segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Luxemburgo. Creches e escolas castigam crianças por falarem português



Rosa Ramos – jornal i

Secretário de Estado das Comunidades diz estar a "acompanhar" situações relatadas por portugueses

Creches, escolas e ateliês de tempos livres (ATL) luxemburgueses estarão a proibir o uso do português nas suas instalações e as crianças que infringem são sujeitas a castigos - que podem ir desde o afastamento dos colegas ao isolamento total.

"Foi-nos dito que não podíamos falar português com os miúdos e que eles também não podiam falar português entre eles, é uma regra da casa", denunciou à Lusa uma funcionária portuguesa de uma creche em Esch-sur-Alzette, onde as línguas autorizadas - os três idiomas oficiais do país, luxemburguês, francês e alemão - estão indicadas, desde o início do ano, num painel. Na mesma creche terá sido também instituído um sistema de punições. "Há o castigo de os separar para não poderem falar entre eles ou o isolamento numa mesa em frente ao escritório [dos funcionários]", conta a mesma funcionária, acrescentando que os castigos são igualmente aplicados nas saídas em grupo: "Se vamos a caminho do parque ou da escola, há o castigo dos cinco minutos sentados. A criança [que falou português] tem de se sentar ou ficar quieta cinco minutos".

Mais a sul, em Rodange, a interdição vigorará em infantários e até na escola primária. Manuel Santos, pai de uma criança de sete anos, contou à Lusa que o filho foi castigado com trabalhos de casa extra por ter falado português com um colega durante uma visita escolar à capital para assistir a um concerto de música clássica. "Falou na rua, não foi na sala de aulas", queixa-se o emigrante. "É uma injustiça. Numa classe em que são quase todos portugueses, é normal que falem a língua dos pais e só não reclamei porque tenho quase a certeza que o miúdo ia ser prejudicado", queixa- -se Manuel Santos.

O secretário de Estado das Comunidades Portuguesas garante estar "a acompanhar" as denúncias. Contactado ontem pelo i, José Cesário explicou estar só a aguardar que a embaixada portuguesa no Luxemburgo confirme a veracidade dos relatos para tomar uma posição: "É uma matéria delicada e, a ser verdade, não podemos concordar e teremos de falar com o governo luxemburguês, com o qual existe uma boa relação".

No mês passado tinha já vindo a público, através da Rádio Latina, um outro caso de um director de turma de um liceu luxemburguês que proibiu os alunos de falarem português nas aulas, uma decisão apoiada pela ministra da Família do Luxemburgo - que defende a aprendizagem das línguas oficiais "desde o ensino precoce".

"Compreende-se que assim seja nas salas de aulas, uma vez que o português não é língua oficial", admite o secretário de Estado José Cesário, acrescentando porém que a proibição não deverá ultrapassar a porta das salas de aulas. "Mesmo que a intenção seja a melhor, de promover a integração das crianças", defende. Já o presidente da Confederação da Comunidade Portuguesa no Luxemburgo, José Coimbra de Matos, considera que "proibir genericamente o português nas aulas é uma forma de castração".

O secretário de Estado das Comunidades recorda que o luxemburguês "é uma língua muito difícil", o que explica a "elevada taxa de insucesso escolar" das crianças portuguesas no Luxemburgo - país onde vivem actualmente 100 mil portugueses (20% da população total). O português é, de acordo com dados oficiais, a segunda língua materna mais falada nas escolas do Luxemburgo, com 28,9% de falantes, a seguir ao luxemburguês, com 39,8%, mas à frente dos outros dois idiomas oficiais do país: o francês (11,9% de falantes) e o alemão (2%).

Foto: Sofia Vaz

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