Chacina
brutal na Grande S.Paulo demonstra: Estado “democrático” brasileiro mata como a
ditadura — mas comoção é menor, porque vítimas são apenas “corpos supérfluos”
Liliana
Sanjurjo e Gabriel Feltran – Outras Palavras
Guerra
às drogas”, “guerra ao crime”, “guerra contra a subversão”, “guerra ao terror”. Palavras
de ordem na contemporaneidade. A lógica guerreira da militarização vem pautando
as políticas desegurança nacional e, mais recentemente, as políticas de segurança
pública em diversos países do mundo (1). Especialmente no contexto
latino-americano, tanto no passado ditatorial recente quanto na presente forma
democrática, observa-se como distintos governos, por meio dos sujeitos e
instituições que os constituem, colocam em ação enunciados valorativos a fim de
justificar, sobretudo moralmente, as políticas estatais de segurança e os atos
repressivos perpetrados contra aqueles categorizados como seus “inimigos
internos”. A política é a cada dia mais guerreira, a fronteira que define o
inimigo é cada vez mais moral e ele está cada vez mais próximo. O conflito
precisa ser administrado.
Compreendendo governo como
uma esfera que reivindica os sentidos – existenciais, políticos e morais – que
justificam a vida e a morte de sujeitos, individuais ou coletivos (2), buscamos
analisar aqui como são atualizados os dispositivos de gestão da vida e, a
partir deles, da ordem social que se construía em nossos contextos
etnográficos, ambos muito marcados pela morte violenta. Gestão, portanto, que
tem o assassinato como possibilidade mais ou menos presente e que culmina em
processos de categorização, hierarquização e construção de fronteiras sociais
(3).
Nesse
sentido, em consonância com as reflexões de Butler (4) sobre a questão da
violência, do luto e do reconhecimento da vida, problematizamos as
circunstâncias, mas sobretudo as perspectivas, em que certas vidas são
lamentadas, choradas e dignas de luto em público, enquanto outras não o são. A
estas últimas vidas a comunidade nacional oferece o silêncio, ora porque são
entendidas como animando os corpos que devem tombar numa “guerra justa” (eram
terroristas, delinquentes, subversivos, traficantes, do crime organizado); ora
porque compreendidas como externas ao sentido de pertencimento a qualquer
humanidade comum (eram monstros, veja o que fizeram, nem animais o fariam).
Distintas
formas de discurso (do jurídico ao científico, do jornalístico ao acadêmico)
produzem o “excluído”, os corpos deslocados da humanidade, considerados então
pelo poder como desimportantes, supérfluos, as vidas que deveriam ser
corrigidas ou que não mereceriam ser vividas. O lugar desse “excluído” seria de
silêncio, que, concretamente, se realiza na sensação de injustiça por não poder
existir socialmente, não gozar de qualquer interesse por parte do mundo, por habitar
uma vida condenada à morte silenciosa. Este artigo quer analisar
contextualmente as consequências políticas manifestas nas concepções normativas
do humano que suspendem a validade da vida de sujeitos e grupos, produzindo uma
multidão de “vidas sem valor” cujo estatuto político se encontra
substantivamente suspenso, o que por vezes é acompanhado da perda do estatuto
legal.
Partimos
da experiência etnográfica específica em situações nas quais o Estado provoca a
morte de seus “inimigos internos”, para refletir sobre as fronteiras da noção
de humano, bem como sobre seus significados políticos contemporâneos. Por um
lado, tomamos como objeto um estudo sobre desaparecimento forçado, violência e
política no contexto da última ditadura militar argentina e, por outro, uma
etnografia sobre crime, violência e política em São Paulo (5). Por meio
desse deslocamento etnográfico temporal e espacial – a passado ditatorial
argentino e presente da forma democrática brasileira –, esboçamos uma crítica
que situa a violência de Estado contemporânea não como um desvio, mas como um
instrumento chave para governar. O recorte moral do conjunto da população nos
termos da guerra do bem contra o mal favorece a implementação de projetos
político-econômicos específicos, mas se faz centralmente em nome da segurança
pública ou segurança nacional.
Por
um lado, analisamos a construção pública e conjuntural das grades de
inteligibilidade que permitem a justificação de medidas letais, legais ou
ilegais de “combate ao crime”, “guerra às drogas”, “luta contra a subversão”,
“defesa nacional”. Por outro lado, verificamos as estratégias empreendidas por
atores sociais incriminados para reagir à violência de Estado, tornar visíveis seus
mortos e construir a sua posição pública como sujeitos legítimos de
participação no espaço político ou, quando não, como sujeitos aptos a disputar
o poder. Colocamos assim em diálogo as nossas etnografias para questionar a
adjetivação dicotômica das violências (violência criminal, violência política),
colocando-as em
relação. Problematizamos a diferença de lugares de locução
ocupados por familiares de desaparecidos políticos e por residentes das
periferias da cidade, perante a violência sofrida. Verificamos que seus modos
de reivindicar o direito à vida de seus semelhantes são submetidos a condições
de legitimação discursiva completamente diferentes. Que suas estratégias e
crenças são, por isso, fundamentalmente distintas. Recortes na distribuição
efetiva de “direitos” aparecem, então, condicionando o direito ao estatuto de
locução pública, garantia de existência política, sinônimo de humanidade.
