André
da Costa – Jornal de Angola, entrevista
O
diretor nacional dos Serviços Penitenciários defendeu, em entrevista ao Jornal
de Angola, a adopção de uma perspectiva mais humana no tratamento dos reclusos.
No
cargo desde Fevereiro deste ano, o comissário principal António Joaquim
Fortunato enumera uma série de medidas a serem tomadas para reestruturar o
Sistema Penitenciário, torná-lo sustentável e capaz de reeducar de facto os
cidadãos privados de liberdade.
JA - Que novas ideias pretende introduzir nos Serviços Penitenciários?
AF- Começamos por introduzir mudanças ao nível do próprio raciocínio penitenciário, ao incutir nos nossos efectivos a mentalidade de que o recluso é um ser humano. A sociedade tem de afastar a ideia de que as cadeias são locais onde se guardam indivíduos inúteis. Pretendemos uma maior equiparação no tratamento entre o recluso e agente penitenciário. Colocamos um psicólogo a dirigir a área de reeducação penal, por ser a arma principal do sistema penitenciário, a que vai permitir uma reintegração social normal dos reclusos.
JA - Os reclusos já participam em actividades produtivas?
AF - Pretendemos fomentar o trabalho da reeducação penal para fazer com que os reclusos se integrem mais no trabalho social e na actividade produtiva, quer no sentido lucrativo quer no da formação profissional. Uma vez terminada a pena, eles levam consigo uma profissão e trabalham para dar resposta às necessidades.
JA - Existem projectos para rentabilizar a produção agro-pecuária feita pelos reclusos?
AF - Queremos criar um sistema penitenciário lucrativo com base na produção industrial e agro-pecuária. O programa “Novos Rumos e Novas Oportunidades” é de cariz lucrativo e visa a obtenção de fundos próprios para colmatar as dificuldades financeiras que existem e apoiar outros órgãos do Ministério do Interior. Trabalhamos também na melhoria das condições dos efectivos, os salários foram aumentados e a remuneração é feita mediante a patente.
JA - O tratamento dado aos reclusos ajuda a evitar a reincidência?
AF – No novo Estatuto Orgânico do Ministério do Interior, o Serviço Prisional passou a denominar-se Sistema Penitenciário. Isso porque o raciocínio em volta do que é prisional é muito restritivo. Há várias tendências jurídicas, psicológicas, psiquiátricas e antropológicas que defendem que o homem, quando privado de liberdade, deve ser tratado no sentido de assimilar novas ideias para impedir a reincidência.
JA - Mas a reincidência passa também pela falta de emprego.
AF - Estamos a trabalhar na criação de novas áreas, como a reinserção social, que vai fazer o acompanhamento dos reclusos postos em liberdade e fazer com que prestem serviços úteis à sociedade e afastem a possibilidade de cometer crimes.
JA - Como combater o excesso de população prisional em Luanda?
AF - Isso passa pela transferência de reclusos na cadeia da Damba em Malanje onde temos 1.700 vagas, e 700 vagas no Kapolo no Bié que ainda não estão a funcionar. Luanda tem cerca de 1.040 reclusos em excesso de prisão preventiva. Uma vez consolidada essa transferência evitamos estes casos. Nós temos 39 estabelecimentos prisionais em Angola.
JA- Vão continuar a ser construídas cadeias para transferência de reclusos?
AF - Vamos suspender a construção de cadeias e melhorar as que já existem. Temos cadeias com debilidades arquitectónicas e vamos reforçar os cordões de segurança. Pretendemos reabilitar e modernizar as cadeias e introduzir meios modernos de gestão e controlo de reclusos, e condições de habitabilidade para os efectivos que trabalham em zonas distantes de casa.
JA - Os cordões de segurança não são os mais desejados?
AF - Os cordões de segurança devem ser encarados numa perspectiva dinâmica e não apenas estática. Por exemplo, um muro de uma cadeia, deve ter mais de três metros para impedir que o recluso penseem fugir. A segurança
dinâmica passa pela formação do homem. Precisamos de 2.500 efectivos para
atender uma população de 22 mil reclusos.
JA – Continua a registar-se a introdução de drogas nos estabelecimentos prisionais?
AF - Existe tráfico e consumo de drogas nas cadeias do país. Não devemos esconder essa realidade. É uma forma de alertamos as pessoas que estamos atentos a essa situação. Por isso, pretendemos pôr fim à entrada de comida confeccionadaem casa.
Estamos a trabalhar para reforçar e melhorar a dieta
alimentar dos reclusos.
