“Angola,
em geral, e a província do Huambo, de modo particular, vivem desde o dia 16
deste mês de Abril de 2015, dias verdadeiramente trágicos”, afirma um
comunicado (que a seguir se transcreve na íntegra) do Grupo Parlamentar da
UNITA.
Explica
a UNITA que “a tragédia iniciada com o bárbaro assassinato de 9 agentes da
nossa Polícia Nacional, por membros da autodenominada “Igreja Cristã do Sétimo
Dia – a Luz do Mundo”, de José Julino Kalupeteka, no momento em que a Polícia
tentava deter o líder dessa seita, em cumprimento de um mandado de captura
emitido, ao que se sabe, por instâncias judiciárias da província do Bié. Se o
assassinato dos agentes da polícia foi violento, brutal e desumano, o que se
lhe seguiu não foi, nem de perto nem de longe, menos brutal, menos violento, ou
menos desumano.
“Ao
tomar conhecimento desses tristes acontecimentos, a UNITA, através do seu Grupo
Parlamentar, deplorou e condenou veementemente, mais uma vez, essas mortes,
rendendo a sua mais singela homenagem à memória das vítimas. Ao mesmo tempo, o
Grupo Parlamentar da UNITA solicitou a realização, com carácter de urgência, de
um inquérito parlamentar que traga luz sobre tudo o que aconteceu, e como
aconteceu, nesta parcela do território nacional.
“Por
outro lado, o Grupo Parlamentar fez deslocar ao Huambo uma delegação
constituída pelos deputados Miraldina Jamba, Demóstenes Chilingutila, Estêvão
Katchiungo, Liberty Chiyaka, chefiada pelo seu Presidente Raúl Danda, com vista
a constatar, “in loco” e “in situ”, o que terá ocorrido no Huambo, com o
objectivo de buscar a VERDADE dos factos. Viemos reiterar os votos de pesar às
famílias enlutadas, a TODAS as famílias enlutadas.
“Durante
3 dias, nomeadamente 23, 24 e 25 de Abril, a delegação parlamentar trabalhou
aqui no Huambo, contactou diferentes sectores da sociedade, desde os
governamentais, os religiosos, a sociedade civil e angolanos que estiveram no
Monte Sumi, que assistiram à tragédia e escaparam milagrosamente dela, e o que
apurou é simplesmente aterrador. Tão aterrador que os dados que aqui vamos
relevar não corresponderão à totalidade da informação que possuímos, reservando
a outra parte da informação para outros fóruns, outros níveis de discussão.
O
que terá acontecido no Monte Sumi?
“As
informações disponíveis apontam para o seguinte:
No
dia 16 de Abril de 2015, quinta-feira, elementos do Comando Municipal da
Polícia da Caála, chefiados pelo seu comandante, deslocaram-se ao Monte Sumi,
com a finalidade de proceder à captura de José Julino Kalupeteka, líder da Igreja
Cristã do Sétimo Dia – A Luz do Mundo, que ali se encontrava com um número
elevado de seguidores, avaliados em mais de 3 mil, concentrados em retiro à
espera do fim do mundo que, segundo sua crença, ocorreria no final deste ano de
2015.
“Os
crentes aí concentrados não eram apenas do Huambo, mas provenientes igualmente
de outras províncias, de entre as quais Benguela, Bié, Huíla, Kwanza Sul e
Luanda. A resistência às algemas ter-se-á traduzido numa reacção violenta, por
parte dos fiéis, que mataram, à paulada, os agentes da polícia, incluindo o seu
comandante, e que buscaram coragem, para enfrentar a Polícia, na crença de que
as balas não os poderiam perfurar, por acção divina.
“A
resposta da Polícia, utilizando efectivos das unidades especiais, aos quais se
viriam a juntar homens das Forças Armadas Angolanas, não se fez esperar, dando
início a um verdadeiro massacre, a uma verdadeira carnificina que não poupou
nem homem nem mulher, nem jovem nem velho, nem mesmo as crianças.
“O
que se passou no Monte Sumi e se estendeu por diversas outras aldeias na região
é simplesmente aterrador, revelado pelas populações, revelado pelos
sobreviventes desse massacre, e revelado também por elementos da própria
polícia e das forças armadas que participaram da operação e que dizem ter
disparado indiscriminadamente contra as populações, usando inclusive catanas
para acabar com os feridos e assassinar aqueles que, desesperadamente, se
escondiam por debaixo das camas ou de qualquer coisa, na tentativa de salvarem
as suas vidas.
“Os
primeiros dados oficiais referiam-se à morte dos 9 elementos da Polícia
Nacional, mas não faziam alusão a qualquer morte de civil, quando aos ouvidos
dos angolanos já chegavam informações segundo as quais o número de civis mortos
ascendia às várias centenas. Apenas no dia 21 de Abril, e após a revelação
feita pelo Grupo Parlamentar da UNITA, na Assembleia Nacional, em declaração
política, três vozes oficiais se fizeram ouvir para falar em números de civis
mortos: o Governo Provincial do Huambo que, em comunicado, falava em 13 civis;
o Segundo Comandante da Polícia Nacional, Paulo de Almeida, que repetia esse
número, não antes de afirmar que os seguidores de José Kalupeteka teriam
imposto três horas de fogo intenso às forças de defesa, que não disparavam
porque tinham à sua frente mulheres, velhos e crianças, tendo, depois dessas
três horas, encontrado métodos de contornar a situação e desbaratar os
insurgentes; e o Secretário de Estado do Interior para a Protecção Civil e
Bombeiros, Eugénio Laborinho, que dizia que o número de civis mortos não
ultrapassava os 20.
