Luís
Rosa – jornal i, opinião
É
inconcebível que o Constitucional demore cinco anos a escrutinar as contas dos
partidos
Estamos
em 1972. Washington, DC, capital dos Estados Unidos. Cinco homens invadem um
escritório do Partido Democrata situado no edifício Watergate com o objectivo
de colocar escutas telefónicas. Alguns são apanhados por um segurança e levados
a julgamento no dia seguinte. Movidos pela curiosidade, dois jornalistas
começam a investigar a identidade dos assaltantes e começam a detectar ligações
ao Partido Republicano. Estávamos em ano de eleições presidenciais e Richard
Nixon procurava a reeleição para um segundo mandato, concorrendo contra o
democrata Hubert Humphrey. Um dos assaltantes do Watergate, descobriram os jornalistas,
fazia parte da folha salarial de um comité de reeleição de Nixon, enquanto
outro dos invasores tinha recebido na sua conta um cheque de 25 mil dólares que
tinha sido endossado pelo mesmo comité. Eram duas provas sólidas que ligavam o
fundo de campanha eleitoral de Richard Nixon à invasão do edifício Watergate.
Estas
informações só foram descobertas pelos jornalistas Bob Woodward e Carl
Bernstein porque há mais de 40 anos (sim, leu bem) já era possível qualquer
cidadão norte-americano aceder facilmente à informação de quem financiava as
campanhas eleitorais. A seguir à demissão de Nixon foram aprovadas novas regras
que tornaram as campanhas eleitorais totalmente transparentes para todos os
cidadãos. O caso Watergate não deixa por isso de representar também a força da
democracia norte-americana e a importância de um escrutínio intenso dos
partidos políticos por parte da comunicação social em nome dos cidadãos.
Regressemos
a 2014, Lisboa, capital de Portugal. PSD, PS, CDS, PCP e Bloco de Esquerda, os
cinco partidos com assento parlamentar, recusam-se a revelar ao i os
donativos que receberam de particulares durante os anos de 2012 e 2013. Uns nem
sequer se dignaram responder aos jornalistas João D'Epiney e Pedro Rainho,
enquanto os comunistas não vêm "interesse jornalístico na
pormenorização" - certamente uma atitude saudosista do tempo da União
Soviética, em que o "interesse jornalístico" era definido pelo
partido. Enquanto os americanos conseguem saber no próprio momento quem
participou num jantar de campanha, os portugueses ainda não sabem quem doou dinheiro
aos partidos em 2010, 2011, 2012 e 2013. Para quem gosta de pensar que Portugal
é um país subdesenvolvido, e não um país da União Europeia, está aqui um
excelente argumento.
É
inconcebível que as contas de 2009 dos partidos só tenham sido finalmente
analisadas pelo Tribunal Constitucional em Abril deste ano, tal como nenhum
norte-americano aceitaria que as contas dos partidos políticos demorassem
quatro anos a ser escrutinadas.
A
proibição dos financiamentos por empresas, o aumento dos subsídios públicos
para as campanhas eleitorais, a publicitação obrigatória das listas dos
doadores individuais e a proibição de doações em dinheiro introduziu maior
transparência no financiamento dos partidos. Podemos dizer que o tempo das
malas de dinheiro, porventura, já lá vai. Tal como a ligação promíscua entre o
sector da construção civil e das obras públicas e os partidos políticos terá
diminuído substancialmente. Mas nenhuma democracia resiste à opacidade. Nem
mesmo à mais básica, como recusar a divulgação da lista dos doadores. É com
atitudes como esta dos cinco partidos com assento parlamentar que é descrita
nas páginas ao lado que fenómenos como Marinho e Pinto ganham fôlego.
Merecidamente para os partidos tradicionais, mas infelizmente para a
democracia.
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Financiamento. Partidos políticos escondem origem dos donativos
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