Ana Sá Lopes –
jornal i, opinião
O desemprego, essa
trituradora de cidadãos, é um mal necessário deste PREC
Apesar de Pedro
Passos Coelho 2010 considerar em entrevista a este jornal ser insustentável
manter um governo em que um primeiro-ministro mente, Passos Coelho 2014 não só
nos tem mostrado como isso lhe parece perfeitamente aceitável (agora é ele o
mentiroso, o que muda tudo), como conta com o beneplácito de dois partidos, PSD
e CDS, do Presidente da República, do presidente da Comissão Europeia, etc. Na
entrevista que deu à SIC Notícias, Passos mostrou como alimenta uma
auto-suficiência esplendorosa, recorrendo a todos os truques possíveis - a
começar pela inacreditável promessa de "desonerar" os salários e
pensões em... 2016. Ora segundo o calendário eleitoral, em 2016 haverá um novo
governo para decidir este tipo de coisas e todas as sondagens indicam que não
será Passos a "desonerar" coisa nenhuma. Passos já está tão habituado
a dizer n'importe quoi que aquilo lhe sai de rajada.
O que faz impressão
no discurso de Passos é que consegue ao mesmo tempo fazer a promessa de
"desonerar" num prazo que já não é o seu - um "sound-byte"
- e anunciar com palavras mastigadas que os cortes serão definitivos. Aquilo
que prometeu que nunca faria - e que o desgraçado secretário de Estado anunciou
em off para ser depois desmentido pelo primeiro- -ministro, que se dizia à
espera de um grupo de trabalho sobre pensões que era afinal totalmente
desnecessário. O governo decidiu tudo sozinho e o grupo de trabalho serviu de
verbo de encher e de humilhação aos seus membros.
Depois há aquele
momento inacreditável em que o primeiro-ministro fala no desemprego - ou é
obrigado a falar nisso. Tudo na forma, no tom de voz, no facies, evidencia como
o principal problema do país é para o primeiro-ministro o menor dos seus
problemas. O desemprego, essa trituradora de cidadãos, é um dano colateral, uma
explosão provocada por fogo amigo, um mal necessário do processo revolucionário
em curso que arrasará os resquícios do outro processo revolucionário em curso
que marcou Portugal em 74-75.
As classes sociais
estão reduzidas a duas: os amigos do governo, as grandes empresas amigas do
governo, com os bancos amigos do governo no topo da escala. Estes são os
verdadeiros "direitos adquiridos" em que o governo não ousa tocar, porque
são os seus "direitos adquiridos", aquilo que lhes garante o futuro
pós-governamental. Os outros somos nós, os pensionistas, os funcionários
públicos, os servos da gleba.
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