“As
informações de que dispomos, no entanto, apontam para um balanço provisório de
1.080 civis mortos, entre homens, mulheres, velhos e crianças, havendo um clima
de terror no seio das populações que têm medo de chorar os seus mortos para não
serem conotadas com o Kalupeteka; medo que impediu que comparecessem na morgue,
conforme instrução do Governo Provincial, para o eventual reconhecimento de
algum parente entre os 13 corpos aí expostos.
“O
discurso oficial tem estado a apontar para o facto de que José Kalupeteka teria
consigo um arsenal bélico. Mas que arsenal seria esse? O Secretário de Estado
Laborinho, em resposta a jornalistas, dizia que eram 3 armas. Apenas 3 armas.
Na sexta-feira, o Administrador Municipal da Caála, Víctor Chissingui,
dizia-nos que havia 3 armas. Outras fontes dizem que, face à investida quer das
forças especiais da Polícia Nacional, quer das FAA, os seguidores de Kalupeteka
não utilizaram qualquer arma de fogo. Apenas paus e outros objectos
contundentes, confiantes que assim poderiam agir já que as balas não os
atingiriam. As duas caçadeiras legalizadas que eles tinham para afugentar os
macacos das suas lavras, teriam sido entregues, segundo nos disseram, dias
antes ao Comando Municipal da Policia da Caála, para que, ainda segundo eles,
não fossem dados motivos para serem atacados, na sequência do que tinha
acontecido em Benguela, com correligionários seus.
“Desde
quinta-feira que nos dizem que as forças de defesa e segurança estariam
engajadas num árduo trabalho de transladar do Monte Sumi para a zona do Lepi,
município do Longonjo, centenas de cadáveres tirados de valas comuns para
outras onde esses corpos estariam a ser depositados em números menos
expressivos, de 7 a 10. Dizem-nos que a intenção do Executivo é transferir
tropas das FAA do Ngove para o Sumi, de modo a fazer desse local um campo
militar, com o intuito único de impedir qualquer circulação por lá, na
tentativa de esconder possíveis vestígios do massacre.
“Se
isso é ou não verdade, a informação que nos foi prestada pelo Senhor Governador
Kundi Paihama, mesmo sem a isso fazermos referência, é que o Governo achava ser
preciso colocar no Monte Sumi uma unidade militar para evitar que os seguidores
do autodenominado Profeta Kalupeteka regressassem àquele local. Qual dos dois
fins será o verdadeiro?
“Solicitámos
ao Governador Paihama a sua assistência para visitarmos o cidadão José Julino
Kalupeteka e para nos deslocarmos ao Monte Sumi e outras localidades onde teriam
ocorrido os incidentes. O Governador deu-nos todas as garantias de que isso
podia fazer-se sexta-feira, dia 24. Mas o Procurador Provincial Tito Cassule,
com quem falamos, confirmou que o senhor Kalupeteka está preso no Huambo, que
podia receber visita dos familiares directos, mas que os deputados deviam
esperar pelo que chamou de “uma outra oportunidade”.
“Apesar
da garantia dada pelo senhor Governador Provincial, fomos literalmente
impedidos de ir visitar o Monte Sumi. Depois de esperarmos três horas e meia
por uma resposta do Governo Provincial (outra resposta), o Administrador
Municipal da Caála veio dizer-nos que apenas estávamos “autorizados” a visitar
um suposto “posto de acolhimento”, aberto para receber e reencaminhar populares
que eventualmente estivessem desnorteados e que precisavam de regressar para as
suas áreas de origem, mas que, “ordens superiores” tinham orientado que os
deputados não podiam ir ao Sumi, ficando da inteira responsabilidade destes
quaisquer consequências que resultassem de uma eventual deslocação, nessas
condições.
“O
Grupo Parlamentar da UNITA considera de uma falta grave de consideração tal
tratamento aos seus deputados, assim como estima de muito pouco sério o
comportamento que, num dia, dá garantias para a efectivação da visita e, no dia
seguinte todos fogem e imperam as “ordens superiores” para criar tais
obstáculos aos deputados, o que demonstra claramente que há naquelas
localidades, algo muito grave a esconder, pois, diz o ditado, “quem não deve,
não teme”. Saliente-se, por outro lado, que não foi possível à delegação
parlamentar encontrar-se nem com o Comandante Provincial da Polícia, nem com o
Comandante Municipal da Caála, em exercício, nem com o Comandante da Região
Militar Centro, das Forças Armadas Angolanas.
“Foi
notória a utilização da velha técnica de implantação de “provas”
incriminatórias contra a UNITA, com bandeiras e cartões de membros, como se
ser-se membro de um partido político tornasse imputáveis, a esse partido,
eventuais crimes cometidos por qualquer membro. Se assim fosse, teríamos todos
os partidos sentados no banco dos réus, todos os dias, por quaisquer crimes e
desacatos cometidos por membros seus, o que nos parece um absurdo abominável.
“Continua
notório o empenho do Executivo em ocultar provas sobre o que verdadeiramente
aconteceu na Montanha do Sumi, o que sustenta, por um lado, a veracidade dos
testemunhos atrás citados que apontam para mais de mil civis mortos, e, por
outro lado, a falsidade dos números precipitadamente avançados pelo Governo.
“A
UNITA reitera o seu compromisso para com a paz e a verdadeira reconciliação
entre os angolanos, assentes no diálogo inclusivo, no respeito à Constituição e
à Lei e na valorização da vida humana, acima de tudo.
“A
UNITA espera, muito sinceramente, que o que aconteceu no Sumi e arredores seja
apenas um triste e deplorável episódio e não um programa do MPLA e do seu
Presidente, que visa exterminar angolanos para se perpetuar no poder.”
Folha 8 (ao)
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