João
Luís Barreto Guimarães – Jornal de Notícias, opinião
Vivemos
tempos sem grandeza nenhuma. Quem julgava que, com a chegada da troika, os
políticos portugueses - e esse imenso rol de responsáveis e dirigentes da coisa
pública - iriam ter vergonha na cara enganou-se redondamente. Ainda as cadeiras
não arrefeceram com a saída daqueles senhores, já os suspeitos do costume -
leia-se, os descarados - levando à letra a máxima de Luís XIV "L"Etat
c"est moi", fizeram jus à posição privilegiada que lhes foi confiada
e, tomando despotismo por desportismo, meteram ao bolso o que pertencia ao
Estado, sem qualquer escrúpulo ou pudor, recriando-se no nobre exercício da
ganância.
Uma
pândega. Um autêntico deboche. Essa coisa de aldrabar deve-lhes estar mesmo na
massa do sangue. Não sei se ficam deslumbrados com o poder, se entontecem ao
cheirar tanto dinheiro, o certo é que muitos já devem aceitar este tipo de
cargos com o único objectivo de usurpar. São génios mefistofélicos que julgam
que a máxima de Descartes "Cogito ergo sum" significa qualquer coisa
como "Coage e ergue a soma" e vai de levarem a mão à dita, com a
maior desfaçatez.
Mas,
também, se formos a ver bem, que formação moral, académica ou profissional é
que a maioria destes flibusteiros teve? Que provas é que já deram na sociedade
civil? Que chá é que esses meninos beberam em pequenos? Uns, genericamente,
nunca terminaram os cursos que dizem que tiraram (ou acabaram à pressa a um
domingo, ou inventaram licenciaturas); outros, são produto desses verdadeiros
lupanares chamados juventudes partidárias (autênticas escolas de primícias,
quais banhos públicos romanos, lugares de prazer e boato) e nunca trabalharam
em mais lado nenhum do que a empresa de um qualquer sacripanta do partido, onde
foram admitidos com o boçal curriculum de "amiguismo"; finalmente, há
os nefelibatas esforçados que rapidamente caem na chusma e, ou se tornam
bandoleiros como tantos, ou são levados a desistir, por uma questão de
honestidade. A política é uma perfídia que realmente não se recomenda.
Não
deve haver nenhuma outra classe profissional que preste contas da sua
incompetência apenas de quatro em quatro anos. Todas as restantes -
professores, juízes, médicos, engenheiros, jornalistas, enfermeiros,
funcionários públicos (e privados) em geral, de uma maneira ou de outra vão
sendo avaliadas mais amiúde e têm sido (à vez, porque o truque reside,
precisamente, em dividir para reinar), apoucadas, enxovalhadas e exploradas por
uma classe política que, deliberando num parlamento com mais clareiras do que a
alopecia de Diogo Feio, se dá ao luxo de exigir às outras classes o que não
exige de si própria: exclusividade de funções e honestidade de meios.
A
recente tentativa de repor o subsídio vitalício aos políticos, por exemplo,
quando há portugueses a passar fome, é escandalosa! Se há dinheiro para repor,
disse o bispo do Porto, "que se comece por quem tem menos". Como era
óbvio! À maneira dos protestantes - que dispensavam os santos como
intermediários dirigindo-se directamente a Deus -, está na altura dos cidadãos
dispensarem estas alimárias e decidirem em conjunto, como em Espanha com o
"Podemos", movimento criado pela sociedade civil. Ou como no Porto,
por exemplo, com Rui Moreira, para grande sorte a nossa.
O
problema de Portugal é um problema de gestão. Temos sido muito mal geridos por
quem só se preocupa em gerir o seu próprio bolso. O Bloco central vai-se
cevando, à vez, como uma Entente de inimigos aliados preocupada em manter a
classe média anestesiada, para que não consiga parar, reflectir, ganhar forças
e intervir, e se vá iludindo com a mediocridade para que o esquema da
alternância se perpetue e os cidadãos se limitem a existir, como escravos
legais, sujeitos ao ágio do capital, a quem os políticos lambem as botas porque
esperam, um dia, vir a mamar daí.
A
classe política, genericamente, cheira mal, está podre e fora de prazo. O
neoliberalismo matou Morfeu, o deus dos sonhos, e a mão invisível destruiu a
alegria de viver dos cidadãos. Alguma coisa tem de mudar a sério na política
portuguesa, e esse papel cabe agora à sociedade civil.
Aos
partidos é que já não sobra classe nenhuma. Nem sequer a classe média.
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