Essas
condições de locução nos levam, então, a uma reflexão sobre o Estado e as
formas de uso contemporâneo da violência estatal, realizada na segunda parte do
texto. Os contrastes entre os contextos etnográficos em que estudamos essas
questões, apresentadas em linhas gerais a seguir, funcionam aqui mais para
elaborar nosso próprio ponto de observação das relações entre política e
violência, do que para construir nossos objetos de estudo. Ditadura argentina e
democracia brasileira serão, assim, representações a partir das quais se pode
ensaiar uma reflexão crítica sobre as relações entre política e violência.
Violência
de Estado na ditadura argentina: da luta pelo luto e pela memória
Foi
pela violência perpetrada contra a população civil que a última ditadura
militar argentina (1976-1983) se tornaria conhecida. Dentre os métodos
empregados para a imposição do terror, destaca-se a política de desaparecimento
forçado daqueles definidos pelas autoridades como “terroristas”, “delinquentes
subversivos” e “inimigos da nação”. As autoridades militares justificariam o
golpe de Estado alegando que as forças armadas eram a única instituição capaz
de “restaurar” os “verdadeiros valores da nação” e a cultura “ocidental e
cristã”. Os militares se apresentavam assim como combatentes de uma “guerra”
travada “em nome de Deus”, pela “defesa nacional” contra o “beligerante inimigo
subversivo” e o “ateísmo marxista” (6).
Combinando
discurso religioso a metáforas do parentesco, da guerra e da biologia para
fundamentar a repressão, a “subversão” emergia na retórica da ditadura como
“câncer” que deveria ser eliminado para não “contaminar” o “organismo nacional”
(7). Além do mais, interpretando a “guerra contra a subversão” no marco da
Doutrina de Segurança Nacional junto ao conceito de “guerra total” da doutrina
contrainsurgente francesa, o discurso militar embaralhou as fronteiras que distinguiam
o nacional do forâneo, ao passo que o conflito era definido em termos de uma
guerra interna. Da perspectiva militar, tratou-se de uma “guerra justa”, porém
uma “guerra irregular” cujo signo distintivo teria sido a “imprecisão”. Atos
atrozes continuariam sendo assim justificados como sequelas, excessos,
imprecisões ou equívocos (fatos supostamente inevitáveis às guerras) cometidos
no contexto de uma ação legítima.
Fica
evidente como, no contexto ditatorial, “subversão” foi a categoria englobante
utilizada para delimitar as fronteiras de pertencimento à nação. Na conjuntura
de então, marcada pelo capitalismo industrial e pela Guerra Fria, momento em
que a polarização capitalismo X socialismo se impunha como conflito
predominante, a figura do “delinquente subversivo” surgia como identidade
dissonante da ordem social. Nessa operatória, o governo ditatorial
criminalizava a oposição política, produzindo uma nova categoria de pessoa, os detenidos-desaparecidos,
que, deslocados da humanidade porque concebidos como ameaçando os valores mais
centrais da vida humana, eram condenados à morte silenciosa; vidas proibidas de
existir para a preservação dos princípios da dignidade humana (a família, a
tradição, a ordem, a religião), mortes por isso destituídas de identidade (8) e
privadas do direito ao luto. Encarcerados em prisões clandestinas, os
desaparecidos eram deslocados da vida social, perdendo o seu estatuto político
e legal. Excluídos dos sistemas de inscrição da morte (cadáveres sem nome e sem
história) (9), os desaparecidos eram deixados de fora do relato da nação, da
comunidade política, apostando na impossibilidade da memória pela ausência do
corpo (10).
Contudo,
enquanto a ditadura buscava negar a existência dos desaparecidos, Madres de
Plaza de Mayo e outros coletivos de familiares das vítimas se organizavam para
mostrar que os desaparecidos tinham um rosto, um nome e uma história. Esses
coletivos emergem na cena pública colocando suas demandas por “Memória, Verdade
e Justiça” em linguagem de parentesco e de direitos humanos. Após décadas de
incessante ativismo, os familiares de desaparecidos (e os próprios
desaparecidos) marcam o seu lugar na vida política do país e as violações
cometidas durante a ditadura dificilmente encontram respaldo social, ao passo que
o evento crítico do desaparecimento forçado afirma-se como acontecimento
político nacional (11). Observa-se ainda um processo de luto permanente pelos
“30 mil detenidos-desaparecidos” e de reelaboração de sua memória na esfera
pública, questão central que motivou a etnografia realizada por Liliana
Sanjurjo; ou seja, compreender os processos que levariam os desaparecidos e as
memórias da ditadura a ganhar tamanha repercussão social na Argentina
contemporânea.
Cabe
salientar que foi por meio de uma série de disputas políticas, simbólicas e
jurídicas, na qual se encontram empenhados há mais de 30 anos, que esses
coletivos de familiares foram adquirindo legitimidade social, consolidando
publicamente um conjunto de representações sobre o passado ditatorial. Puderam
assim converter (e pode-se dizer com eficácia) o estigma imposto às vítimas e
seus familiares durante a ditadura em capital político no período democrático.
