Pedro
Tadeu – Diário de Notícias, opinião
Ouvi
o secretário-geral do Partido Socialista (repito: socialista) queixar-se, com
razão, da política que levou 300 mil portugueses a emigrarem. Foi, disse, uma
enorme perda de "capital humano"...
A
teoria do capital humano, burilada desde há mais de 50 anos pelos economistas
da Escola de Chicago e pelos apóstolos da globalização, vê na educação de cada
indivíduo um investimento financeiro: quanto mais cada um aprende, mais cada um
tem possibilidade de fazer fortuna e, por isso, a distribuição da riqueza será
mais equitativa.
Todos
os dias a vida real desmente a teoria: um por cento da humanidade tem 40 por
cento de toda a riqueza e os rendimentos de quem trabalha não se aproximam dos
rendimentos do capital, pelo contrário.
A
teoria do capital humano garante ser a educação um elevador social mas concebe
um ensino onde se normaliza, em direção à máxima produtividade, o potencial
físico e intelectual dos estudantes, mentalizando-os para a busca da
rentabilidade empresarial e para a disciplina da aceitação de que a organização
económica não pode ser alterada. Nas escolas de elite afinam-se, em
contrapartida, as técnicas de liderança pragmática que perpetuam o lugar dos
privilegiados no topo da escala social.
A
teoria do capital humano deseja indivíduos empreendedores. Neste contexto,
porém, o empreendedor é um escravo de um projeto empresarial, aparentemente
seu, onde aplica todo o seu tempo e conhecimentos na busca frustrante de uma
fortuna quimérica.
A
teoria do capital humano finge acabar com trabalhadores e patrões e
substitui-os por fornecedores e clientes. Mas tem o mesmo objetivo de sempre:
redução do custo do trabalho.
A
teoria do capital humano reinventa o operário do século XIX: dá-lhe banho, um
fato, um computador, um curso, chama-lhe empresário e, em vez de salário,
promete-lhe lucro. Reconverte o escriturário do século passado: empresta-lhe
uma casa, um carro, entrega-lhe um cartão de crédito, vende-lhe produtos,
viagens, ações. Chamou-lhe consumidor, agora chama-lhe gestor e exige-lhe a
ética, a cobiça e o pathos de um executivo num banco de investimento.
A
teoria do capital humano leva milhões de homens e mulheres, atomizados, sem
ação nem espírito coletivos, competidores, a pensarem em futuros filhos como se
desenhassem um plano de negócios: "Este projeto é financeiramente
viável"?... É este o Homo oeconomicus que substitui o Homo
sapiens.
A
teoria do capital humano é um dos pilares da sociedade neoliberal. Ao morder o
anzol da aparente benignidade da expressão, o socialista António Costa demonstra,
mais uma vez, ser mesmo peixe que morre pela boca.
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