JA - Como é que a droga entra, se existe um sistema de segurança que controla as entradas e saídas?
AF - Parte da droga entra pela comida vinda de casa e em outros objectos. Temos meios técnicos que permitem alertar e vigiar, mas é muito complicado. Por isso, a segurança não pode ser apenas dinâmica. Temos homens com outros problemas e não estão livres da corrupção.
JA - Em relação à comida, há reclusos doentes com alimentação específica como os diabéticos, por exemplo?
AF - Estamos a modernizar o sistema prisional com a introdução de novas condições para que os reclusos não recebam comida vinda de casa. Só reclusos com uma dieta especial vão receber alimentação de fora. Aí cortamos em 50-60 por cento a entrada de drogas.
JA - O Sistema Penitenciário tem funcionários dedicados ao trabalho.
AF - Alguns agentes entendem mal o seu papel no sistema prisional. Acham que o sistema ajuda-os a perseguir interesses individuais. Estamos a trabalhar para detectar esses indivíduos. Estamos a louvar agentes que trabalham com abnegação e disciplina. Estamos a fazer todos os esforços para melhorar os salários. Houve agora um incremento salarial e estamos a tratar da motivação dos efectivos, com a reposição dos postos e distintivos.
JA- Existe diálogo regular entre os agentes prisionais e reclusos?
AF - Há maior diálogo e coordenação com os reclusos e estamos a separá-los por tipo de crime. A ideia é agrupá-los numa determinada brigada mediante o crime cometido. É uma actividade que está a ser feita com cuidado, porque a separação deve ter em conta o aspecto físico e arquitectónico das cadeias.
JA- Os jovens que entram para as novas cadeias recebem alguma formação?
AF - Temos em funcionamento o Centro de Jovens do Waco Cungo, onde os detidos dos 16 aos 21 anos, vindos de Luanda, Huambo e Bié, aprendem artes e ofícios.
JA- O sistema tem quadros para atender o número de presos.
AF – Luanda tem mais de sete mil reclusos e só a cadeia de Viana tem mais de cinco mil. Temos 105 reeducadores e, destes, só 80 trabalham de facto. A ideia é ter um reeducador para cada 35 reclusos. Os reeducadores vão trabalhar com dois a três psicólogos, para que, na ausência de um, o outro possa substituir.
JA-Que acompanhamento tem o recluso quando volta à liberdade total?
AF - Esse acompanhamento é feito apenas aos que saem em liberdade condicional, porque são obrigados apresentar requerimentos às empresas empregadoras.
JA - Ainda se registam casos de maus-tratos nas cadeias, como vimos em vídeos publicados na Internet?
AF - O sentido de humanidade para com os reclusos tem de ser cumprido porque a nossa disciplina e organização permite afirmar isso. Os reclusos não têm que ser maltratados nem enxovalhados. Quem maltratar um recluso é sancionado. Há neste momento um processo de inquérito no Bengo sobre uma denúncia de maus-tratos.
JA – Viu as imagens de maus-tratos? Como qualifica aquela situação?
AF- É de uma desumanidade incrível. Nunca imaginei ser possível alguém ter tanta crueldade para agir daquela forma. A maior parte destes efectivos foi expulsa do Ministério do Interior. Visito com regularidade as cadeias, inclusive de forma inesperada.
JA - Há reclusos que dão muito trabalho para serem reeducados?
AF - Temos de olhar para os reclusos como seres humanos, embora reconheçamos existirem reclusos maldosos, que desafiam os efectivos. São estes jovens que, quando são libertados, cometem crimes violentos.
JA - Que tipo de acompanhamento têm as reclusas gestantes?
AF - Está em curso a construção de uma creche junto da cadeia feminina para tratar dos filhos das reclusas. As mulheres têm estado envolvidas em trabalhos diversos e beneficiam de acompanhamento psicológico.
JA – As visitas íntimas funcionam em todas as cadeias do país?
AF - Temos vários actos jurídicos importantes, segundo o que defende o Direito Penitenciário, um dos quais é a visita, no sentido de se esta é benéfica para o recluso, incluindo a visita íntima. Temos as visitas conjugais, com quartos disponíveis para o efeito só em Luanda.
JA - Porque só em Luanda?
AF - A visita conjugal persegue a relação sexual. Se é isso que se pretende, é preciso haver um conjunto de situações em volta dessa questão. Estamos a trabalhar no regulamento relativo a este aspecto. A visita é um direito que o recluso deve conquistar mediante o bom comportamento.