A análise da trajetória de mobilização desses familiares e de significação da
categoria detenidos-desaparecidos (12) – cujo percurso parte da
negação de sua existência e culmina na sua reivindicação como grupo portador de
um projeto político – revela como diferentes conjunturas históricas
possibilitam, por um lado, que determinados agentes possam se construir como
sujeitos legítimos de participação no espaço político e, por outro lado, que
novos sentidos sejam atribuídos ao passado de violência.
Se
durante a década de 1980 os familiares buscaram despolitizar a questão dos
desaparecidos (13), atualmente se empenham precisamente em demonstrar o que
faziam as vítimas politicamente para que fossem transformadas em alvo da
repressão. Ou melhor, se no período de transição democrática as histórias de
militância dos desaparecidos se viram silenciadas, esse silêncio deve ser lido
em face a um contexto de alta adesão aos discursos que justificavam a violência
letal. Para não integrar a alteridade negativa da ditadura (subversão), a
denúncia da repressão perderia o seu contorno político-ideológico, dando lugar
à construção de uma narrativa humanitária que convertia os desaparecidos em
“vítimas de graves violações aos direitos humanos”.
Foi
somente na segunda metade da década de 1990 que a memória dos desaparecidos
começaria a ser definida em termos políticos, sendo agora reconhecidos como
seres produtores de política (militantes populares, socialistas,
revolucionários), assassinados pelos projetos políticos que encarnavam.
Contemporaneamente, haveria ainda uma vontade de categorização (genocídio por
razões políticas, terrorismo de Estado), que se articula no campo jurídico com
a produção de um discurso de verdade (14). A argumentação se dirige
então a comprovar que o Estado teria executado um plano sistemático de tortura
e extermínio contra um grupo específico da população nacional, definido
previamente segundo critérios políticos.
Por
último, vale salientar que esse processo de crescente politização do relato da
ditadura se dá numa conjuntura de crise da política neoliberal menemista –
caracterizada pelo desemprego, precarização do trabalho e dos serviços de
proteção social e, o mais importante, quando a violência de Estado já tem como
foco prioritário outros grupos criminalizados (os pobres). Essa nova
conjuntura, bem como o lugar social ocupado pelos coletivos de familiares de
desaparecidos – constituídos, de uma maneira geral, por setores médios que,
desde o princípio, já contavam com o capital social necessário para articular
ações no plano nacional e internacional –, parecem assim marcar uma diferença
fundamental para a construção de sua posição pública como sujeitos legítimos de
participação no espaço político, garantindo o direito ao estatuto de locução
pública. Ao gozarem de existência política, puderam reagir à violência de
Estado, tornar visíveis seus mortos, bem como responsabilizar penalmente os
agentes do Estado implicados na repressão.
Violência
de Estado na “democracia brasileira”: mortos sem luto, luta sem virtude
São
também muitas as mortes e desaparições forçadas no contexto das periferias das
cidades brasileiras, em período “democrático”. Em São Paulo , a questão
central que mobilizou a etnografia conduzida por Gabriel Feltran, no distrito
de Sapopemba, remetia ao silêncio público em torno dos homicídios de
adolescentes e jovens nas favelas, nos anos 1990 e início dos anos 2000. Embora
pesquisando regiões muito marcadas pela mobilização de movimentos populares –
por saúde, moradia, transporte, educação – a temática da morte violenta de
milhares de jovens, muitos deles trabalhadores de mercados ilegais como o da
droga ou do roubo de carros, parecia não causar comoção aos movimentos sociais
de trabalhadores do período. Restavam apenas as páginas policiais para
publicizá-las. Os anos de etnografia foram tempos em que se solicitou nas
rádios e televisões, nos comentários de notícias pela internet,
progressivamente, e cada vez mais, que a repressão contra os pobres e seus
territórios se radicalizasse: era preciso combater o crime que
brotava de favelas e periferias. A justificação dessa premissa é moral, não precisa
de argumentos.
As
denúncias de homicídios estudadas nessa etnografia não tiveram seguimento
jurídico e foram recebidas, publicamente, com indiferença ou silêncio. Os
poucos que tentavam traduzir essas mortes em luta, militantes de direitos
humanos, eram logo acusados de “defender bandido”. Direitos humanos para
humanos direitos! Direitos humanos para bandidos? Ambas as violências – tanto a
remetida aos corpos de jovens favelados que tombavam pela polícia ou seus
pares, quanto a que se dirige à fala de militantes que os representariam (15) –
foram predominantemente legítimas, nos meios públicos e em muitas famílias de
periferia.
