pode a Escócia basear-se
nessas ideias?
TA: Bom, falamos de
um período em que o sistema capitalista triunfou e as ideias sobre o socialismo
sofreram uma enorme derrota global. Estamos a viver um período de transição
estranho, que pode durar até ao final do século. Não deveríamos excluir essa
possibilidade. Assim, temos que trabalhar com o que existe, e ver como o
capital nos seus piores aspectos pode regular-se, como um Estado pode regular-se
de maneira a trabalhar em benefício dos trabalhadores… na verdade era este o
propósito do Labour em 1945, e esse programa era bom. Realmente mudou as
condições de vida das pessoas e até hoje, eu não vivo na Escócia, mas as
pessoas dizem-me que o sistema educativo na Escócia é melhor, em comparação com
o sistema educativo inglês. É aí que uma Escócia independente poderia marcar a
diferença. Se souber dirigir a sua economia, o seu petróleo, aprender a lição
com a Noruega, que investiu a riqueza do seu petróleo, de um modo muito sábio.
Como resultado goza de um estado de bem estar social-democrático que
praticamente o mundo inteiro inveja. Quando ali estive, disse-me um amigo
norueguês: «Não te verei até Outubro, porque vou estar fora seis meses e eu respondi-lhe
«porquê? Que se passa?” E ele confessou-me «a minha mulher vai ter uma criança,
e segundo a lei norueguesa, os pais têm uma licença de seis meses”. Fiquei
surpreendido, porque sabia que existia algo assim, mas sem pormenores.
Portanto, sentimos que de algo modo, eles vivem melhor sob governos
social-democratas, ou sob consensos que aceitam que certas reformas não têm
preço.
E são os programas de privatização da elite britânica que afundaram o país.
Agora vendem o serviço de saúde. O New Labour deveria lembrar-se. Havia um
artigo do anterior secretário de saúde, Alan Milburn, no Financial Times na
semana passada que discutia sobre o assunto da saúde privada, com a pretensão
de que se trata de uma maneira de salvaguardar a Segurança Social. Foi isto que
gerou aborrecimento na Inglaterra e na Escócia. Foi culpa do New Labour. E
temos que definitivamente quebrar essas políticas e criar uma sociedade melhor.
Não será esta a sociedade socialista com que os nossos socialistas sonharam.
Mas abriria espaço para que pelo menos essas coisas fossem debatidas e as
reformas pudessem ver-se implementadas de tal forma que melhorassem as
condições de vida na Escócia. Não há qualquer razão para que uma Escócia
independente não possa reindustrializar-se e construir uma grande industria de
navegação, com a ajuda de países fora da Europa que estão dispostos. É um
disparate ver apenas o futuro da Escócia com a Inglaterra ou até com o resto da
Europa. Com a imaginação vamos mais longe.
JF: A maior
ansiedade de muita gente é que a Escócia se verá cada vez mais isolada após a
independência. Como pode a Escócia impedir isso? E que tipo de alianças deve a
Escócia construir?
TA: Mas a Escócia
não está já isolada? Eu diria que a Escócia agora está isolada sendo uma parte
da Inglaterra. A Inglaterra não o está, mas a Escócia sim. Portanto esta ideia
do isolamento após a independência está equivocada. O conjunto de alianças que
deveria construir? Para começar, o propósito deveria ser construir alianças com
o bloco escandinavo, particularmente com a Noruega e a Suécia. Acho que seriam
recebidos de braços abertos, para realizar negócios financeiros, turismo,
tratados políticos, etc. O bloco escandinavo é uma possibilidade.
No ano da União Europeia, deveriam lutar pelo direito à expressão de Estados
mais pequenos. A Escócia deveria construir vínculos com repúblicas mais
pequenas no seio da União Europeia, ou até nas áreas no interior da União
Europeia que ainda não são independentes, como a Catalunha.
E porque não
deveria a Escócia ser independente da Inglaterra para manter relações com
países da Ásia ou da África? Por isso acho que os Escoceses têm que ver mais
além. A principal instituição que deveria ser criada, entre outras, seria um
Ministério de Negócios Estrangeiros, um comércio do ultramar, isso seria muito
importante.
Na foto: Tariq Ali
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