JA - Quanto é que o Estado gasta por dia com cada recluso?
AF - Estudos feitos em tempos apontavam 30 dólares. Hoje, está entre35 a 40 dólares vezes os mais
de 22 mil reclusos existentes nas cadeias do país. Só recebemos cerca de sete
por cento desse valor. Mas há investimentos em curso e a direcção do Ministério
do Interior tem apoiado, porque queremos revitalizar a produção agro-pecuária e
industrial para melhorar essa quota.
JA - Que novas ideias pretende introduzir nos Serviços Penitenciários?
AF- Começamos por introduzir mudanças ao nível do próprio raciocínio penitenciário, ao incutir nos nossos efectivos a mentalidade de que o recluso é um ser humano. A sociedade tem de afastar a ideia de que as cadeias são locais onde se guardam indivíduos inúteis. Pretendemos uma maior equiparação no tratamento entre o recluso e agente penitenciário. Colocamos um psicólogo a dirigir a área de reeducação penal, por ser a arma principal do sistema penitenciário, a que vai permitir uma reintegração social normal dos reclusos.
JA - Os reclusos já participam em actividades produtivas?
AF - Pretendemos fomentar o trabalho da reeducação penal para fazer com que os reclusos se integrem mais no trabalho social e na actividade produtiva, quer no sentido lucrativo quer no da formação profissional. Uma vez terminada a pena, eles levam consigo uma profissão e trabalham para dar resposta às necessidades.
JA - Existem projectos para rentabilizar a produção agro-pecuária feita pelos reclusos?
AF - Queremos criar um sistema penitenciário lucrativo com base na produção industrial e agro-pecuária. O programa “Novos Rumos e Novas Oportunidades” é de cariz lucrativo e visa a obtenção de fundos próprios para colmatar as dificuldades financeiras que existem e apoiar outros órgãos do Ministério do Interior. Trabalhamos também na melhoria das condições dos efectivos, os salários foram aumentados e a remuneração é feita mediante a patente.
JA - O tratamento dado aos reclusos ajuda a evitar a reincidência?
AF – No novo Estatuto Orgânico do Ministério do Interior, o Serviço Prisional passou a denominar-se Sistema Penitenciário. Isso porque o raciocínio em volta do que é prisional é muito restritivo. Há várias tendências jurídicas, psicológicas, psiquiátricas e antropológicas que defendem que o homem, quando privado de liberdade, deve ser tratado no sentido de assimilar novas ideias para impedir a reincidência.
JA - Mas a reincidência passa também pela falta de emprego.
AF - Estamos a trabalhar na criação de novas áreas, como a reinserção social, que vai fazer o acompanhamento dos reclusos postos em liberdade e fazer com que prestem serviços úteis à sociedade e afastem a possibilidade de cometer crimes.
JA - Como combater o excesso de população prisional em Luanda?
AF - Isso passa pela transferência de reclusos na cadeia da Damba em Malanje onde temos 1.700 vagas, e 700 vagas no Kapolo no Bié que ainda não estão a funcionar. Luanda tem cerca de 1.040 reclusos em excesso de prisão preventiva. Uma vez consolidada essa transferência evitamos estes casos. Nós temos 39 estabelecimentos prisionais em Angola.
JA- Vão continuar a ser construídas cadeias para transferência de reclusos?
AF - Vamos suspender a construção de cadeias e melhorar as que já existem. Temos cadeias com debilidades arquitectónicas e vamos reforçar os cordões de segurança. Pretendemos reabilitar e modernizar as cadeias e introduzir meios modernos de gestão e controlo de reclusos, e condições de habitabilidade para os efectivos que trabalham em zonas distantes de casa.
JA - Os cordões de segurança não são os mais desejados?
AF - Os cordões de segurança devem ser encarados numa perspectiva dinâmica e não apenas estática. Por exemplo, um muro de uma cadeia, deve ter mais de três metros para impedir que o recluso pense
JA – Continua a registar-se a introdução de drogas nos estabelecimentos prisionais?
AF - Existe tráfico e consumo de drogas nas cadeias do país. Não devemos esconder essa realidade. É uma forma de alertamos as pessoas que estamos atentos a essa situação. Por isso, pretendemos pôr fim à entrada de comida confeccionada
JA - Como é que a droga entra, se existe um sistema de segurança que controla as entradas e saídas?