A
surpresa dessa etnografia, no entanto, foi constatar que, conforme corria a
pesquisa de campo nos anos 2000, eram cada vez mais raros os homicídios de
jovens nas favelas de São Paulo. Nos anos 2000, o Primeiro Comando da Capital
(PCC) implementava um sistema de justiça em todos os presídios e favelas,
interconectado, que, em 2011, havia reduzido os homicídios nesses lugares em
dez vezes. No conjunto da cidade, a queda foi de mais de 70% das mortes por
armas de fogo, embora os latrocínios subissem no período. A queda dos
assassinatos nas periferias de São Paulo, durante os anos 2000, não tinha como
causa decisiva a redução das atividades criminais, mas seu oposto, a muito
maior capilaridade da facção criminal, que instrumentalizava as políticas
repressivas em curso, sobretudo o encarceramento massivo (16). O PCC passava a
intermediar inúmeras situações de conflito local, em favelas e periferias,
tendo por mote central evitar o homicídio de jovens e a interdição de vendetas
entre eles, de modo a pacificar os mercados que regulava (drogas, carros
roubados, assaltos, entre outros). O sistema foi bem sucedido, já está bem
descrito na bibliografia (17). De um lado, morrem menos de um décimo dos jovens
que morriam dez anos antes, nas periferias de São Paulo; de outro, o “crime” –
e não um movimento com virtudes democráticas – parece ser o ator central de
regulação da vida e da morte nas periferias.
Situar-se
politicamente frente a essa constatação leva a um paradoxo. Propõe-se a chave
interpretativa de coexistência de regimes normativos nesses territórios,
seguindo a hipótese de Machado da Silva (18). Crime e Estado compõem ali ordens
legítimas que, em suas tensões e acomodações, produzem um dispositivo de ordem
urbana composto entre políticas estatais e criminais, responsável hoje pela
especificidade paulista na questão da “segurança pública”. Todos os dados
quantitativos elencados na bibliografia, bem como o cenário cíclico de tensões
entre esses regimes normativos, em 2001, 2006 e 2012, corroboram esta hipótese
analítica, hoje legítima na bibliografia.
Se
um favelado é assassinado, essa morte não será investigada pelo Estado, não se
montará um inquérito judicial. O PCC vai, entretanto, intermediar debates
locais sobre o caso, com minúcia, para conhecer os fatos e as versões, para
julgar os culpados, e no limite para implementar a justiça. Se um branco é
morto em um assalto, não se aplica a ele a justiça do PCC, ela o ignora. O
Estado cuidará do caso. Há uma fronteira entre esses dois regimes que define,
entre outras coisas, o que é um homicídio em cada perspectiva e, portanto, os
limites do humano em cada um dos regimes. O desenvolvimento histórico dessa
fronteira não é infenso a tensões, evidentemente. Em São Paulo , e em outras
periferias urbanas brasileiras, o emprego rotineiro da violência ilegal como
modo de arbítrio dos conflitos sociais que condicionam essas tensões, tanto
pelo “mundo do crime”, quanto pelo Estado, indica a dimensão mais
constitutivamente arraigada da violência no funcionamento democrático
brasileiro.
Sobre
lutos e lutas: da distribuição desigual do reconhecimento da vida
Já
não é surpreendente que o recurso à violência institucional, que se julgava
próprio das ditaduras militares – tanto a violência massivamente aplicada a
populações consideradas ameaçadoras, quanto seletivamente voltada às vozes
dissonantes – seja também instrumento fundamental da forma de governo
contemporaneamente conhecida como democracia (19). Diferentes trabalhos vêm
demonstrando a presença da chamada “violência política” nas democracias, seja
na construção ativa de inimigos internos, seja na ação direta que os transforma
em população e os criminaliza, para em seguida deslocá-los, expulsá-los,
encarcerá-los ou mesmo exterminá-los como parte de procedimentos
administrativos (20). Pela representação sinonímica entre a noção de democracia
e os atuais regimes ocidentais ter atingido hoje validade quase absoluta, seja
no senso comum, seja em boa parte da bibliografia, utilizamos a categoria
“violência de Estado” para nos referirmos aos atos violentos, seja legalizados
ou francamente ilegais, que se produzem como modo de sustentar uma fronteira no
acesso ao “direito a ter direitos”, ou seja, uma fronteira que reivindica uma
clivagem, quase sempre figurada no plano da natureza, entre os que pertencem à
comunidade política e por isso devem ser protegidos, daqueles que a ameaçam e
devem ser combatidos. É exatamente nessa medida – a da violência de Estado –
que os desaparecimentos forçados na Argentina e o assassinato de jovens
favelados nas periferias de São Paulo, que estudamos nas nossas etnografias
recentes, podem ser colocados em perspectiva. Inúmeras
outras situações nacionais contemporâneas – a começar por Estados Unidos e
Europa em sua guerra ao terror, passando pela “reconstrução estatal” na América
Latina e África – revelam a fabricação ativa de inimigos internos como baliza
cognitiva para se pensar normativamente a ordem social.
Nessa
medida, um contraste fundamental entre nossos casos se explicita. A temática do
desaparecimento forçado se tornou, na Argentina, assunto político de primeira
ordem e os movimentos que o denunciavam foram progressivamente se tornando
vozes mais legítimas publicamente. Seus argumentos se fizeram ouvir nacional e
internacionalmente, sua presença funcionou para demarcar as balizas do discurso
político oficial na transição democrática e resta ainda hoje muito viva. A
memória da ditadura se reconstruiu, entre familiares de vítimas, mas também
entre as gerações mais recentes e os atores públicos contemporâneos, como
memória de injustiça e de dor que não se pode esquecer. A criminalização,
extermínio e desaparecimento de milhares de pessoas ofereceu a oportunidade
para um luto coletivo, vivido como luta intensa, que foi se legitimando
publicamente pouco a pouco, ainda que os movimentos jamais tenham obtido
satisfação de todas as suas demandas.
