segunda-feira, 26 de maio de 2014

ELEIÇÕES – PRIMEIRAS NOTAS



Tomás Vasques – jornal i, opinião

O PS ganhou, os partidos de esquerda têm mais de metade dos votos e Marinho e Pinto pode baralhar os resultados das legislativas

1 - As eleições realizadas ontem foram para o Parlamento Europeu. Mas só formalmente. À excepção dos próprios candidatos, dos vários partidos concorrentes, e seus familiares mais próximos, a que se deve acrescentar Marcelo Rebelo de Sousa, o qual nos informou que ia votar para eleger Jean-Claude Juncker presidente da Comissão Europeia, não deve ter havido mais portugueses a deslocarem-se às urnas de voto com o objectivo de eleger os vinte e um deputados portugueses a enviar para Bruxelas. A "União Europeia" é uma "entidade" cada vez mais longínqua e autoritária, completamente desligada da vida e dos anseios dos seus cidadãos. Quem exerceu o seu direito de voto, e cada vez são menos a fazê-lo, tais são as desilusões, senão mesmo aversões, que atingem o regime democrático, foi exprimir o seu apoio ou a sua condenação às políticas executadas, nos últimos três anos, pelo governo português. E, por isso, os resultados eleitorais só podem ser interpretados como um julgamento político deste governo.

2 - Não conheço, no momento em que escrevo, os resultados definitivos, mas apenas projecções. Ressalvada desde já qualquer hecatombe não projectada, o que nunca aconteceu, a primeira leitura que se deve fazer é que os portugueses continuam um povo de brandos costumes. Face ao empobrecimento que lhes bateu à porta, nem Marinho e Pinto se aproximou dos 30% de Beppe Grillo, na Itália (apesar de constituir a grande surpresa destas eleições ao ultrapassar o obtido pelo Bloco de Esquerda); nem o PCP ou o BE discutiram, voto a voto, a vitória nestas eleições, como o Siryza, na Grécia; nem sequer a coligação PSD/CDS--PP desapareceu do mapa partidário, como quase aconteceu aos socialistas gregos, depois das duríssimas medidas de austeridade que impuseram no seu país. Nem temos uma extrema-direita organizada que se aproveite do descontentamento, como a Frente Nacional, em França. Não houve nenhum terramoto, nem o rotativismo que sustenta o regime foi sangrado de modo a produzir rupturas significativas a breve prazo. A segunda leitura tem a ver com o crescente e perigoso desinteresse dos portugueses pela democracia traduzido numa abstenção a roçar os 65%. A sistemática falta de palavra, sem vergonha, nem decoro, no cumprimento de promessas por parte dos candidatos e a pobreza das campanhas eleitorais, alimentada pelas estranhas decisões da Comissão Nacional de Eleições, próprias de quem está empenhado em impedir debates televisivos entre os principais candidatos, não podem conduzir a outro resultado.

3 - Posto isto, a vitória nestas eleições do maior partido da oposição - o PS -, apesar da margem que o separa da coligação que, nestas eleições, juntou os dois partidos que sustentam o governo - PSD/CDS-PP -, não ser tão confortável quando se previa, significa que a actual maioria no parlamento nacional já não corresponde à vontade dos eleitores, o que lhe retira legitimidade para prosseguir no mesmo rumo. Esta perda de legitimidade não devia deixar o senhor Presidente da República indiferente, tanto mais que a derrota da "maioria" que governa é clara e inequívoca, não atingido os dois partidos coligados 30 % dos votos, menos do que o resultado obtido há 5 anos pelo PSD.

4 - A subida do PCP é significativa, mas relativa. Os comunistas, que controlam grande parte do movimento sindical e que encabeçam a quase totalidade da contestação de rua, não foram suficientemente recompensados eleitoralmente por esse esforço, e mantêm-se acantonados no seu canto, sem arejar o regime. Nem beneficiaram, em pleno, da perda de eleitores do Bloco de Esquerda, que entrou em fase de sobrevivência.

5 - Estas eleições constituíram o ensaio geral das legislativas do ano que vem. Podemos sublinhar três aspectos: o PS ganhou as eleições; os partidos à esquerda dos partidos no governo recolhem metade dos votos dos portugueses; Marinho e Pinto pode baralhar os resultados das legislativas.

Jurista - Escreve à segunda-feira

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