David
Pontes – Jornal de Notícias, opinião
Às
vezes dá-me para coisas estranhas como ler preâmbulos de diplomas legais. Para
quem não sabe, é aquele texto com que o legislador justifica e enquadra as leis
que irão regular a nossa vida em sociedade. Como a Resolução do Conselho de
Ministros n.º 79-A/2012 que explicava a decisão do Governo de intervir no
universo das fundações com as costas largas da troika, a quem tinha sido
prometida "uma análise detalhada das entidades públicas em todos os
setores das administrações públicas, visando decidir, com base nos resultados
dessa análise, acerca da sua manutenção ou extinção". Isto ditava a
troika, mas o Governo ia mais além porque queria "a redução da estrutura
organizativa do Estado e dos seus custos" mas também a "redução do
denominado "Estado paralelo", no qual se integram as fundações
públicas".
Chegava-se
a esta resolução com as promessas de poupança de 150 a 200 milhões de euros por
ano e a vontade de extinguir "dezenas de fundações". O Governo
claramente pretendia mostrar músculo na sua vontade de cortar nas
"gorduras do Estado" e sabemos como pode ser popular quando os cortes
não recaem sobre nós.
O
Governo acabou por determinar, na altura, que havia 174 fundações de
solidariedade social que seriam alvo de um "processo de avaliação
qualitativa" que "estará brevemente terminado". Havia ainda um
universo de 230 fundações em que 92 não sofriam qualquer alteração, quatro eram
extintas (entre elas uma das quais a extinção já estava prevista) e fazia-se
recomendação de extinção a câmaras, universidades e regiões autónomas de 36
fundações.
Afinal,
só quatro a ser extintas imediatamente e hoje, passados quase três anos, qual é
o resultado? Não se sabe. A "análise detalhada" deu lugar ao habitual
nacional porreirismo ou, por outras palavras, ao título tabloide correspondeu
uma notícia pífia. Mas a coisa funciona. Para quem só retém as grossas letras a
vermelho, este foi um Governo empenhado na reforma e que cortou a direito nas
fundações. Para quem lê as letras pequeninas a realidade será outra mas,
afinal, quem é que lê as letras pequeninas?
E
quem não recordará que, ao contrário dos governos anteriores, este era o
Executivo que tinha pedido a "lista Lagarde", onde constavam registos
de mil contas bancárias detidas por 700 portugueses onde poderiam estar potenciais
fugas ao Fisco através do banco HSBC de Genebra? Pois ontem li que um
ex-ministro grego foi condenado por causa desta lista mas, por cá, o Ministério
das Finanças nada diz sobre os resultados de tão bom título tabloide.
Sem comentários:
Enviar um comentário