No
caso brasileiro contemporâneo, a violência de Estado voltada contra grupos de
favelas e periferias, centrada na criminalização seletiva, tem produzido um
tipo de clivagem social que se encaminha muito mais para a alteridade radical
do que para a possibilidade de legitimação do discurso divergente. A tendência
contemporânea não é, por exemplo, de que o discurso e as demandas de grupos no
foco das estatísticas de homicídio sejam enunciados publicamente e cresçam em
capacidade de legitimação pública. Por isso, toda a grade de inteligibilidade,
ou seja, os critérios pelos quais se reivindica sentido para o discurso
enunciado pelos sujeitos, teve de ser alterada. Em São Paulo , esses
discursos foram, por exemplo, muito mais elaborados nas favelas pelos debates
internos ao Primeiro Comando da Capital, uma facção criminal, do que nos
debates públicos vinculados aos setores estatais responsáveis por direitos
humanos ou segurança pública. As grandes medidas de controle da violência
policial, ao longo dos anos 2000, foram produzidas pelo próprio “mundo do
crime” (21). Assim, as principais caixas de ressonância para a reflexão e a
crítica da violência de Estado mantiveram-se num mundo progressivamente mais
afeito aos próprios sujeitos criminalizados das favelas, codificado
internamente entre eles, do que foram ouvidas publicamente. Mundo que, assim,
foi progressivamente se autonomizando frente à grade de inteligibilidade
política estatal, centrada normativamente no direito universal. Com isso, de um
lado, se constituíram regimes normativos – o do “crime” é bastante evidente,
conforme já demonstrou há quase duas décadas Luiz Antonio Machado da Silva
(1999), que coexistem com os estatais; de outro lado, e como reação a esse
processo, esses regimes passaram a alimentar o ciclo de criminalização que,
justamente, os havia produzido. Essa tendência, ao contrário do que se passou
na Argentina, já impede definitivamente qualquer possibilidade de legitimação
política do discurso democrático contra a violência de Estado, tanto quanto a
legitimação política dos atores inscritos nas tentativas de controlá-la fora
dos marcos legais. Enquanto na Argentina o movimento de familiares de
desaparecidos põe em relevo a identidade política das vítimas (a definição do
“inimigo” teria sido diretamente “política”), no Brasil as Mães de Maio e
outros coletivos de familiares de vítimas da violência policial buscam
enfatizar o critério racial (negros), de classe (pobres) e territorial
(periferias) da repressão perpetrada. Talvez esteja aí a chave para perceber
porque os ganhos entre esses movimentos sejam tão díspares.
Dessa
perspectiva, o que se poderia chamar de ação política – a construção ativa de
terrenos de locução legítima em um espaço público, operada cotidianamente pelos
sujeitos sociais – definitivamente não fica restrita, no caso brasileiro, às
disputas entre sujeitos já constituídos (movimentos, partidos, sindicatos etc)
que se encontram em terrenos de negociação de poder definidos em consenso
(conselhos, assembleias, fóruns de participação ou representação social
estatais). Essa ação potencialmente política vai se assentar, justamente, na
disputa acerca da constituição desses mesmos terrenos e sujeitos: os militantes
das periferias precisam primeiramente se forjar enquanto sujeitos, transpondo
fronteiras impostas pela gestão e pela violência, para serem ouvidos. Os
bandidos das favelas paulistas, que se reúnem para tentar impedir o aumento de
homicídios de jovens nas “quebradas”, jamais terão voz pública nos debates
sobre esses temas. Nem seu léxico permitiria que sua voz fosse aí compreendida
como fala articulada. Por não existir como tal, a mediação entre o “mundo da
favela”, cada vez mais criminalizado, e o mundo político instituído, já não
pode se consolidar. A fronteiras que são demarcadas nas margens da política
sustentam, assim, a restrição da legitimidade de grupos inteiros situados às
margens da cidade. Moraliza-se de tal forma os espaços que se poderia politizar
que os moradores desses territórios, ao invés de serem considerados cidadãos
pela universalidade da noção de direitos, se esforçam de maneira permanente
para provar que são pessoas de bem, honestas, trabalhadoras, confiáveis,
pacíficas, que não possuem relação com “o tráfico”.
Nesse
sentido, torna-se interessante atentar para a importância de entender as
particularidades da violência de Estado definida em termos “políticos”, ou da
violência perpetrada contra grupos definidos em termos “políticos”, na medida
em que as distintas formas a partir das quais as vítimas e as violências são
adjetivadas podem ser reveladoras das distintas funcionalidades das práticas de
gestão da vida, da morte e da ordem social, em conjunturas específicas. Se é
pelo adjetivo “política” que se define a violência de Estado perpetrada durante
a ditadura, é porque se entende que essa violência se dirige àqueles que, de
alguma forma, ainda são reconhecidos como atores políticos em referência a uma
comunidade nacional. Quando um problema político como a violência de Estado no
Brasil, ao contrário, é tratado nas páginas policiais, produz-se uma “massa de
inúteis do mundo” nas dimensões internas às fronteiras nacionais que, em todas
as épocas, impediu qualquer democracia substantiva. A reflexão sobre as mortes
às quais fazem referência nossas etnografias, bem como sobre o luto público (ou
a ausência de luto) em torno desses mortos, nos leva então a questionar,
seguindo Butler (22), em que medida essa distribuição desigual da dor – que
determina quais vidas contam como vidas e quais mortes são dignas de lamento
público – produz e reitera certas concepções normativas do humano, delimitando
as fronteiras de pertencimento à comunidade política e, por conseguinte, “do
direito a ter direitos”.
