A
História como farsa: EUA tentam repetir, contra Caracas, campanha de
desestabilização lançada por Ronald Reagan para sufocar revolução nicaraguense,
nos anos 1980. Agora, chances são menores
Mark
Weisbrot, Counterpunch – Outras Palavras - Tradução Vila
Vudu
Em
10 de março, a Casa Branca deu mais um passo rumo ao teatro do absurdo, ao
declarar “emergência nacional com respeito à inusual e extraordinária ameaça à
segurança nacional e à política exterior dos EUA que se manifesta na situação
na Venezuela” – como o presidente Obama escreveu em carta que enviou ao
presidente do Congresso, John Boehner.
Falta
ver se alguém, do valente corpo de jornalistas que cobre a Casa Branca, terá
coragem de perguntar o que, afinal, o chefe do executivo da nação mais poderosa
do universo pensou que estivesse dizendo na tal carta. O quê?! Estará a
Venezuela financiando iminente ataque de terroristas contra os EUA? Planeja
invadir território norte-americano? Está construindo bomba atômica?
A
quem essa gente pensa que engana? Alguns alegaram que o linguajar tinha de ser
esse, porque é o que a lei dos EUA exige, para impor a mais recente rodada de
sanções contra a Venezuela. Mas não melhora coisa alguma alegar, como se fosse
defesa, que a lei norte-americana autoriza o presidente a dizer
mentiras à vontade, para contornar o que não queira confessar.
Foi
precisamente o que fez o presidente Ronald
Reagan em 1985, quando fez declaração semelhante para impor sanções –
inclusive um embargo econômico – contra a Nicarágua.
Como
Obama em 2015, Reagan também tentava derrubar governo eleito que
não agradava a Washington. Conseguiu usar violência
paramilitar e terrorista, além de um embargo, no esforço bem-sucedido para
destruir a economia da Nicarágua e, afinal, derrubar o governo do país. (Em
2007, os sandinistas voltaram ao poder e são hoje o partido governante.) O
mundo andou adiante. Washington, não.
A
Venezuela conta hoje com o forte apoio dos países vizinhos contra o que
praticamente todos os governos na América Latina veem como tentativa do governo
Obama para desestabilizar o país.
“A
Comunidade de Estados Latino-americanos e Caribe (CELAC) reitera seu forte
repúdio à aplicação de medidas unilaterais coercitivas que violentam a lei
internacional” – lia-se na declaração assinada por todos os países do
hemisfério, exceto EUA e Canadá, em 11/2. Respondiam às sanções que os EUA
haviam imposto à Venezuela, sancionadas por Obama em dezembro passado.
Alguém
leu alguma coisa sobre isso na imprensa-empresa em língua inglesa?
Provavelmente, também nada se leu sobre a imediata
reação do presidente da União de Nações Sul-americanas ao golpe da
Casa Branca, em 10/3: “A Unasul rejeita qualquer tentativa externa ou interna
de interferência que busque qualquer violência contra o processo democrático na
Venezuela.”
Washington
já esteve envolvida na
tentativa de golpe
militar, rapidamente derrotada em 2002, na Venezuela; deu “treinamento, construção
de instituição e outros apoios a indivíduos e organizações que se sabia
estarem ativamente envolvidos no golpe” contra o presidente Hugo Chávez
(golpe que durou apenas algumas horas) – segundo oDepartamento de Estado dos
EUA.
Os
EUA não mudaram sua política para a Venezuela depois daquilo e continuaram
a financiar grupos de oposição naquele país. Assim sendo, nada mais
normal do que todos que conheçam essa história recente e conheçam o conflito
entre EUA e América Latina também no golpe
militar de 2009 em Honduras, imediatamente concluam que, sim,
Washington está novamente envolvida em golpismos para derrubar governo
democraticamente eleito.
O
governo da Venezuela já exibiu provas perfeitamente aceitáveis de que há um
golpe em marcha no país: a gravação de
um ex-vice-ministro do interior lendo o que obviamente é um comunicado a ser
lançado depois que os militares derrubassem o atual governo; confissões de
oficiais militares acusados; e uma conversa
telefônica gravadaentre chefes da oposição que admitem que há um golpe em
preparação.
Independente
de que se considerem suficientes essas provas, não surpreende que os governos
regionais tenham-se dado por convencidos. Praticamente há 15 anos, sem
interrupção, veem-se esforços para derrubar o governo democraticamente eleito
da Venezuela. Por que seria diferente agora, quando a economia está em
recessão e houve tentativa para derrubar o governo venezuelano ainda no ano
passado?
Aliás…
alguém alguma vez ouviu falar de tentativa de golpe para derrubar governo
democrático, independente e progressista na América Latina, na qual Washington
não estivesse metida? Pergunto porque eu, nunca.
A
grande imprensa-empresa norte-americana e internacional fez grande alarde em
torno do começo da normalização de relações entre EUA e Cuba. Mas entre os
governos latino-americanos, qualquer traço de credibilidade que aquele
movimento do governo de Obama talvez tivesse, acaba de ser radicalmente
desmentido pela violenta agressão contra a Venezuela.
Duvido
que alguém encontre um presidente, presidenta, ministro ou ministra de Relações
Exteriores na região, que acredite que as sanções impostas à Venezuela teriam
algo a ver com direitos humanos ou democracia. Absolutamente não têm.
Considerem
por exemplo o México,
onde trabalhadores de direitos humanos e jornalistas são regularmente
assassinados; ou a Colômbia, estado líder há anos nonúmero de sindicalistas
assassinados. Nada sequer comparável a esses pesadelos de violação a
direitos humanos jamais aconteceu na Venezuela em 16 anos de governos do
presidente Chávez e do presidente Nicolás Maduro. E apesar disso México e Colômbia
são os principais recebedores de ajuda dos EUA na região, incluindo
financiamento para militares e policiais e para comprar armas.
O
governo Obama está mais
isolado hoje, na América Latina, que, até, o governo de George W.
Bush. Por causa do abismo profundo que separa a grande imprensa-empresa
internacional e o pensamento de governos regionais, nada disso é óbvio para os
que não sejam dedicados estudiosos das relações hemisféricas.
Veja-se,
por exemplo, quem são os autores da legislação que impôs sanções contra a
Venezuela, em dezembro: os senadores Robert
Menendez (que está prestes a ser indiciado criminalmente por corrupção
ativa de funcionário público) e o senador republicano da Flórida Marco Rubio,
ambos ardentes defensores do embargo contra Cuba. Pois o governo Obama
anunciou, com orgulho – e
sem vergonha – que as novas sanções “vão além do que essa legislação
exige”.
Washington
mostra, frente à América Latina, a face do extremismo. Apesar de algumas
mudanças em algumas áreas da política exterior (por exemplo, a abertura de
Obama em relação ao Irã), a face do extremismo norte-americano não mudou em
nada, desde os dias em que
Reagan “alertava” o país de que os sandinistas nicaraguenses
estavam “a apenas dois dias de viagem, de carro, de Harlingen, Texas.” Foi
ridicularizado por Garry Trudeau em “Doonesbury” e por outros chargistas.
A
Casa Branca de Obama, Reagan redux, merece o mesmo tratamento.
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