Pequim,
04 jun (lusa) - A atmosfera no centro de Pequim parecia hoje igual à dos outros
dias, com o calor abafado próprio da época, mas o motorista estava a estranhar
o número de polícias ao longo da principal avenida da cidade.
"Tantos
polícias! Não percebo o que se passa", comentou o taxista ao entrar na
"ChangAn", a larga artéria de mais de dez faixas que atravessa Pequim
de leste a oeste e que passa no topo norte da Praça Tiananmen.
Quando
o passageiro lhe lembrou que hoje é o "Liu Si" ("4 de
junho"), o motorista percebeu logo: "É isso. Já me tinha
esquecido".
O
motorista, nascido e criado em Pequim, não é caso único: cerca de um terço dos
seus compatriotas nasceu depois da sangrenta repressão militar do movimento
pró-democracia da Praça Tiananmen, no dia 4 de junho de 1989, uma data
sistematicamente ignorada na imprensa e discursos oficiais.
"Já
tiramos as pertinentes conclusões acerca do referido incidente", disse um
porta-voz do ministério chinês dos Negócios Estrangeiros ao ser questionado na
terça-feira sobre os acontecimentos ocorridos em Pequim há 25 anos.
Desde
o ataque suicida do passado dia 23 maio, que causou 43 mortos num mercado de
Xinjiang, região de maioria muçulmana no noroeste do país, a China está a
promover uma campanha nacional contra o terrorismo.
Em
Pequim, cerca das 10:00 (03:00 em Lisboa), os sinais do anunciado "reforço
da segurança" pareciam mais evidentes do que antes.
Nas
imediações da Praça Tiananmen, o espaço urbano mais sensível da China, situado
no centro físico e político da capital chinesa, viam-se dezenas de viaturas da
polícia estacionadas, incluindo os veículos pretos usados pela unidade especial
antimotim.
Como
todos os dias, mas em menor número do que é habitual, grupos de turistas da
província visitavam a Praça acompanhados pelos respetivos guias e faziam-se
fotografar tendo em fundo a imponente tribuna de cor púrpura que dá o nome ao
local: Tiananmen (Porta da Paz Celestial).
Nos
candeeiros do topo norte da praça viam-se bandeiras da China e do Koweit, cujo
primeiro-ministro, Sheik Jaber al-Murabak al-Hamad al-Sabah, está a efetuar uma
visita oficial ao país.
Para
o governo chinês, o movimento pró-democracia de 1989, iniciado por estudantes
de Pequim, mas se estendeu rapidamente a dezenas de cidades, com o apoio de
intelectuais e outras camadas da população, foi "uma rebelião
contrarrevolucionária".
Centenas
de pessoas morreram e milhares de outras foram presas ou exilaram-se.
A
China, entretanto, tornou-se a segunda maior economia mundial, com milhões de
pessoas a ascenderem anualmente à classe média e a passarem férias fora do
país, mas o "4 de Junho" continua a ser uma data tabu.
AC
// JCS - Lusa
Jornal
chinês acusa"forças anti-china" de tentarem
"desestabilizar" o país
Pequim,
04 jun (Lusa) - Um jornal de Pequim quebrou hoje o silêncio da imprensa oficial
acerca do 25.º aniversário da repressão militar do movimento pró-democracia da
Praça Tiananmen, acusando "forças anti-China" ocidentais de
utilizarem a efeméride para tentar "desestabilizar" o país.
"A
sociedade chinesa não esqueceu o incidente de há 25 anos, mas o facto de não
falar sobre isso mostra a atitude da sociedade", diz o Global Times, uma
publicação em inglês do grupo Diário do Povo, órgão central do Partido Comunista
Chines (PCC).
Num
raro editorial sobre os dramáticos acontecimentos de 04 de junho de 1989, o dia
em que o exército chinês esmagou um movimento de contestação iniciado por
estudantes, o Global Times afirma que "as novas gerações têm evitado ser
manipuladas por forças contrárias ao atual sistema político da China".
"A
maioria dos chineses confia no progresso da China e na vontade de mudar o país
através de um processo geral de reformas. Não está interessada nos apelos
revolucionários vindos do estrangeiro", afirma o jornal.
"Só
um pequeno número de chineses quer dançar ao ritmo do Ocidente",
acrescenta.
Centenas
de pessoas morreram naquele 04 de Junho - o "Liu Si" ("4 do
6"), como dizem os chineses - mas o número exato de mortos continua a ser
segredo de Estado.
"A
China bloqueou informação relevante para impedir que isso influenciasse o bom
desenvolvimento da política de reforma económica e abertura ao exterior",
justifica o Global Times.
Segundo
realça o jornal, a China, entretanto, "transformou-se na segunda economia
mundial", logo a seguir aos Estados Unidos da América, enquanto a
"União Soviética se dissolveu" e "o comunismo caiu na Europa de
leste".
"A
sociedade chinesa ainda se lembra como era pobre há 25 anos (...) o que está a
acontecer na Ucrânia e na Tailândia afetou-nos mais do que os sermões e apelos
do Ocidente (...) Nunca seguiremos os passos do Ocidente", proclama o
jornal.
Oficialmente,
o movimento pró-democracia de 1989 é considerado "uma rebelião
contrarrevolucionária".
As
Mães de Tiananmen, grupo fundado por mulheres que perderam os filhos no
"Liu Si" (04 de Junho), e que reclama a reavaliação do veredito
oficial sobre aquele dia, já identificaram 202 mortos.
Milhares
de outros foram presos ou exilaram-se.
AC
// VM - Lusa
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