Notas
e referências bibliográficas
1. Optamos pelas grafias em itálico das expressões segurança nacionale segurança pública (poderíamos acrescentar aqui violência urbana) para enfatizar que partimos da premissa, seguindo Machado da Silva e Misse, de que não tomamos tais noções como categorias analíticas, mas sim como representações. Ou melhor, essas noções se constituem como categorias de entendimentos que conferem sentido à experiência de vida nas cidades, consolidando representações que são chave para a compreensão de práticas e relações às quais elas se referem. O intuito é preservar o vínculo entre segurança nacional esegurança pública como temas de agenda pública (como problema social em debate), por um lado, e como representação coletiva, por outro.Ver: Machado da Silva, L. A. Vida sob cerco: violência e rotina nas favelas do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Faperj/Nova Fronteira. 2008; Misse, M. Crime e violência no Brasil contemporâneo: estudos de sociologia do crime e da violência urbana. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2006; Wacquant, L. As prisões da miséria. Rio de Janeiro: Zahar. 2011.
2. Feltran, G. S. “A gestão da morte nas periferias de São Paulo: um dispositivo entre governo e crime (1992-2011)”. In: Souza Lima, A. & García-Acosta, V. (Orgs.). Margens da violência: subsídios ao estudo do problema da violência nos contextos mexicano e brasileiro. Brasília: ABA. 2014.
3. Para uma reflexão acerca de como categorias sociais, políticas e administrativas (tais como “favelados” e “refugiados”) geram processos de distinção e hierarquização, materializando processos de produção de desigualdades diversas por meio de expedientes administrativos do Estado, ver neste Núcleo Temático da revista Ciência e Cultura o trabalho de Vianna e Facundo.
4. Ver: Butler, J. Vida precaria: el poder del duelo y la violencia. Buenos Aires: Paidós. 2006; Butler, J. Marcos de guerra. Las vidas lloradas. Buenos Aires: Paidós. 2010.
5. O artigo é resultado de trabalhos de campo realizados pelos autores na Argentina e no Brasil, entre 2004 e 2014, que resultaram nas seguintes teses: Feltran, G. S. “Fronteiras de tensão: política e violência nas periferias de São Paulo”. São Paulo: Editora Unesp/CEM-Cebrap. 2011; Sanjurjo, L. “Sangue, identidade e verdade: memórias sobre o passado ditatorial na Argentina”. Tese (doutorado em antropologia social) – PPGAS, Universidade Estadual de Campinas. 2013. As pesquisas foram financiadas pelo CNPq e Fapesp, respectivamente.
6. Declaração do capitão da marinha Jorge Acosta durante audiência judicial da Causa ESMA, em 20 de outubro de 2011, no Tribunal Federal de Buenos Aires. Acosta (condinome “Tigre”) integrou o Grupo de Tarea 33.2 da Escuela Mecânica dela Armada
(ESMA), um dos principais centros clandestinos de detenção, tortura e
extermínio em funcionamento durante a ditadura militar argentina.
7. Filc, J. Entre el parentesco y la política: familia y dictadura 1976-1983. Buenos Aires: Biblos. 1997.
8. Crenzel, E. La historia política del nunca más. La memoria de los desaparecidos enla
Argentina. Buenos Aires: Siglo Veintiuno Editores. 2008.
9. Calveiro, P. Poder y desaparición. Los campos de concentración en Argentina. Buenos Aires: Colihue. pp. 143. 2008.
10. Schindel, E. “Las ciudades y el olvido”.In: Puentes.La Plata , Ano 2, No. 7, p. 30.
julho de 2002.
11. O desaparecimento forçado de pessoas pode ser entendido aqui a partir da noção de evento crítico de Veena Das: Das, V. Critical Events. An anthropological perspective on contemporary India. New Dheli/ Oxford: Oxford University Press. 1995.
12. Para uma análise que trata das disputas em torno dos sentidos da categoria desaparecidos, ver: Vecchioli, V. “Políticas de la memoria y formas de clasificación social. Quiénes son las víctimas del terrorismo de Estado enla Argentina ?”. In: Groppo,
B. & Flier, P. (Orgs.). La imposibilidad del olvido: recorridos de la
memoria en Argentina, Chile y Uruguay.La Plata: Ediciones Al Margen. 2001.
13. Para uma discussão sobre a despolitização do relato sobre a ditadura argentina no período de transição democrática, ver: Crenzel, E, op. cit. 2008; Feld, C. Del estrado a la pantalla: las imágenes del juicio a los ex comandantes e Argentina. Madrid: Siglo XXI de España Editores. 2002; Jelin, E. “La justicia después del juicio: legados y desafíos enla
Argentina postdictatorial”. In: Fico, C., Ferreira, M. &
Quadrat, S. (Orgs.). Ditadura e democracia na América Latina: balanço
histórico e perspectivas. Rio de Janeiro: Editora FGV. 2008.
