sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Angola: PREÇO DAS VISITAS ÀS CADEIAS SOFRE AUMENTO DE 200%



Isabel João – Novo Jornal (ao)

A subida do preço para o acesso às instalações das cadeias de Luanda está a causar revolta entre os familiares e os reclusos, que não entendem a decisão tomada pela Direcção Nacional dos Serviços Prisionais.

Em causa um aumento na ordem dos 200%. Os familiares pagavam 50 kwanzas para visitar os reclusos, agora desembolsam 150 kz. O ministério confirma a informação e adianta que essa prerrogativa está estipulada na lei penitenciária.

Os familiares e presos ouvidos pelo Novo Jornal dizem não entender as razões do aumento do preço e, por outro lado, também não percebem qual o destino que é dado aos valores arrecadados. Trata-se, na óptica de ambos, de uma brincadeira de mau gosto. Em conversa com um preso da Cadeia de Viana, que se identificou apenas por André, o Novo Jornal ficou a saber que a medida está a trazer a revolta para dentro da cadeia.

Acho que é uma brincadeira de mau gosto. O preço não pode subir só porque o director Fortunato assim quer. Ele, desde que entrou, há menos de um ano, já mudou muita coisa aqui na Cadeia de Viana, mas não mudou para melhor, acusa. André considera que a mudança de um dirigente, quando se verifica, é para introduzir melhorias. Mas, neste caso, a mudança piorou uma situação, que já era precária.

A comida que nos dão não é adequada, a água que bebemos não é tratada. As condições aqui dentro vão de mal a pior. Então, não sei o porquê da subida dos preços, visto que estes valores não são para melhorar a condição dos presos, denuncia, acrescentando que, devido à subida do preço, desde Setembro, a sua mãe, de 50 anos, passou a visitá- lo apenas uma vez por semana.

O jovem acredita que o dinheiro que os familiares pagam não vai para a conta do Estado. E considera que devia ser obrigação do ministro do Interior vir a público explicar o que é feito com esse dinheiro. É muito dinheiro. Só os 50kz já era muito dinheiro, agora, 150 kz é muito mais.

Por outro lado, acho que tinha de ser feito um comunicado a dizer que o preço para as visitas ia mudar, porque as pessoas foram surpreendidos com esta medida. Num país sério, as coisas não funcionam assim. Se a gente ainda visse o que é que feito com esse dinheiro não haveria problema. Assim não, desabafa.

SÓ PENSAM NELES

Eva Domingos, de 40 anos, efectua duas visitas por semana ao marido que, há três anos, está preso na cadeia de Viana por roubo. A mulher diz não entender o porquê da subida do preço que é cobrado aos familiares. Estes nossos dirigentes só pensam mesmo neles. As pessoas gastam dinheiro no táxi, na comida e, agora, o dinheiro que tínhamos para pagar os táxis temos que deixar aqui. Mas que país é esse, que não tem lei? Qualquer chefe que sobe faz o que quer. Não entendo porque é que o director das Cadeias aumentou o preço das visitas, porque, verdade seja dita, não se sabe o que é feito com estes valores, afirma.

A fonte sublinha ainda que, com o aumento dos valores, os que não têm possibilidade financeira não vão poder visitar os seus familiares. Acho que é mesmo intencional, mas as coisas não podem ser assim. Os presos não perdem os seus direitos por estarem na cadeia. Um dos agentes dos serviços prisionais explicou- me que a subida está prevista na lei, foi por isso que a direcção achou melhor aumentar, mas isto não é justo, porque ele não pode subir os preços quando lhe vem à cabeça, contesta.

Na Comarca Central de Luanda, o sentimento de revolta é o mesmo. No dia 01 de Dezembro, o Novo Jornal encontrou muitos familiares no portão principal. Alguns ainda questionavam o porquê do aumento do preço. Tomé Santos, de 54 anos, que estava ali para visitar o filho, era um dos que levantava a questão. Nós, os angolanos, temos um problema: Aceitamos tudo sem revindicar. Não se admite que haja esta decisão e ninguém faz nada. Já escrevi uma carta à direcção dos Serviços Prisionais, há mais de um mês, mas a verdade é que até agora não obtive resposta, refere.

O Novo Jornal visitou as cadeias de Viana, Comarca Central de Luanda e Hospital do São Paulo e constatou que as denúncias dos familiares correspondiam à verdade. Encontrámos, logo à entrada, uma folha colada numa das portas a informar o novo preço. O documento, assinado pela Direcção dos Serviços Prisionais, diz que o preço de 150 Kz entrou em vigor no dia 22 de Setembro de 2014, mas não explica quais as razões da subida.

SUBIDA ESTÁ PREVISTA NA LEI

Face ao aumento de preço para os visitantes, o NJ fez as contas à receita que entra nos cofres do Estado. As contas são baseadas numa visita por semana e não em duas, como sucede em muitos casos, podendo o saldo ser superior ao que é aqui apresentado.

Semanalmente, os valores arrecadados chegam aos 3.450.000 kz; Mensalmente poderão atingir os 14.835.000 kz, o que equivale a uma receita anual na ordem dos 179.400.000 Kz, quantia que, em dólares, representa um milhão e 794 mil USD. Em conversa por telefone com o director do Gabinete de Informação e Análise do Ministério do Interior, Sebastião Ngunza esclareceu que a subida do preço é legal e está estipulada na lei penitenciária, que prevê uma taxa contributiva, que visa o melhoramento e funcionamento da estrutura.

O responsável confirmou que o preço subiu para os 150 Kwanzas e que a medida abrange todas as províncias de Angola. Questionado se a lei quantifica o valor a cobrar, no caso os 150 Kz, Sebastião Ngunza respondeu que não. A lei penitenciária não diz o valor, mas nós entendemos que é uma quantia que está ao alcance de todos. Essa medida é mesmo para melhorar algumas situações dentro das cadeias. Também entendo que há cadeias que estão em boas condições e há outras que não. O objectivo é mesmo melhorar a situação, insiste.

A nível nacional, existem cerca de 23 mil presos. Num discurso proferido em 2011, o ex-ministro do Interior Sebastião Martins dizia que o governo angolano, por ano, gasta 144 milhões de dólares com os presos. Valor que não se reflecte na situação que os presos vivem nas nossas cadeias e que é de extrema precaridade.

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