AF - Parte da droga entra pela comida vinda de casa e em outros objectos. Temos meios técnicos que permitem alertar e vigiar, mas é muito complicado. Por isso, a segurança não pode ser apenas dinâmica. Temos homens com outros problemas e não estão livres da corrupção.
JA - Em relação à comida, há reclusos doentes com alimentação específica como os diabéticos, por exemplo?
AF - Estamos a modernizar o sistema prisional com a introdução de novas condições para que os reclusos não recebam comida vinda de casa. Só reclusos com uma dieta especial vão receber alimentação de fora. Aí cortamos em 50-60 por cento a entrada de drogas.
JA - O Sistema Penitenciário tem funcionários dedicados ao trabalho.
AF - Alguns agentes entendem mal o seu papel no sistema prisional. Acham que o sistema ajuda-os a perseguir interesses individuais. Estamos a trabalhar para detectar esses indivíduos. Estamos a louvar agentes que trabalham com abnegação e disciplina. Estamos a fazer todos os esforços para melhorar os salários. Houve agora um incremento salarial e estamos a tratar da motivação dos efectivos, com a reposição dos postos e distintivos.
JA- Existe diálogo regular entre os agentes prisionais e reclusos?
AF - Há maior diálogo e coordenação com os reclusos e estamos a separá-los por tipo de crime. A ideia é agrupá-los numa determinada brigada mediante o crime cometido. É uma actividade que está a ser feita com cuidado, porque a separação deve ter em conta o aspecto físico e arquitectónico das cadeias.
JA- Os jovens que entram para as novas cadeias recebem alguma formação?
AF - Temos em funcionamento o Centro de Jovens do Waco Cungo, onde os detidos dos 16 aos 21 anos, vindos de Luanda, Huambo e Bié, aprendem artes e ofícios.
JA- O sistema tem quadros para atender o número de presos.
AF – Luanda tem mais de sete mil reclusos e só a cadeia de Viana tem mais de cinco mil. Temos 105 reeducadores e, destes, só 80 trabalham de facto. A ideia é ter um reeducador para cada 35 reclusos. Os reeducadores vão trabalhar com dois a três psicólogos, para que, na ausência de um, o outro possa substituir.
JA-Que acompanhamento tem o recluso quando volta à liberdade total?
AF - Esse acompanhamento é feito apenas aos que saem em liberdade condicional, porque são obrigados apresentar requerimentos às empresas empregadoras.
JA - Ainda se registam casos de maus-tratos nas cadeias, como vimos em vídeos publicados na Internet?
AF - O sentido de humanidade para com os reclusos tem de ser cumprido porque a nossa disciplina e organização permite afirmar isso. Os reclusos não têm que ser maltratados nem enxovalhados. Quem maltratar um recluso é sancionado. Há neste momento um processo de inquérito no Bengo sobre uma denúncia de maus-tratos.
JA – Viu as imagens de maus-tratos? Como qualifica aquela situação?
AF- É de uma desumanidade incrível. Nunca imaginei ser possível alguém ter tanta crueldade para agir daquela forma. A maior parte destes efectivos foi expulsa do Ministério do Interior. Visito com regularidade as cadeias, inclusive de forma inesperada.
JA - Há reclusos que dão muito trabalho para serem reeducados?
AF - Temos de olhar para os reclusos como seres humanos, embora reconheçamos existirem reclusos maldosos, que desafiam os efectivos. São estes jovens que, quando são libertados, cometem crimes violentos.
JA - Que tipo de acompanhamento têm as reclusas gestantes?
AF - Está em curso a construção de uma creche junto da cadeia feminina para tratar dos filhos das reclusas. As mulheres têm estado envolvidas em trabalhos diversos e beneficiam de acompanhamento psicológico.
JA – As visitas íntimas funcionam em todas as cadeias do país?
AF - Temos vários actos jurídicos importantes, segundo o que defende o Direito Penitenciário, um dos quais é a visita, no sentido de se esta é benéfica para o recluso, incluindo a visita íntima. Temos as visitas conjugais, com quartos disponíveis para o efeito só em Luanda.
JA - Porque só em Luanda?
AF - A visita conjugal persegue a relação sexual. Se é isso que se pretende, é preciso haver um conjunto de situações em volta dessa questão. Estamos a trabalhar no regulamento relativo a este aspecto. A visita é um direito que o recluso deve conquistar mediante o bom comportamento.
JA - Quanto é que o Estado gasta por dia com cada recluso?
AF - Estudos feitos em tempos apontavam 30 dólares. Hoje, está entre
Foto:
José Cola
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