14. Foucault. A verdade e as formas jurídicas. Rio de Janeiro: Nau Editora. 1996.
15. A expressão “violência política” se refere, usualmente, a um tipo específico de uso da força dirigido àqueles indivíduos que portam conjuntos de valores, crenças ou projetos políticos contrários ao programa político oficial, ou dominante. Em regimes autoritários a violência política é computada entre as formas de exercício legítimo da força, nos Estados democráticos ela é sempre ilegal. Essa violência tenta manter fora da arena pública não apenas o sujeito a quem se dirige, mas também aqueles os quais suas palavras representariam. Esta modalidade violenta se diferencia de outras formas de uso da força, por ser centralmente dirigida à locução política, às palavras, e não apenas aos corpos dos indivíduos que a sofrem (matá-los tem por função estrita silenciá-los).
16. Feltran, G.S. “Margens da política, fronteiras da violência: uma ação coletiva das periferias de São Paulo”. In: Lua Nova, 79. 2010; Feltran, G.S. “The management of violence on the periphery of São Paulo: a normative apparatus repertoire in the PCC era”. In: Vibrant, 7. 2010; Feltran, G.S. “Governo que produz crime, crime que produz governo. O dispositivo de gestão do homicídioem São Paulo (1992-2011)”. In: Revista
Brasileira de Segurança Pública, 6. 2012.
17. Ver: Biondi, K. Junto e misturado: uma etnografia do PCC. São Paulo: Terceiro Nome/Fapesp. 2010. Biondi, K. e Marques, A. J. “Memória e história em dois comandos prisionais”. In: Lua Nova, 79. 2010; Dias, C.C.N. “Da pulverização ao monopólio da violência: expansão e consolidação da dominação do PCC no sistema carcerário paulista”. Tese (doutorado em sociologia). Programa de Pós-Graduaçãoem Sociologia. Universidade
de São Paulo. 2011; Hirata, D.V. “Sobreviver na adversidade: entre o
mercado e a vida”. Tese (doutorado em sociologia). Programa de Pós-Graduação em Sociologia. Universidade
de São Paulo. 2010.
18. Machado da Silva, L.A. “Criminalidade violenta: por uma nova perspectiva de análise”. In: Revista de Sociologia e Política, 13. 1999.
19. Críticas ao potencial democrático da democracia liberal, baseadas na sua dependência da forma empresa, já foram enunciadas em: Lindblom, C. E. Política e mercados: os sistemas políticos e econômicos do mundo. Rio de Janeiro: Zahar Editores. 1979. Feltran, op. cit.
20. Araújo, F. “Das consequências da ‘arte’ macabra de fazer desaparecer corpos: violência, sofrimento e política entre familiares de vítima de desaparecimento forçado”. Tese de doutorado. PPGAS/IFCS/UFRJ. 2012; Vianna, A. e Farias, J. “A guerra das mães: dor e política em situações de violência institucional”. In: Cadernos Pagu, 37. 2011; Hirata, .V. op. cit. 2010.
21. Feltran, G.S, op. cit. 2012.
22. Butler, J., op. cit. 2006.
1. Optamos pelas grafias em itálico das expressões segurança nacionale segurança pública (poderíamos acrescentar aqui violência urbana) para enfatizar que partimos da premissa, seguindo Machado da Silva e Misse, de que não tomamos tais noções como categorias analíticas, mas sim como representações. Ou melhor, essas noções se constituem como categorias de entendimentos que conferem sentido à experiência de vida nas cidades, consolidando representações que são chave para a compreensão de práticas e relações às quais elas se referem. O intuito é preservar o vínculo entre segurança nacional esegurança pública como temas de agenda pública (como problema social em debate), por um lado, e como representação coletiva, por outro.Ver: Machado da Silva, L. A. Vida sob cerco: violência e rotina nas favelas do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Faperj/Nova Fronteira. 2008; Misse, M. Crime e violência no Brasil contemporâneo: estudos de sociologia do crime e da violência urbana. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2006; Wacquant, L. As prisões da miséria. Rio de Janeiro: Zahar. 2011.
2. Feltran, G. S. “A gestão da morte nas periferias de São Paulo: um dispositivo entre governo e crime (1992-2011)”. In: Souza Lima, A. & García-Acosta, V. (Orgs.). Margens da violência: subsídios ao estudo do problema da violência nos contextos mexicano e brasileiro. Brasília: ABA. 2014.
3. Para uma reflexão acerca de como categorias sociais, políticas e administrativas (tais como “favelados” e “refugiados”) geram processos de distinção e hierarquização, materializando processos de produção de desigualdades diversas por meio de expedientes administrativos do Estado, ver neste Núcleo Temático da revista Ciência e Cultura o trabalho de Vianna e Facundo.
4. Ver: Butler, J. Vida precaria: el poder del duelo y la violencia. Buenos Aires: Paidós. 2006; Butler, J. Marcos de guerra. Las vidas lloradas. Buenos Aires: Paidós. 2010.
5. O artigo é resultado de trabalhos de campo realizados pelos autores na Argentina e no Brasil, entre 2004 e 2014, que resultaram nas seguintes teses: Feltran, G. S. “Fronteiras de tensão: política e violência nas periferias de São Paulo”. São Paulo: Editora Unesp/CEM-Cebrap. 2011; Sanjurjo, L. “Sangue, identidade e verdade: memórias sobre o passado ditatorial na Argentina”. Tese (doutorado em antropologia social) – PPGAS, Universidade Estadual de Campinas. 2013. As pesquisas foram financiadas pelo CNPq e Fapesp, respectivamente.
6. Declaração do capitão da marinha Jorge Acosta durante audiência judicial da Causa ESMA, em 20 de outubro de 2011, no Tribunal Federal de Buenos Aires. Acosta (condinome “Tigre”) integrou o Grupo de Tarea 33.2 da Escuela Mecânica de
7. Filc, J. Entre el parentesco y la política: familia y dictadura 1976-1983. Buenos Aires: Biblos. 1997.
8. Crenzel, E. La historia política del nunca más. La memoria de los desaparecidos en
9. Calveiro, P. Poder y desaparición. Los campos de concentración en Argentina. Buenos Aires: Colihue. pp. 143. 2008.
10. Schindel, E. “Las ciudades y el olvido”.In: Puentes.
11. O desaparecimento forçado de pessoas pode ser entendido aqui a partir da noção de evento crítico de Veena Das: Das, V. Critical Events. An anthropological perspective on contemporary India. New Dheli/ Oxford: Oxford University Press. 1995.
12. Para uma análise que trata das disputas em torno dos sentidos da categoria desaparecidos, ver: Vecchioli, V. “Políticas de la memoria y formas de clasificación social. Quiénes son las víctimas del terrorismo de Estado en
13. Para uma discussão sobre a despolitização do relato sobre a ditadura argentina no período de transição democrática, ver: Crenzel, E, op. cit. 2008; Feld, C. Del estrado a la pantalla: las imágenes del juicio a los ex comandantes e Argentina. Madrid: Siglo XXI de España Editores. 2002; Jelin, E. “La justicia después del juicio: legados y desafíos en
14. Foucault. A verdade e as formas jurídicas. Rio de Janeiro: Nau Editora. 1996.
15. A expressão “violência política” se refere, usualmente, a um tipo específico de uso da força dirigido àqueles indivíduos que portam conjuntos de valores, crenças ou projetos políticos contrários ao programa político oficial, ou dominante. Em regimes autoritários a violência política é computada entre as formas de exercício legítimo da força, nos Estados democráticos ela é sempre ilegal. Essa violência tenta manter fora da arena pública não apenas o sujeito a quem se dirige, mas também aqueles os quais suas palavras representariam. Esta modalidade violenta se diferencia de outras formas de uso da força, por ser centralmente dirigida à locução política, às palavras, e não apenas aos corpos dos indivíduos que a sofrem (matá-los tem por função estrita silenciá-los).
16. Feltran, G.S. “Margens da política, fronteiras da violência: uma ação coletiva das periferias de São Paulo”. In: Lua Nova, 79. 2010; Feltran, G.S. “The management of violence on the periphery of São Paulo: a normative apparatus repertoire in the PCC era”. In: Vibrant, 7. 2010; Feltran, G.S. “Governo que produz crime, crime que produz governo. O dispositivo de gestão do homicídio
17. Ver: Biondi, K. Junto e misturado: uma etnografia do PCC. São Paulo: Terceiro Nome/Fapesp. 2010. Biondi, K. e Marques, A. J. “Memória e história em dois comandos prisionais”. In: Lua Nova, 79. 2010; Dias, C.C.N. “Da pulverização ao monopólio da violência: expansão e consolidação da dominação do PCC no sistema carcerário paulista”. Tese (doutorado em sociologia). Programa de Pós-Graduação
18. Machado da Silva, L.A. “Criminalidade violenta: por uma nova perspectiva de análise”. In: Revista de Sociologia e Política, 13. 1999.
19. Críticas ao potencial democrático da democracia liberal, baseadas na sua dependência da forma empresa, já foram enunciadas em: Lindblom, C. E. Política e mercados: os sistemas políticos e econômicos do mundo. Rio de Janeiro: Zahar Editores. 1979. Feltran, op. cit.
20. Araújo, F. “Das consequências da ‘arte’ macabra de fazer desaparecer corpos: violência, sofrimento e política entre familiares de vítima de desaparecimento forçado”. Tese de doutorado. PPGAS/IFCS/UFRJ. 2012; Vianna, A. e Farias, J. “A guerra das mães: dor e política em situações de violência institucional”. In: Cadernos Pagu, 37. 2011; Hirata, .V. op. cit. 2010.
21. Feltran, G.S, op. cit. 2012.
22. Butler, J., op. cit. 2006.
Publicado
originalmente na revista Ciência e Cultura, vol.67 no.2 São
Paulo abr./jun. 2015, edição temática sobre deslocamentos organizada
por Bela
Feldman-Bianco.
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